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Quando os rios de Ailton Krenak, Denilson Baniwa e André Vallias se encontram

Debate que marcou a abertura da intervenção Tessitura, no Sesc Belenzinho. <br>Foto: Alexandre Nunis
Debate que marcou a abertura da intervenção Tessitura, no Sesc Belenzinho.
Foto: Alexandre Nunis

Era uma quarta-feira de manhã quando o poeta paulista André Vallias e o líder indígena Ailton Krenak se reuniram no primeiro andar do Sesc Belenzinho. Ao telefone, olhos no relógio, André buscava o terceiro integrante do encontro, o artista Denilson Baniwa, do povo Baniwa, originário da Amazônia. Percebendo a aflição do amigo, Ailton aconselhou: "Calma, André, o tempo do Denilson é diferente: vai serpenteando, como o rio. Uma hora ele chega. Vamos seguir tranquilos, como se ele já estivesse aqui."

Do encontro entre André, Ailton e Denilson, surgiu a confluência simbólica de três rios: o Tietê, o Rio Doce e o Rio Negro. E foi da mistura dessas águas e histórias que nasceu a intervenção poética Tessitura, em cartaz no Sesc Belenzinho até 30 de abril. "A origem da palavra tessitura é a mesma de textura, tecido. É um entrelaçamento. A ideia aqui foi essa: três criadores entrelaçando suas criações", conta o poeta.
 

As poéticas expressas em relatos, poesia, grafismos e imagens convocam a entidade desses rios a falar. "É muito bom poder compartilhar essas vozes com as pessoas que circulam pelas cidades. O Sesc Belenzinho tem um público que eu gostaria muito que tivesse notícias do meu rio, o Rio Doce - esse que nós cantamos para ele mesmo quando ele está doente", conta Ailton Krenak.

Mais de 30 anos depois de participar da Assembleia Constituinte de 1987 -um importante marco na luta pelos direitos dos povos indígenas -, ele falou sobre memória, identidade e território:
 

 

A gente andava de pé livre. Pé livre, cabeça livre. A gente andava pisando na pedra, pisando no chão. A gente ia por dentro da água metendo o pé, assim, no fundo e a gente sabia era de matéria orgânica que tava podre, de material que estava ali. Aquelas coisas que caíam de folha, de mato. Ou se o chão era de areia, ou uma lage de pedra. A gente ia pegando isso tudo de sensação. Era o nosso pé que ía lendo o chão pra gente. A gente estava aprendendo. Então, nós aprendemos tateando. Tateando o mundo, tateando a terra. Sentindo o cheiro do mato, sentindo o cheiro dos bichos.

- trecho das memórias de Ailton Krenak que compõe a intervenção.


Tessitura é parte da programação do projeto Abril Indígena, que acontece nas unidades do Sesc durante todo o mês e, nesta edição, traz como assunto principal a luta dos povos indígenas por seus territórios. Saiba mais em sescsp.org.br/abrilindigena

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