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Desafios do Turismo Urbano em São Paulo

Mariana Aldrighi no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo | Foto: Dalmir Ribeiro Lima
Mariana Aldrighi no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo | Foto: Dalmir Ribeiro Lima

O Festival de Turismo Outras Viagens, que acontece nas unidades do Sesc em São Paulo até o dia 13 de dezembro, leva o público a mergulhar no universo das viagens experimentando atividades em diversos formatos e linguagens. Na programação do evento o Centro de Pesquisa e Formação do Sesc em São Paulo realiza uma série de atividades com profissionais especialistas do turismo para refletir sobre temas relevantes na área.

Na atividade “Desafios do Turismo Urbano em São Paulo”, que aconteceu na última terça (17/nov), foram apresentadas algumas ações e estratégias que colaboram para que o turismo seja um dos vetores de desenvolvimento de uma cidade global. A palestrante convidada foi Mariana Aldrigui, professora no curso de Lazer e Turismo da EACH/USP, com atuação nas áreas de políticas públicas e educação para o turismo. Aldrigui é responsável no Brasil pelo projeto de educação Global Travel & Tourism Partnership, onde colabora com diferentes entidades do turismo brasileiro.

Baseada em sua tese de doutorado intitulada Cidade Global, Destino Mundial: turismo urbano em São Paulo, Mariana abordou sobre a política pública municipal de turismo da cidade de São Paulo - a maior metrópole do Brasil destino de 15 milhões de turistas anualmente. Da mesma forma que outras cidades globais como Londres e Nova Iorque, há diversas atividades que atraem visitantes para São Paulo, porém ainda faltam políticas integradas que permitam mais e melhores resultados sociais e econômicos.

A partir de sua pesquisa, Mariana foi convidada pela Prefeitura de São Paulo, por meio de seus representantes do turismo, para elaboração conjunta de uma proposta que apresenta um novo olhar sobre a atividade turística na cidade. Após vários debates e ajustes realizados a proposta pode ser conferida no novo PLATUM 2015/2018 – Plano Municipal de Turismo da Cidade de São Paulo, que se encontra disponível no site da SP Turis.

“Temos consistência para olhar de uma forma muito particular para São Paulo, e estabelecer condições para que a cidade lidere um novo olhar, um novo movimento para o turismo, e que assim possa gerar novos dados e com isso trazer mais atenção para a área! E vamos acreditar que assim podemos ter mais empregos, renda e oportunidades!" – destaca Aldrighi

A Eonline entrevistou Mariana Aldrigui para trazer um pouco mais das reflexões que se apresentaram durante o encontro.

 

EOnline: Como você definiria o principal desafio do turismo nas grandes cidades hoje?

Mariana Aldrigui: Eu diria que no cenário em que estamos, exatamente hoje em 17 de novembro de 2015, pós atentado terrorista em Paris, num ano muito difícil, o desafio é permitir que as pessoas se reúnam sem risco ou com menor risco possível, vivenciando não apenas o que é tradicional do local mas também essa vibração cultural. Quando a gente põe visitantes e moradores em contato, se apropriando dos espaços, sejam eles públicos ou privados, a gente vai ter um enriquecimento da vida de todo mundo. Não gosto de usar a expressão “turismo de experiência”, porque eu acho que isto solidifica a experiência, e a experiência é muito individual. Mas é o turismo da vivência, que permite o encontro, permite a troca, permite a fruição. O que a gente acaba vendo nos diversos compartilhamentos é que as pessoas compartilham bons momentos. Então se a gente ambicionar ter uma cidade que possa ser compartilhada, inclusive nas redes sociais, acho que a gente pode estar chegando num ponto interessante. Essa seria talvez minha primeira recomendação, tentar transformar a cidade em lugar acolhedor pra quem mora e quem visita.

EO: Sobre estes recentes atentados terroristas, constata-se que os alvos principais são importantes pontos turísticos.  Como você vê o impacto destas ações sobre estas grandes cidades que atraem muitos visitantes?

