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Comparação da força e da flexibilidade em idosos praticantes de musculação e praticantes de hidroginástica

Introdução:

No Brasil, estima-se que a população de idosos seja 7%, mas a projeção para 2020 é de que esta porcentagem deva triplicar,  colocando o país em sexto lugar, em um âmbito mundial, em relação ao número de idosos ou pessoas com idade acima de 60 anos (PASSARELLI, 2000). A manutenção da capacidade funcional é um dos requisitos para um envelhecimento saudável e a função física é
reconhecida como componente importante da qualidade de vida, além de ser um indicador universalmente aceito do estado de saúde (RAMOS, 2003).

Atualmente tem sido discutida a prática de exercícios físicos para a manutenção de uma vida saudável para a população que envelhece (FLECK, 2006). A prática de exercícios físicos, além de combater o sedentarismo, contribui de maneira significativa para a manutenção da aptidão física do idoso. O conceito utilizado pelo American College of Sports Medicine (2000) resume que aptidão
física seria “uma série de atributos que as pessoas têm ou adquirem e que se relacionam com a capacidade de realizar atividade física”.

Pesquisas recentes têm mostrado que o treinamento de força de alta intensidade tem um profundo efeito sobre a independência funcional e a qualidade de vida de idosos (DANTAS, 1999). O fortalecimento muscular resulta em melhoria de força, resistência, densidade óssea, flexibilidade, agilidade e equilíbrio, embora o aumento da força muscular pareça ser o fator mais determinante na
melhora da contínua independência (DIAS et al., 2006).

Ao mesmo tempo a hidroginástica, com o aproveitamento das propriedades físicas da água, também apresenta vantagens para esse grupo populacional, possibilitando melhoras físicas, além de oferecer menores riscos. Apesar desses benefícios em potencial, a
prática da hidroginástica em idosos ainda é pouco estudada.

Dessa forma, pretendemos avaliar os efeitos do treinamento de força e da prática da hidroginástica na capacidade funcional de idosos, e comparar qual das atividades propicia os melhores resultados na força e na flexibilidade.

MATERIAIS E MÉTODOS

Desenho do estudo

Esta pesquisa se caracteriza como um estudo descritivo de corte transversal com amostragem não probabilística voluntária (GAYA et al., 2008).

Amostra

A amostra foi composta por 16 indivíduos idosos de ambos os sexos, divididos em dois grupos: 8 indivíduos praticantes de musculação (G1) e 8 indivíduos praticantes de hidroginástica (G2). Para participar do estudo os indivíduos deveriam praticar musculação ou hidroginástica há pelo menos seis meses e no mínimo duas vezes por semana. Os participantes foram recrutados na Faculdade da Serra Gaúcha, na cidade de Caxias do Sul/RS, e em uma academia da mesma cidade. Os participantes assinaram um “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, concordando com a participação no estudo.

Instrumentos de avaliação

Foi realizada uma avaliação da composição corporal, mensurando-se a massa corporal por meio de uma balança digital (Plena, resolução de 100 gramas), a estatura por meio de um estadiômetro (Sanny, resolução de 1 mm) e as dobras cutâneas por meio de um adipômetro científico (Sanny). A densidade corporal foi calculada utilizando-se a fórmula proposta por Jackson et al. (1978, 1980) e para o cálculo do porcentual de gordura foi utilizada a equação de Siri (1961).

O Índice de Massa Corporal (IMC) foi obtido pelo cociente massa corporal/estatura, sendo o valor expresso em quilogramas por metros quadrado. Para a avaliação da capacidade funcional foram realizadas quatro avaliações da bateria de testes proposta por Rikli e Jones (1999):

• Teste de levantar da cadeira em 30 segundos: para avaliação da potência de membros inferiores. O indivíduo deve realizar quantas vezes for possível a ação de levantar e sentar de uma cadeira no tempo de 30 segundos.

• Teste de flexão de cúbito: para avaliação da força de membros superiores. O indivíduo deve realizar a maior quantidade de flexões de cúbito durante 30 segundos, sendo utilizado um peso de 2,5 kg para mulheres e de 3,5 kg para homens.

• Teste de sentar e alcançar em uma cadeira: para avaliar a flexibilidade de membros inferiores. O indivíduo deve sentar em uma cadeira e tentar tocar os dedos dos pés com os dedos das mãos. Se os dedos das mãos ultrapassarem os dos pés, os valores serão considerados negativos. A distância é avaliada com uma régua.

