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Acessibilidade presente

Foto: Haroldo Oliveira
Foto: Haroldo Oliveira

Neste momento, a necessidade de distanciamento físico e de permanecer no ambiente doméstico ressignifica o valor de se locomover pela cidade e usufruir de seus equipamentos e relações. No entanto, uma boa parte da população, composta por pessoas com deficiência, já se encontrava em situações de isolamento antes mesmo do atual cenário. As restrições impostas para contenção da Covid-19 evidenciaram o direito à cidade e a necessidade urgente de que todos os cidadãos e cidadãs, sem exceção, possam ir e vir, estudar, trabalhar, conviver, se expressar e ter acesso à vida cultural. Afinal, como ter, de fato, uma cidade inclusiva e acessível?

Idealizadora do Milalá, ponto de encontro digital que elabora pareceres e análises de lugares acessíveis para pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, a publicitária Mila Guedes destaca que o ambiente restrito é comum para parte dos cidadãos. “Esse isolamento não é, para as pessoas com deficiência, necessariamente uma novidade”, disse na live do Sesc Ideias Cidade Acessível: Que Cidade Queremos Pós-Pandemia? (leia Cidadania em foco). Para uma parcela que representa, pelo menos, 6,7% da população brasileira, segundo os últimos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pandemia reflete outro aspecto.

“Significa não ter que pensar: Será que vai ter calçada? Será que vai ter rampa? Será que o motorista de ônibus vai parar para me levar aonde eu quero ir? Será que quando eu chegar no metrô o elevador vai estar funcionando? Enfim, inúmeras questões que antes de sair de casa tenho que avaliar”, aponta. “E isso não é uma realidade minha. São preocupações de milhares de pessoas com deficiência”, acrescentou Mila Guedes.

 

Capacitismo cotidiano

Ou seja, a restrição ao lar apenas escancarou os desafios por que passam aqueles e aquelas que não conseguem usufruir da cidade e do convívio social. São diversos obstáculos. Além de barreiras físicas do espaço urbano, como a falta de calçadas e rampas, a desinformação e/ou a falta de consciência sobre essas questões resultam em preconceitos.

“Há uma crença matriz generalizada que reserva às pessoas com deficiências uma narrativa de dor, de abandono, de incapacidade, de falta, de dificuldade, de inadequação social. Mas isso não é real”, enfatiza Carlos Alberto de Oliveira, agente de atendimento do Sesc Vila Mariana, que teve paralisia infantil aos três anos de idade e, como sequela, ficou sem o movimento dos membros inferiores.

Tal crença na inadequação e incapacidade resulta no chamado capacitismo. Termo que define a discriminação e o preconceito social contra pessoas com alguma deficiência. “Como se deficiência fosse sinônimo de limite ou de incapacidade, uma vez que o modelo biomédico aponta para uma visão capacitista”, disse a médica Izabel Loureiro Maior na live do Sesc Ideias Direitos das Pessoas com Deficiência: Reflexões para o Pós-Pandemia à Luz do Conceito de Capacitismo (leia Cidadania em foco). Ou seja, um corpo diferente do corpo padrão para aquela sociedade e para aquele momento, seja pela questão do movimento, da fala, da audição, é um corpo à parte.

 

Acessibilidade atitudinal

Membro da Comissão de Acessibilidade do Sesc São Paulo, Carlão, como é conhecido Carlos Alberto de Oliveira, reforça que pensamentos e atitudes limitantes precisam ser alterados para que as pessoas com deficiência – seja ela física, motora, intelectual ou sensorial – “passem a ser vistas como parte da solução de problemas que são de todos, que são comuns e da coletividade”. Dessa forma, a acessibilidade atitudinal – definida como o conjunto de práticas interpessoais no sentido de diminuir diferenças e eliminar barreiras sociais – soma-se à acessibilidade arquitetônica das cidades para uma sociedade equitativa.

