O que é afrofuturismo?

27/09/2019

Compartilhe:

Vivência de realidade virtual em unidade do Sesc | Foto: Anderson Rodrigues

Em 2013, Kênia Freitas realizava sua pesquisa para o doutorado em Tecnologia da Comunicação e Estética, na UFRJ, quando ouviu pela primeira vez, em um episódio de podcast dedicado à música eletrônica – e suas trocas com a música negra –, a respeito do conceito de afrofuturismo.

O episódio, lembra Kênia, hoje pós-doutoranda na Unesp de Bauru, falava sobre como jovens artistas negros ligados ao techno de Detroit (EUA), habitando aquele espaço urbano decadente que outrora fora uma potência industrial, traziam em suas músicas a experiência de viver em uma “terra devastada, um certo fim de mundo que já aconteceu” bem como uma esperança, uma utopia que se materializava até mesmo em outros planetas, no contato com alienígenas, por exemplo. Essa estética, desde os anos 90, passou a ser chamada de afrofuturista.

Kênia se interessou pelo assunto e, como era do campo do cinema, procurou investigar como essa perspectiva, que alimenta a ficção especulativa negra, era trabalhada na sétima arte. Em 2015, fez a curadoria da Mostra Afrofuturismo: Cinema e Música em uma Diáspora Intergaláctica, no então Caixa Belas Artes (hoje Petra Belas Artes), e levantou uma série de produções audiovisuais de ficção científica, fantástica e até documentários voltados à experiência negra na chave afrofuturista.

A pesquisadora segue, na universidade, sua investigação sobre esse universo, que recentemente ganhou popularidade com o lançamento do premiado longa-metragem Pantera Negra (2018), uma adaptação para os cinemas dos quadrinhos da Marvel que contam a história de T’Challa e o vibrante reino africano de Wakanda.

Inspirada pela ação Tecnologias e Arte em Rede: Tecnologias Negras, que celebra o protagonismo de pessoas negras no campo das artes visuais e das tecnologias por meio de atividades que acontecem em todas as unidades do Sesc São Paulo no mês de outubro, a EOnline conversou com Kênia (assista abaixo) para entender como surge o conceito do afrofuturismo e em que tipo de produções artísticas, de fato, ele pode ser identificado.

Embora tenha sido cunhado pelo crítico cultural estadunidense Mark Dery nos anos 90, o conceito de afrofuturismo é útil para análise também de obras anteriores ao final do século XX que já traziam características as quais hoje lemos como particulares do gênero. Como explica Kênia, também não se deve entender esse rôtulo como exclusivamente ligado a visões de futuro (apesar do nome), mas sim a todo tipo de especulação quanto a experiência negra, a partir dela (inclusive do ponto de vista da autoria), também aquelas localizadas no passado, no presente ou em dimensões alternativas.

Hoje há diversos artistas criando a partir das ideias e das estéticas percebidas como afrofuturistas. Freitas indica nomes de alguns artistas nacionais e estrangeiros que, nesse sentido, podem ser uma boa porta de entrada para conhecer melhor o gênero em suas diversas linguagens: 

Fábio Kabral
Escritor brasileiro, autor dos romances “Ritos de passagem” (Giostri, 2014), “O Caçador Cibernético da Rua 13” (Malê, 2017) e “A Cientista Guerreira do Facão Furioso” (Malê, 2019) e de ensaios sobre afrofuturismo. 

Lu Ain-Zaila
Ou Luciene Marcelino Ernesto. Pedagoga e escritora brasileira, autora das obras autopublicadas “Duologia Brasil 2408” (2016/2017) e “Sankofia” (2018).

Senzala Hi-Tech
Grupo musical formado pelo atleta de taekwondo Diogo Silva, o rapper MC Sombra, o produtor e músico Minari e pelo cartunista e percussionista Junião. Lançou em agosto dessa ano o álbum Represença, quando celebrou dez anos de carreira. O trabalho da banda de hip hop nacional é uma fusão de influências musicais e das artes visuais do continente africano e das Américas.

Ytasha L. Womack
Escritora, cineasta e futurista estadunidense. Autora de obras que abordam diretamente o fenômeno do afrofuturismo e de obras que são influenciadas pela linguagem, tornou-se uma referência no assunto e é convidada para conferências dentro e fora dos EUA.

Sun Ra
Prolífico jazzista estadunidense nascido Herman Poole Blount em 1914, faleceu em 1993 e é considerado um percursor do afrofuturismo tanto pela música que produziu quanto por sua própria persona e visão de mundo. Aliás, a banda Sun Ra Arkestra, que homenageia o trabalho do músico e atualmente é liderada pelo saxofonista Marshall Allen, braço direito de Sun Ra desde 1958, está na programação do Sesc Jazz esse ano, com dois shows no Sesc Pompeia, nos dias 8 e 9 de outubro, e um show no Sesc Jundiaí, no dia 10.

George Clinton
Músico estadunidense e grande nome por trás das bandas Parliament e Funkadelic. Seu trabalho transformou o funk e é também considerado precursor da estética afrofuturista, com destaque para o álbum Mothership Connection, lançado em 1975 pela banda Parliament.

Com dezenas de oficinas e bate-papos que se relacionam direta ou indiretamente com o afrofuturismo, a ação Tecnologias e Artes em Rede: Tecnologias Negras acontece em outubro, nos Espaços de Tecnologias e Artes (ETAs) de todas as unidades do Sesc São Paulo – na capital, no interior e no litoral do estado. Veja detalhes sobre as programações e cursos da ação em sescsp.org.br/ETAemRede

A identidade visual dessa edição do Tecnologias e Artes em Rede foi criada pelo premiado ilustrador e quadrinista brasileiro Marcelo D’Salete.

Siga @etasescsp e @sescsp

#TecnologiasNegras
#ETAemRede

Conteúdo relacionado

Utilizamos cookies essenciais para personalizar e aprimorar sua experiência neste site. Ao continuar navegando você concorda com estas condições, detalhadas na nossa Política de Cookies de acordo com a nossa Política de Privacidade.