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Costura: superpoder da vida real

Elisa Dantas conta sobre quando começou a costurar e como essa experiência transformou a sua vida
Elisa Dantas conta sobre quando começou a costurar e como essa experiência transformou a sua vida

Na manhã de uma terça-feira qualquer de fevereiro, fomos visitar Elisa Dantas, a Costureirinha, em um de seus locais de trabalho. Sem um espaço fixo, ela vai costurando um trabalho no outro em centros culturais, como o Sesc Pompeia, ou em espaços de co-working, como o aconchegante Atelier Co.sturando, localizado na Avenida Doutor Arnaldo, onde ela nos recebeu.

Enquanto esperávamos a Elisa chegar, fomos recepcionados pela Bia, uma das sócias do espaço, que enquanto preparava um cafézinho nos explicou a dinâmica do local. O Co.sturando oferece cursos de corte e costura, oficinas livres para confecção de roupas e acessórios, e é também ponto de encontro de toda gente interessada em moda. Entre as bancadas e as quase vinte máquinas de costura, incluindo algumas industriais, retalhos, linhas e agulhas, livros de moda se misturam com plantas naturais e crochetadas, além de objetos e cartazes com frases afetivas, como aquele em que se lê: “Livrai-me de gente normal, amém”.

 

 

Nem dez minutos se passaram e Elisa chegou. Foi logo pedindo desculpas pelo atraso (Em uma cidade como São Paulo, dez minutos pode ser considerado atraso? Jamais!) e afirmando ser tímida, enquanto abria um sorriso nervoso reafirmando sua timidez. Um copo de água gelada depois, já acomodados em volta de uma mesa, Elisa começa a coser as histórias sobre seu fazer artístico e profissional.

Começamos a conversa querendo saber como ela cria seus objetos e as oficinas e cursos que dá. Nos contou que seu processo criativo é dividido em duas experiências completamente diferentes: uma bastante intuitiva e a outra completamente introspectiva. Na primeira, Elisa pega uma ideia no ar e vai dando forma a ela. Munida de caderno e canetas variadas, vai colorindo livremente, até formatar uma peça ou um curso. E o outro é bastante introspectivo. Fica quietinha no próprio mundinho, pensando, tendo ideias, em silêncio. Cada hora é de um jeito. Em comum, há o momento em que a proposta fica madura e ela pula para as planilhas do Excel para avaliar a viabilidade e contabilizar os custos. Nessa hora, a música e os gatos fazem companhia.

 

 

Ela conta que já há muito tempo a costura deixou de ser um hobby e virou trabalho. Se ela não se organiza direitinho e deixa para trás determinados processos, acaba se “embananando toda”. Quando chega em casa, já cansada de costura, não quer nem saber de olhar para a máquina. Nessas horas livres acaba encontrando no bordado e na marcenaria uma válvula de escape. “É meu jeito de relaxar”, diz.

Elisa conta que durante as aulas, música e café não podem faltar. “E tem que ter comida, se não a gente começa a ficar nervosa”, conta sorrindo.  Entre seus alunos, a maioria é de mulheres de idades muito variadas. No momento desse encontro, a mais nova tem 12 anos e a mais velha já chegou aos 90. Nesse universo há pessoas de todos os tipos, gente muito conservadora, outras completamente progressistas. Não existe um perfil definido entre aqueles que querem aprender a costurar. O público é muito variado, “gente que quer fazer”. Mas ainda são poucos homens entre seus alunos. “A cada duas turmas tem um”, conta.

E sempre que tem um homem entre os alunos, Elisa quer saber o que o motivou a chegar até ali. A dúvida surge pois ela percebe que a costura ainda está associada a uma tarefa feminina e doméstica. Com isso, a maioria dos homens que procuram seus cursos costumam ser artistas e criadores, "pessoas de mente aberta". Seus ensinamentos, contudo, estão disponíveis para todos. Lembra o caso de um aluno que estava ali para aprender a costurar porque queria criar o enxoval de sua filha: “A esposa estava grávida e ele queria costurar o enxoval”. E não é que deu certo? Ela acredita que esse exemplo é uma tendência e que logo mais homens se habilitem a aprender a costurar no dia-a-dia. Se observarmos o que acontece no mundo da moda, Elisa está certa. Afinal, na alta costura muitas vezes são os homens que ditam a moda.