Para a médica Izabel Loureiro Maior, membro do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Rio de Janeiro, a barreira atitudinal não deve ser apenas desconstruída, mas nem sequer construída. “E você não constrói uma atitude preconceituosa, discriminatória se fizer com que crianças convivam entre diferentes, quaisquer que sejam as diferenças”, destaca. “Se eu já nasci numa situação de barreira atitudinal, quando eu me tornar arquiteto não vou me lembrar da acessibilidade, nem do desenho universal. Vou pensar naqueles que podem tudo, que tem dinheiro para tudo. E não é isso”, explica. 

Ou seja, falar de acessibilidade é falar de uma necessidade urgente de mudança. “Mudança de atitude real, de melhora, de aprimoramento. Mudança que significa aprender diferente com o diferente num processo educativo que é contínuo e permanente. Mudança da maneira como nós nos relacionamos com o mundo e com as pessoas. Mudança de ideias e crenças que limitam o potencial tanto das pessoas com deficiência, quanto de pessoas sem deficiência”, constata Carlos Alberto de Oliveira. Afinal, resume a médica Izabel Loureiro, “a discrepância na oportunidade [de emprego, de educação etc.] é a verdadeira deficiência da sociedade”.

 

Cidadania em foco

PROGRAMAÇÃO FOMENTA REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE DE HOMENS E MULHERES COM DEFICIÊNCIA NO PAÍS E COMPARTILHA SABERES

Quais os desafios e avanços vivenciados por pessoas com deficiência no Brasil? Como as cidades acolhem e excluem esse segmento da população? E por que esses assuntos dizem respeito à sociedade em geral? A partir dessas reflexões, o Sesc São Paulo realiza debates, cursos e outras ações no ambiente digital, voltadas ao público com e sem deficiência. “Quando nós, pessoas sem deficiência, não consideramos as pessoas com deficiência nas decisões e na participação social, prejudicamos sua presença cidadã. Objetivamente, nosso capacitismo pode criar barreiras à vida dessa população. Contudo, estamos implicados também na melhoria dessa realidade, por meio da mudança atitudinal e do fortalecimento da educação para a diferença”, explica Lígia Helena Ferreira Zamaro, assistente em Educação para Acessibilidade na Gerência de Educação para Sustentabilidade e Cidadania do Sesc São Paulo. Por isso, complementa, “o Sesc fomenta ações educativas e relacionais que possam colaborar nesse sentido, de forma contínua”.

 

Confira os destaques da programação de agosto:

CURSO - AUDIODESCRIÇÃO EM ATIVIDADES CULTURAIS

No curso online Audiodescrição em Atividades Culturais, realizado pelo Sesc Santo Amaro, o objetivo é promover reflexões sobre esse recurso de acessibilidade comunicacional que transforma imagens em palavras. Dessa forma, a audiodescrição amplia o entendimento e a experiência estética de pessoas com deficiência visual e de outros públicos em espetáculos, eventos e produtos audiovisuais, permitindo a participação em igualdade de condições. Ao todo serão quatro videoaulas com duração de 30 minutos cada uma e participação de convidados. Além disso, duas aulas acontecerão em um programa de videoconferências com duração de uma hora e meia cada uma, com a participação de todos os alunos, professora e convidados. Ministrado pela linguista Lívia Maria Villela de Mello Motta, doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e que foi coordenadora pedagógica do primeiro Curso Brasileiro de Especialização em Audiodescrição. (Dia 18/8, das 11h às 12h30 – aula ao vivo; 25/8, 1, 8 e 15/9, das 11h às 11h30 – aulas gravadas; e 22/9, das 11h às 12h30 – aula ao vivo).

