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postado em 11/03/2013

Entretanto, move-se

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Corpo vivo: reeducação do movimento, de Ivaldo Bertazzo, nos convida a pensar sobre o corpo humano e a tirá-lo de sua zona de conforto

 

O homem é um animal fadado a se movimentar. Ao longo dos milhões de anos em que foi moldada a estrutura anatômica do homo sapiens, o corpo humano foi se mostrando capaz de realizar um grande número de proezas por meio do funcionamento de seus ossos, músculos e de suas articulações. Correr, saltar, levantar pesos ou dançar são alguns exemplos do que o corpo é capaz de fazer quando está de posse do pleno funcionamento de suas aptidões. Não há outro animal no mundo que detenha tantas habilidades motoras.

Entretanto, as conquistas da ciência e da tecnologia, nos últimos cem anos, garantiram à humanidade usufruir de um estágio de conforto tal que a sobrevivência passou a prescindir do esforço físico, diferentemente das condições enfrentadas por nossos ancestrais. Este novo modo de vida, então, racionalista e pragmático, levou o homem a se tornar um animal sedentário e bem nutrido, fazendo com que o sedentarismo e a obesidade se transformassem, recentemente, em um problema de saúde pública nas grandes capitais mundiais.

Desde os anos 1970, o bailarino, coreógrafo e educador Ivaldo Bertazzo trabalha com cidadãos comuns (denominados por ele de “cidadãos dançantes”) de diferentes classes e profissões, engajados na reeducação do corpo e na transformação do gesto como manifestação da individualidade. Paralelamente à dança, ele se aprofundou nos estudos de fisioterapia, aliando a seu método a análise do funcionamento do aparelho locomotor e da biomecânica humana. Assim, nasceu, em 1975, a Escola do Movimento – Método Bertazzo, cujo objetivo é ampliar a consciência corporal, a autonomia e a estrutura próprias do movimento.

Entre as décadas de 1970 e 1990, Ivaldo criou 24 espetáculos em dois planos: um artístico, com bailarinos profissionais e aparato cênico; e outro, da “dança-cidadania”, com indivíduos não profissionais atuando no palco coletivamente. Nos últimos anos, ele tem trabalhado ativamente com a população dos bairros de periferia de São Paulo e do Rio de Janeiro e com empresas privadas. Em 2002, recrutou jovens de ONGs que atendem a comunidades em situação de risco para dar início ao projeto “Dança Comunidade”, em parceria com o Sesc São Paulo. Desse projeto nasceram os espetáculos Samwaad – rua do encontro e Milágrimas, apresentados no Brasil, na França e na Holanda. Em 2006, Ivaldo fundou a Cia. TeatroDança, com a qual apresentou espetáculos como Mar de gente, Kashmir bouquet e Noé Noé!

Disposto a registrar o método exclusivo que desenvolveu dedicado ao corpo e ao movimento – fruto dos estudos interdisciplinares voltados às técnicas de fisioterapia e dança e à percepção corporal procedente de diversas culturas –, Ivaldo Bertazzo escreveu Corpo vivo: reeducação do movimento, lançado pelas Edições Sesc São Paulo. Estruturado a partir de pesquisas e experimentações práticas, o livro foi elaborado como um material de apoio no curso de formação de profissionais ministrado na Escola do Movimento.

A obra ensina a estruturar o corpo nos âmbitos profissional, escolar e da saúde em geral, abordando temas como: reeducação dos movimentos automáticos primários, respostas do sistema nervoso central aos estímulos sensoriais, modificações do corpo durante o movimento, o esforço bípede para se manter na posição vertical, os deslocamentos e a marcha nos gestos cotidianos. Redigido de forma leve e bem-humorada, Corpo vivo aborda a reeducação do movimento como um processo que passa obrigatoriamente pelo longo histórico da constituição física do homem e por sua transformação de quadrúpede em bípede. Fartamente ilustrado por fotos e desenhos, o livro possibilita que tanto o profissional quanto o cidadão comum possam utilizar as séries de exercícios propostos como base para a reeducação do movimento, reconstituindo o desempenho de suas atividades cotidianas.

Em Corpo vivo: reeducação do movimento, Ivaldo parte do princípio de que os desequilíbrios mecânicos acumulados no dia a dia causam percepções errôneas durante a execução dos gestos repetitivos – o que dá origem a lesões musculares, articulares e a limitações de movimento. Quando o desuso atrofia determinado músculo, seus vizinhos se contorcem para repor a função perdida. Se um músculo fica enfraquecido por longo período, os músculos vizinhos modificam seu modo de funcionamento para suprir o trabalho daquele que está enfraquecido, substituindo o movimento correto por um “não natural”. Com o passar do tempo, esse conjunto de adaptações compensatórias provocará alterações anatômicas que sobrecarregarão ossos, músculos e articulações, e darão origem a deficiências funcionais. A fim de corrigir esses desacertos, a reeducação do movimento apóia-se no conceito da “fraternidade dos músculos”: o sistema motor, em seu funcionamento ideal, age como uma democracia em que um músculo equilibra a ação do outro, dando-lhe suporte. Distribuindo e equilibrando as forças, alcança-se a meta da coordenação motora.

Ivaldo propõe uma reconstrução da trajetória do desenvolvimento motor do indivíduo, baseada na revisão dos processos que ele mesmo já viveu. Para tanto, sugere uma série de exercícios cuidadosamente programados para se contraporem à apatia e ao desinteresse que os adultos costumam ter pelo movimento. No livro, cada exercício é escrito com detalhes e ilustrado de forma clara para orientar professores e alunos. O conjunto funciona como um manual para os que desejam “brincar com as possibilidades do gesto, arriscar-se em movimentos, submeter-se à desestabilidade e ampliar o alcance dos gestos”, como diz o autor.

Acessível tanto a pessoas comuns como a fisioterapeutas, preparadores e professores de educação física, o livro conta com a colaboração de uma equipe de quatro fisioterapeutas e professoras do curso de formação do método Bertazzo: Ana Marta Nunes Zanolli, Geni Gandra, Juliana Storto e Liza Ostermayer.

Ao longo das páginas de Corpo vivo: reeducação do movimento, o leitor vai perceber que o ser humano usa seu corpo em total desacordo com os fins para os quais foi selecionado. Há de concordar plenamente esse leitor, então, com as palavras que Drauzio Varella emprega no prefácio da obra de forma tão bem-humorada: “Para que servem braços e pernas tão longos e musculosos no caso de um animal que não vai andar? Se a evolução nos tivesse preparado para o mundo atual, poderíamos ter braços que apenas alcançassem o teclado do computador, pernas de comprimento suficiente para acelerar e brecar o carro e um traseiro enorme para servir de acolchoado nas cadeiras incômodas”.  
 

Veja também:

:: Vídeo

 

:: Trechos do livro

 

 

:: Caminhos do corpo | Gesto orientado completa trilogia sobre o método de reeducação do movimento criado por Ivaldo Bertazzo

:: Corpo, pra que te quero? | Livro de Ivaldo Bertazzo ensina a leigos e profissionais, na prática, o que é consciência corporal

:: Olhar para si desde a infância | Ivaldo Bertazzo direciona seu olhar a primeira fase da existência para facilitar a plenitude psíquica, afetiva e psicomotora do ser humano pleno em seu futuro 

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