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Música & Cinema: O Casamento do Século?

Liza Minnelli e Robert de Niro em New York, New York (1977), de Martin Scorsese. Crédito: © MGM-UA
Liza Minnelli e Robert de Niro em New York, New York (1977), de Martin Scorsese. Crédito: © MGM-UA

O papel da música no cinema e suas influências em todas as etapas da realização cinematográfica são o fio condutor da exposição interativa que chega de Paris ao Sesc Pinheiros no dia 20/set

Quando o compositor Nino Rota (1911-1979) faleceu, o cineasta italiano Federico Fellini (1920-1993) se viu às voltas com um dos maiores impasses que poderia viver: como continuar fazendo cinema sem o amigo compatriota que há décadas vertia em música tudo o que ele concebia sob a forma de cenas e diálogos? Assim como um viúvo que tenta reavivar em outros relacionamentos as lembranças do amor perdido, Fellini passou o resto de seus anos pedindo aos novos parceiros musicais que tentassem imitar Rota.

Com esta história, o crítico, professor, pesquisador e curador francês N.T. Binh sintetiza a proposta da exposição Música & Cinema: O Casamento do Século?, aberta ao público a partir deste sábado (20/set) no Sesc Pinheiros. A mostra, que representa o terceiro projeto conjunto entre o Sesc e a instituição francesa Cité de la musique*, apresenta o encontro da música com o cinema ao conduzir os visitantes por um trajeto interativo sobre os diversos estágios da produção, dos bastidores e da história cinematográfica.

“A relação entre a música e o cinema é tão antiga quanto o próprio cinema. A música estava presente já na sua origem: os filmes mudos, por exemplo, contavam com instrumentistas ou orquestras inteiras dentro do set de gravação”, lembra o curador, em meio a pôsteres, partituras e discos que organiza com agilidade nas vitrines expositivas durante o processo de montagem da mostra.

Detalhe do espaço expositivo. Crédito: Érica Georgino/Sesc


“Refletindo sobre a história que eu gostaria de contar nessa curadoria, percebi que havia um forte paralelo entre um relacionamento amoroso e a conjugação da música com o cinema. Estas linguagens se enlaçam como um casal: um cineasta e um compositor podem se conhecer, se apaixonar, gerar muitos filhos [assim como Fellini e Rota geraram Noites de Cabíria (1957) e A Doce Vida (1960), entre outros clássicos], e até mesmo se divorciar [tal qual Alfred Hitchcock pôs fim à parceria de doze anos e oito filmes com Bernard Herrmann ao interromper brutalmente a gravação de sua trilha durante as filmagens de Cortina Rasgada (1966), repreendendo-o por não ser pop e atual.

Dividida em quatro grandes etapas – a música antes da filmagem, durante a filmagem, na pós-produção e no lançamento –, a exposição convida o público a travar contato com mais de uma centena de trechos de filmes e trilhas sonoras, testemunhos, entrevistas, clipes, documentos originais como partituras, manuscritos, desenhos, storyboards, instrumentos, cartazes, fotografias e capas de álbuns.

O amplo leque de mídias e suportes utilizados reflete a proposta curatorial de promover a interatividade como recurso essencial de mediação com o público. “A música e o cinema não foram feitos para serem ‘enquadrados’ num espaço expositivo. Ela foi feita para ser ouvida em alto e bom tom, da mesma forma que ele existe para ser assistido na intimidade de uma sala específica. Ao transportá-los para uma exposição, precisei pensar em meios de torná-los assimiláveis, interessantes e pertinentes”, explica Binh, apontando para a jukebox que permitirá ao visitante ouvir dezenas de trechos de trilhas clássicas.

O curador N. T. Binh. Crédito: Roger Sassaki/Sesc


Música & Cinema: O Casamento do Século? chega ao Sesc Pinheiros após ter sido vista por mais de 90 mil pessoas em Paris, na Cité de la musique, entre março e agosto de 2013. Aqui, onde fica em cartaz até janeiro de 2015, ganhou ares nacionais, incorporando referências ao cinema e à música brasileira em cada etapa do percurso expositivo.

São apresentadas, por exemplo, partituras de Heitor Villa-Lobos para O Descobrimento do Brasil (1936), filme do pioneiro Humberto Mauro, e de Antonio Carlos Jobim para Pluft, o fantasminha (1961), longa infantil dirigido pelo cineasta franco-brasileiro Romain Lesage. No decorrer da montagem também são lembradas duplas de diretores e compositores como Cacá Diegues/Chico Buarque (que rendeu obras como Bye, Bye, Brasil, 1979, e Veja esta canção, 1994) e Walter Salles/Antônio Pinto (Central do Brasil, 1998, e Abril Despedaçado, 2001, entre outros).

“Não é comum um projeto concebido no exterior se apropriar do contexto do país onde é apresentada”, diz Binh. “Foi empreendido um esforço bastante grande para que isso fosse possível aqui, pois acredito que o melhor caminho para comunicar uma ideia, um conceito ou uma proposta de curadoria seja aproximando-a do seu público”.

Cacá Diegues e Chico Buarque. Crédito: © Luz Mágica


O formato inédito apresentado no Sesc Pinheiros abriga ainda uma extensa programação integrada de shows, concertos, projeções, palestras e oficinas, renovada mensalmente. A temporada será aberta neste sábado (20/set) com a exibição do filme O Mágico de Oz (1939), do diretor Victor Fleming, com trilha sonora e diálogos recriados pelo músico André Abujamra e executados ao vivo no Teatro Paulo Autran. Clique aqui para consultar a grade completa de atividades relacionadas à exposição.


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*Sobre o Sesc e a Cité de la musique
Música & Cinema: O Casamento do Século?  representa o terceiro projeto conjunto entre o Sesc e a Cité de la musique, instituição pública mantida pelo Ministério da Cultura e da Comunicação da França. Criada em 1995, a Cité se constitui como um polo de referência internacional dedicado à música, com uma consolidada programação de concertos, atividades formativas e exposições. A parceria teve início em 2009, com a remontagem, no Sesc Paulista, da exposição Gainsbourg, Artista, Cantor, Poeta, etc., apresentada em Paris, no ano de 2008. Com curadoria de Frédéric Sanchez, a exposição apresentava instalações visuais e sonoras – como trechos de filmes e vídeos, making ofs, entrevistas, fotos, reproduções de documentos e outros materiais – que discorriam sobre a vida e a obra de Serge Gainsbourg (1928-1991), um dos maiores nomes da história da música francesa. Já Miles Davis (1926-1991) foi tema de Queremos Miles!, homenagem exposta entre 2011 e 2012 no Sesc Pinheiros que reuniu mais de 300 itens. De partituras a documentos pessoais, de obras de artistas plásticos da época (como Jean-Michel Basquiat) a instrumentos do próprio trompetista americano e seus parceiros, a retrospectiva promovia o contato ímpar com as revoluções sonoras provocadas por Miles.


 

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