 

CURSO - DIÁLOGOS ACESSÍVEIS

Realizado pelo Sesc Guarulhos, o projeto Diálogos Acessíveis tem como proposta abordar as relações entre acessibilidade a pessoas com deficiência, cidadania e direitos culturais desta população. O projeto abrange ações no campo da educação não formal, com foco em temas relacionados às ciências, humanidades e produção e difusão multimídia de saberes. Na programação, o curso Introdução a Libras, voltado principalmente a profissionais da área de saúde, busca apresentar a cultura surda e introduzir o conhecimento acerca do que é e como funciona a comunicação em Libras na Comunidade Surda do Brasil. Serão oito encontros virtuais de duas horas cada um, uma vez por semana, além de videoaulas e atividades extras. O curso será ministrado pelo especialista em Tradução e Interpretação de Libras/ Português e em Libras e Educação de Surdos Marcelo Guti. (De 12/8 a 30/9, quartas-feiras. 25 vagas por turma. Turma I - das 10h às 12h30. Turma II - das 18h30 às 21h).

 

SÉRIE PÍLULAS DE ACESSIBILIDADE

Realizada pelo Sesc Sorocaba, a série de vídeos Pílulas de Acessibilidade compõe um glossário sobre acessibilidade estrutural e atitudinal. Os primeiros, lançados em julho, tratam da audiodescrição e da legendagem. Outros vídeos devem ser disponibilizados neste e nos próximos meses. Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=tJFRA8QLQxI&t=92s

 

CONEXÕES ESPORTIVAS

As práticas esportivas, como manifestação da cultura corporal do movimento, assim como outras práticas culturais sofrem necessidade emergente de reconfiguração política, econômica e social. A partir de uma reflexão crítica acerca desse cenário, observa-se que a participação efetiva da pessoa com deficiência também requer atenção e visibilidade. Para isso, as unidades Ipiranga e Interlagos criaram o projeto Conexões Esportivas, uma programação conjunta para criar um espaço de discussão e reflexão com o intuito de perceber como esses atores sociais encontram oportunidades de acesso e participação e de que maneira a educação, o esporte, o lazer e o trabalho se encontram nessa teia complexa. Entre agosto e dezembro as duas unidades promovem, em sua programação online, bate-papos, live talks e webinars, com a participação de pessoas com deficiência, familiares, atletas, educadores e gestores de projetos e programas esportivos. Em agosto, o Conexões Esportivas terá como eixo de reflexão: Esporte, Acessibilidade e Participação. Serão disponibilizados vídeos gravados por atletas mulheres que compartilharam suas histórias. No dia 14/8, é a vez da medalhista paralímpica Verônica Hipólito. Assista a programação nos canais do Sesc Ipiranga e do Sesc Interlagos no YouTube.

 

Outras ações disponíveis no Youtube do Sesc São Paulo:

CIDADE ACESSÍVEL: QUE CIDADE QUEREMOS PÓS-PANDEMIA?

Após o período da pandemia, precisaremos de cidades que sejam para todos: pessoas com e sem deficiências. A fim de refletir sobre esse cenário, o Sesc Ideias realizou o debate Cidade Acessível: Que Cidade Queremos Pós-Pandemia?. Participação da publicitária Mila Guedes, idealizadora do Milalá, ponto de encontro digital que elabora pareceres e análises de lugares acessíveis para pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, e do Secretário Municipal da Pessoa com Deficiência de São Paulo Cid Torquato. Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=sLtrbrJK0x8&t=110s

 

DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: REFLEXÕES PARA O PÓS-PANDEMIA À LUZ DO CONCEITO DE CAPACITISMO

Neste debate, especialistas analisam os direitos das pessoas com deficiência e fazem uma reflexão sobre o capacitismo – fenômeno social ainda presente de forma velada ou explícita no cotidiano e que afeta a participação social desse segmento. Participação da coordenadora executiva do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, Marta Gil, da professora aposentada da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Izabel Madeira Maior, que também é conselheira do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Rio de Janeiro. Mediação do jornalista e colunista da Folha de S.Paulo Jairo Marques.  Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=gHOACEGOsNw

 

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