• Teste de coçar as costas: para avaliar a flexibilidade de membros superiores (ombro). O indivíduo deve alcançar atrás das costas com as mãos para tocar ou sobrepor os dedos de ambas as mãos o máximo possível. A distância é avaliada com uma régua.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

A normalidade dos dados foi testada com o teste de Shapiro-Wilk. Para a comparação entre os grupos foi utilizado o teste T para amostras independentes. Foi adotado um p≤0,05.

RESULTADOS

A Tabela 1 apresenta as características dos participantes. Em relação a idade (p=0,80), peso (p=0,35), estatura (p=0,58) e Índice de Massa Corporal (IMC) (p=0,15), não foram encontradas diferenças entre os grupos. Entretanto para o % de gordura foi encontrado valor significativamente maior no G2 (p=0,02). De acordo com a WHO (1998), os indivíduos de ambos os grupos encontram-se em um grau de obesidade leve, indicando um excesso de peso. Entretanto, para o porcentual de gordura os grupos apresentaram valores acima dos recomendados para a faixa etária (ACSM, 2003).

Conforme apresentado no Gráfico 1, não foram encontradas diferenças significativas na potência de membros inferiores entre os grupos avaliados pelo “teste de sentar e levantar em 30 segundos” (p=0,07). Entretanto no “teste de flexão de cúbito”, que avaliou a força de membros superiores, os resultados indicaram diferença entre os grupos, pois o G1 apresentou valores mais significativos
(p=0,49) (Gráfico 2). Em relação à flexibilidade de membros inferiores mensurada pelo “teste de sentar e alcançar em uma cadeira”, e apresentada no Gráfico 3, também não foram encontradas diferenças entre os grupos (p=0,07).

No entanto, quando se avaliou a flexibilidade de membros superiores pelo “teste de coçar as costas”, os idosos do G2 apresentaram valores consideravelmente maiores que os do G1 (p=0,03) (Gráfico 4).

DISCUSSÃO

O presente estudo objetivou verificar os níveis de força e flexibilidade em membros superiores e inferiores entre idosos praticantes de musculação e praticantes de hidroginástica.

No primeiro teste aplicado, o de “sentar e levantar” procuramos verificar basicamente a força e resistência dos membros inferiores. Como vimos no Gráfico 1, não houve diferença significativa entre os grupos, no qual nossos resultados são semelhantes aos de Frontera et al. (2003), os quais verificaram que em ambas as atividades, musculação e hidroginástica, os membros inferiores normalmente são mais utilizados, além de serem mais recrutados em atividades diárias.

Já para Matsudo et al. (2000), idosas praticantes de hidroginástica apresentaram a força de extensores de joelho significativamente maior, em testes similares, argumentando que a hidroginástica proporciona uma utilização maior da musculatura em membros inferiores decorrente da movimentação na água, ocasionando um aumento da resistência muscular.

De acordo com Kura (2008), a força de membros inferiores é uma variável extremamente importante para a independência e mobilidade do idoso, já que nas atividades mais simples, como caminhar, levantar-se de uma cadeira ou, mesmo, permanecer em pé por um determinado tempo, os membros inferiores são mais utilizados. Em função disso, uma comparação entre grupos ativos  sugere que haverá uma certa igualdade nos níveis de força. Matsudo et al. (2000) descrevem que, durante o envelhecimento, a maior perda de força ocorre nos membros inferiores, quando comparados aos superiores, justificando esse fato pela menor utilização da musculatura com o passar dos anos, já que os idosos diminuem o nível de atividade física, permanecendo durante a maior parte do tempo sentados ou deitados. No entanto, quando indivíduos idosos praticam algum tipo de exercício físico sistemático, ou mesmo se mantêm em níveis adequados de atividade física diária, esta perda pode ser bem reduzida.

No segundo teste o de “flexão de cúbito”, avaliamos a força e resistência dos membros superiores. Como mostra o Gráfico 2, nossos resultados apresentaram uma certa vantagem para o grupo praticante de musculação. Nossos resultados foram compatíveis com as observações de McCartney et al. (1993), que, apesar de observarem uma diminuição da força do segmento superior corpóreo com a idade, notaram que essa alteração pode ser modificada com a prática de exercícios físicos. Matsudo et al. (2000) descrevem que, em estudo realizado com idosos, foi observada uma melhora significativa da força muscular após treinamento de força em membros superiores.

