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Curadores falam da exposição 'Variações do Corpo Selvagem: Eduardo Viveiros de Castro, fotógrafo'

Eduardo Sterzi e Veronica Stigger
Eduardo Sterzi e Veronica Stigger

De 30 de agosto de 2015 a 17 de janeiro de 2016, o Sesc Ipiranga apresenta 'Variações do Corpo Selvagem: Eduardo Viveiros de Castro, fotógrafo': exposição homônima, com imagens de autoria do antropólogo, seminário envolvendo acadêmicos brasileiros e estrangeiros e uma ampla programação paralela, com shows, espetáculos de teatro, performances, atividades para crianças, dança e ciclo de cinema. Saiba mais aqui.

A Eonline conversou com os curadores Eduardo Sterzi, escritor, crítico literário e professor de teoria literária na Unicamp e Veronica Stigger, escritora, crítica de arte e professora de história da arte na FAAP.

EOnline: Como surgiu a ideia da exposição 'Variações do Corpo Selvagem: Eduardo Viveiros de Castro, fotógrafo'?

Curadores: A ideia surgiu quando nos demos conta de que as fotografias de índios publicadas em livros de Viveiros de Castro (como A inconstância da alma selvagem e Araweté: o povo do Ipixuna), assim como as fotografias feitas na época de seu trabalho com o cineasta Ivan Cardoso (por exemplo, fotografias já clássicas de Waly Salomão e Hélio Oiticica, muitas vezes não identificadas como sendo dele), todas elas fotografias de inegável qualidade estética, além de reveladoras de um olhar muito pessoal, eram provavelmente parte de um conjunto mais amplo.

EOnline: Qual a importância da obra fotográfica do antropólogo?

Curadores: Viveiros de Castro criou uma obra fotográfica muito singular, que não pode ser reduzida seja a uma ferramenta do discurso etnológico, sejam a uma pura produção artística. Em suma, obra que encontra seu lugar próprio no intervalo entre as formas consolidadas, e que não por acaso toma como seu tema central aquilo que chamamos de “variações do corpo selvagem”, isto é, experiências corporais que escapam àquelas posições e gestos tradicionalmente reservados ao corpo no que chamamos de “Ocidente”.

EOnline: A obra intelectual do antropólogo influenciou a exposição de que forma?

Curadores: A obra antropológica de Viveiros de Castro nos forneceu ferramentas conceituais que nos permitiram entrever sua obra fotográfica como uma espécie de discurso figurativo paralelo ao discurso escrito, discurso figurativo que não coincide completamente com seu discurso teórico (visto que não se trata de simples ilustração), mas que, a nosso ver, pode inclusive contribuir para uma compreensão renovada das suas hipóteses teóricas – por exemplo, se passamos a perceber, com auxílio das fotos, a grande importância que as questões do corpo têm desde o início de sua trajetória intelectual.

EOnline: Como o corpo se torna o ponto de encontro da antropologia e da fotografia nesta exposição?

Curadores: O corpo é, por definição, aquilo que se dá a ver, isto é, o fotografável por excelência. Esta noção, evidentemente, não é uma exclusividade das fotografias de Viveiros de Castro. O que parece ser, sim, uma particularidade da sua obra fotográfica é a atenção que ele dedica à variabilidade dos corpos, a qual pode ser compreendida – é o que propomos com nossa exposição – como uma forma visual da relevância da multiplicidade na ontologia anarquista subjacente à teoria do perspectivismo ameríndio. Variações do corpo selvagem significa também: o humano só se dá a ver na variação, em variações, isto é, na incoincidência com aquilo que a chamada “civilização ocidental” espera dele. Os corpos dos índios e os corpos dos artistas – o corpo selvagem em todas as suas formas – são talvez os melhores exemplos dessa não-coincidência.

EOnline: Como foi pensada a disposição fotográfica da exposição, já que ela abrange algumas fases do trabalho fotográfico do antropólogo?

Curadores: Trata-se de uma exposição de razoável extensão – são mais de 330 fotos, dispostas em diferentes ambientes, tanto fechados quanto abertos. A saída fácil para delinear um percurso de legibilidade desse conjunto seria usarmos títulos que demarcassem áreas diversas. No entanto, queríamos frisar precisamente a comunicação entre um setor e outro da exposição, a fluidez entre uma parede e outra. Daí nossa opção por frases extraídas de ensaios e entrevistas de Viveiros de Castro, em vez de títulos. Além disso, essas frases permitem ao visitante da exposição perceber os nexos complexos entre a obra fotográfica e a obra teórica do antropólogo.

EOnline: Qual a ligação entre a programação paralela e o seminário, que ocorrerá em outubro?

Curadores: O seminário será, salvo engano, o primeiro evento deste porte dedicado a um exame das relações entre a obra teórica de Viveiros de Castro e as reflexões contemporâneas sobre áreas não imediatamente antropológicas, como a filosofia, a teoria da literatura e a história da arte.