MA:Eu tenho pouca profundidade teórica para falar dos embates religiosos, mas o que podemos perceber é que o estilo de vida, que eu até mencionei como sendo o grande atrativo destes diversos públicos, acaba sendo bastante ofensivo para esses extremistas religiosos. E o turismo é a cereja do bolo desse estilo de vida, é uma fruição de lazer e prazer, uma fruição de tempo vinculada a uma questão de ícones culturais, sejam eles museus, praças, esculturas. As pessoas se aglomeram em torno disso pra aproveitar a vida, o que provavelmente ofende estes extremistas religiosos. Em inglês o termo que se usa hoje são os softs targets, ou seja, alvos móveis e fáceis de serem atingidos. O que eu penso, e recentemente publiquei algo neste sentido, é que o turismo continua sendo a grande indústria da disseminação da paz e uma indústria que dissemina inclusive compreensão e respeito à diversidade, à outras posturas, à diversas opções. Então eu, nesse momento espero que não haja nenhum movimento de retração do turismo. Espero que pelo turismo se amplie o movimento de compreensão mundial, principalmente com relação ao Islamismo. A gente não pode simplesmente confundir o Islamismo com extremistas e terroristas. Temos neste momento um enorme desafio, o de mostrar essa cultura e permitir até que os mais ocidentais e mais rígidos respeitem também os preceitos islâmicos.

EO: Falando de desafios, no cenário brasileiro as notícias da crise econômica apontam que os primeiros gastos a serem cortados são os de lazer e turismo. Quais as dificuldades e oportunidades que você enxerga para o setor neste contexto?

MA: O mais legal de entender esta crise é que ela afeta um tipo de gasto, ou a quantidade e volume de gastos, mas não o padrão do gasto. As pessoas vão trocar de viagem, mas não vão deixar de viajar. Então se você tinha uma viagem internacional provavelmente você reduz para uma viagem nacional. Se você estava imaginando ir para o Nordeste, talvez agora você não vá mais para o Nordeste, você faça uma viagem pelo Estado de carro. Então do ponto de vista de quem gere um destino, o que a gente precisa é focar em quem está mais próximo e o que torne o custo desta viagem mais barata. E se a gente está pensando em produtos a serem montados para quem está aqui e queira sair para uma viagem de fim de semana, é nesse momento que eu penso que as menores viagens são as que vão se recuperar por agora.  Acontece só uma redução das distâncias, mas não uma redução do hábito. Sem dúvida viajando para mais perto eu gasto menos, mas eu não deixo de ter um tempo de fruição e convívio com a família, de estar com os amigos. Agora, uma preocupação mais recente é de uma redução muito significativa no volume das viagens de negócios e aí isso vem com os cortes orçamentários das empresas. O que a gente precisa, falando especificamente de São Paulo, e se tudo acontece em São Paulo, é reposicionar São Paulo dizendo: "você pode continuar vindo em São Paulo mas fique num hotel mais barato. Fique talvez em locais mais afastados mas não deixar de vir e de viver a cidade." É interessante porque a gente pode olhar para o turismo como um movimento que não vai deixar de acontecer. Ele muda sua característica mas as pessoas vão continuar circulando.

EO: Para finalizar, temos uma pergunta um pouco mais pessoal e aberta à imaginação. O que significa para você viajar?

MA: Nossa, eu poderia mesmo responder de diversas formas, mas vamos lá: "viajar para mim significa buscar algo que eu não encontrei aqui ainda."

 

 


Foto: Dalmir Ribeiro Lima

 

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Outras Viagens

Na programação do Festival de Turismo Outras Viagens o CPF Sesc também realiza também o mini-curso As favelas como atração turística, que busca refletir como os territórios historicamente associados à pobreza e à violência vêm se tornando, desde os anos 1990, atrações turísticas em diversas partes do mundo.

A proposta é prover uma compreensão comparativa, no tempo (desde o século XIX) e no espaço (Américas, África e Ásia) das atividades turísticas desenvolvidas em áreas pobres e segregadas. A partir de casos empíricos as dicussões foram sobre os dilemas éticos e os desafios práticos enfrentados por um leque variado de favelas em que o turismo já é uma realidade cotidiana. 

O curso, ministrado por Andréa Borges, autora da dissertação A dois passos do paraíso: A construção da Favela de Paraisópolis como atração turística, e Bianca Freire Medeiros, autora do livro Gringo na laje: produção, circulação e consumo da favela turística, teve início em 16 de novembro e se estende até 02 de dezembro, numa série de encontros que prevê ainda a exibição seguida de debate sobre o documentário Em Busca de um Lugar Comum (BRA, Dir.: Felippe Mussel, 2013), e um tour em Paraisópolis – a "favela turística" de São Paulo.