Em outro estudo, Onder et al. (2005) apud Geraldes et al. (2008) demonstraram que o desempenho funcional apresentou melhores resultados quando os idosos praticavam tarefas que envolviam maior esforço muscular, o que vai ao encontro dos resultados do  presente estudo. Lung et al. (1996) apud Geraldes et al. (2008), por sua vez, lembram que os membros superiores, ao contrário dos inferiores, têm seu uso continuado durante todas as etapas da vida. Neste sentido, a avaliação da força e da função muscular assume importância no processo de envelhecimento, uma vez que são fundamentais para a autonomia do idoso, em razão da  grande quantidade de atividades cotidianas, nas quais se necessita de certos níveis de força para executá-las (DANTAS, 2006). Logo, a manutenção de bons níveis de força é necessária para o desempenho satisfatório nas tarefas diárias, sejam essas atividades profissionais ou cotidianas, e para a manutenção de uma boa qualidade de vida (BORGES et al., 2008).

No Gráfico 3, com o teste de “sentar e alcançar”, que mede a flexibilidade dos membros inferiores do corpo (flexão de quadril e da coluna vertebral), em nosso estudo os avaliados não apresentaram diferença nos resultados. Isso indica que é provável que a flexibilidade, quando trabalhada de forma adequada nos exercícios aquáticos e de academias, justifique este achado. Tendo em  vista esta ausência de diferenças, pode-se concluir que a prática regular e bem orientada de atividades foi capaz de aprimorar a flexibilidade dos idosos, valência física tão importante por garantir a amplitude dos movimentos. Entretanto, Matsudo et al. (2000), em estudo realizado, constataram melhora nos níveis de flexibilidade, em testes semelhantes realizados com idosos, após um  treinamento de força.

No quarto teste aplicado, o de “coçar as costas”, que procura avaliar a movimentação geral do ombro, em nossos resultados, conforme demonstra o Gráfico 4, foi observada uma flexibilidade melhor no G2 em relação ao G1. Em síntese, este estudo  demonstrou que um programa de exercícios físicos direcionados, realizados na água, como a hidroginástica, pode ser uma  estratégia eficaz para manter a autonomia funcional. Okuma (2002) apud Rebelatto et al. (2006) aponta, em seus estudos com resultados similares, que, para um idoso realizar suas tarefas cotidianas, ele necessita de pouca aptidão cardiovascular, e muito de um conjunto de capacidades como força muscular, resistência muscular localizada e flexibilidade. Hubley-Kozey et al. (1995) apud  Alves et al. (2004), em estudos realizados, observaram melhoras significativas na amplitude dos movimentos do ombro em indivíduos idosos que participaram de um programa de exercícios regulares de hidroginástica, e por não haver impacto pode auxiliar de forma eficaz no ganho de flexibilidade. Já para Dantas e Soares (2001), indivíduos que praticam musculação, por trabalharem mais a força e hipertrofia, podem ocasionar uma redução dos movimentos articulares.

Dentro deste contexto, a avaliação da força e flexibilidade assume importância no processo de envelhecimento, uma vez que são fundamentais para a autonomia do idoso, em razão da grande quantidade de atividades cotidianas, nas quais se necessita de certos níveis de força para executá-las. Logo, a manutenção de flexibilidade e de bons níveis de força é necessária para o desempenho satisfatório nas tarefas diárias, sejam essas atividades profissionais ou cotidianas, e para a manutenção de uma boa qualidade de vida (BORGES et al., 2008).

Vários estudos, assim como o presente estudo, apontam para os benefícios dos programas de exercícios físicos para idosos.

CONCLUSÃO

A prática de atividade física com o objetivo de melhora no desempenho e na independência de idosos deve ser acompanhada de uma avaliação criteriosa. Dessa forma, podemos concluir que tanto a musculação quanto a hidroginástica promovem melhoras na aptidão física de indivíduos idosos. Entretanto, este ganho é dependente da atividade realizada e do que especificamente é  trabalhado no treino. Entretanto, sugere-se que outros estudos sejam realizados com esta mesma finalidade, com uma amostra maior, no intuito de proporcionar maior conhecimento sobre diferentes tipos de treinamento na força e flexibilidade de idosos a fim de prevenir a fragilidade e promover a saúde.

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