 

Empoderamento

Elisa conta que depois de um tempo dando aula, a costura é apenas uma pequena parte do que ela faz.  “O mais importante nas aulas, e eu acredito que isso deva ser uma constante para todos os tipos de aulas, é você mostrar para pessoa que ela é capaz. Porque assim como eu tinha meus bloqueios, todo mundo tem bloqueios. E o principal bloqueio das pessoas é dizer coisas como: ‘Eu não consigo. Eu não dou conta. Não, isso não é pra mim. Jamais conseguiria fazer isso!’ E a partir do momento que você pega na mão e fala: ‘Você vai fazer!’ seja uma saia ou uma capa de alguma coisa, a pessoa fica muito transformada”.

Essa possibilidade de fazer, segundo Elisa, leva às pessoas a se lançarem em novos desafios: “se eu fiz um estojo, eu posso fazer uma mochila”. Além disso, ela conta que esse processo traz um novo tipo de consciência sobre o consumo e mobiliza pessoas. Começa-se a economizar dinheiro, a pensar sobre o que se está consumindo, e ao invés de comprar roupas você percebe que é possível trocá-las ou consertá-las; essa consciência vai crescendo de forma exponencial “ao invés de ir para um bar beber, você vai para um parque com amigos e começa a bordar. Coisas que normalmente são vistas com muito preconceito, na verdade têm uma riqueza para constituição pessoal. As pessoas passam a perceber que podem fazer as coisas”. Para Elisa, a costura e todas as artes manuais são centrais nesse processo de empoderamento. “Não significa que se você aprender a costurar vai se tornar uma pessoa independente. Mas ajuda!”

 

 

Para Elisa, a costura é uma espécie de superpoder da vida real. “Eu acho que costura entra nessa categoria de superpoderes também. Porque, pensa bem, quando você costura, você tira uma coisa, que só existia no seu pensamento e materializa. Você imagina uma calça. De repente, você compra o tecido, corta e costura. E você está usando aquela calça. Então eu vejo muito a costura como um superpoder da vida real. A gente realmente pode. É só estudar, é só ir atrás, que você pode criar coisas”.

Para aprender com os tutoriais de costura criados por Elisa Dantas, visite o canal A Costureirinha no YouTube.

 

Onde costurar em SP

Elisa conta que para aprender a costurar não é preciso ter máquina de costura. Ela listou alguns lugares na cidade de São Paulo onde qualquer pessoa pode ir e costurar:

Atelier Co.sturando
Cosewing e espaço para cursos de artes manuais
Avenida Doutor Arnaldo,1620, Sumaré
facebook.com/ateliercosturando

Atelie Ton com Ton
Tudo para patchwork: aulas, workshops e produtos
Av. Leôncio de Magalhães, 1197 - Jd. São Paulo
toncomton.com.br

Atelie Vivo
Biblioteca pública de modelagem
Funciona na Casa do Povo
Rua Três Rios, 252, Bom Retiro
facebook.com/atelievivo

Lab Fashion
Espaço de co-working de costura
R. Dona Antônia de Queirós, 474. Cj-16 - Consolação
labfashion.com.br

Espaço Manufatura
Espaço criativo e de cursos e palestras
Rua Rodrigo Vieira, 172 Sala 02
facebook.com/espacomanufatura

Banco de Tecido
Acervo de tecidos disponível para troca e venda.
Rua Campo Grande, 504, V. Leopoldina
bancodetecido.com.br

Além desses, os Espaços de Tecnologias e Artes das unidades do Sesc também possuem grade regular de cursos sobre o tema e máquinas de costura à disposição.

Reportagem: Rafael Munduruca e Thais Amendola, editores web do Sesc Digital.