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O Grupo Grial, o popular e o erudito

Maria Paula Costa Rêgo e Seu Martelo, no espetáculo
Maria Paula Costa Rêgo e Seu Martelo, no espetáculo "Castanho Sua Cor"

Em agosto, o Sesc Belenzinho recebe dois espetáculos de dança dentro da terceira edição de 2013 do projeto Trajeto: Castanho Sua Cor, nos dias 21 e 22, e Terra, nos dias 24 e 25. Ambos são criações do grupo pernambucano Grial, criado em 1997 pelo escritor e dramaturgo Ariano Suassuna e pela coreógrafa Maria Paula Costa Rêgo

A EOnline conversou com Claudia Garcia, programadora de dança do Belenzinho, que nos trouxe um pouco de tudo sobre dança contemporânea: dificuldades, movimentações, necessidades e uma certeza "a pouca oferta de dança provoca pouca demanda por dança e que é necessário ofertar sempre para criar novos públicos e estimular os criadores a produzir e dialogar cada vez mais". Confira a entrevista abaixo.

EOline: O "Trajeto" foi concebido como um projeto que revisitasse "espetáculos que fazem parte da história recente da dança, permitindo conhecer a trajetória de um coreógrafo e entender como se dá a construção do seu pensamento em dança". Você poderia falar mais sobre esse "recente" da frase anterior e, se possível, apontar se existe o diálogo com algum método ou pedagogia do ensino da dança contemporânea? Afinal, estamos falando de um projeto para "iniciados"?
Claudia Garcia: O Trajeto tem como proposta investigar a obra de criadores de dança contemporânea no Brasil que atendam a alguns pré-requisitos: terem uma contribuição de excelência artística para a linguagem, com trabalhos que demonstrem uma trajetória consistente de pesquisa (o que inclui, muitas vezes, obras muito diferentes umas das outras) e estarem “na ativa”.

A partir destes critérios, grupos ou artistas de “estilos” e “métodos” muito diversos já participaram do projeto, passando por companhias e grupos tão diferentes entre si quanto Vera Sala, o Ballet Stagium, a Adriana Banana, a Lia Rodrigues Cia de Danças, o Grupo Grial, para citar alguns. Em outras palavras, uma das propostas do projeto é justamente mostrar a diversidade do que se convencionou chamar dança contemporânea no Brasil, reverenciando criadores que são referências para a linguagem no país todo. Por buscarmos essa diversidade, acredito que o projeto não é para iniciados ou iniciantes, mas para qualquer pessoa que se interesse pela dança e queira conhecer criadores muito tarimbados.

EOnline: Na Revista São Paulo, o grupo Grial é anunciado como aqueles que levam a cultura popular para o universo erudito. Você acredita que é por aí mesmo? Que a pesquisa do Grial se dá nesse sentido, numa espécie de acesso ao contrário, do popular para as elites eruditas? A dança contemporânea é erudita por "excelência" ou a coisa é mais complexa, mais no sentido das dificuldades de se estabelecer um circuito de difusão para dança, ações formadoras de público e assim por diante?
C.G.: Acho que a frase “levam a cultura popular para o universo erudito” pode dar a entender que o Grupo Grial é formado por populares que pretendem levar sua cultura para um público mais erudito. Mas não me parece essa a proposta do grupo! Penso que o embate entre popular e erudito no Grial se dá desde a construção do espetáculo, pois algumas obras do grupo são criações com temas e inspirações populares trabalhadas numa chave erudita. Por outro lado, pode parecer que o grupo sempre trabalha um conteúdo popular em uma forma erudita, o que também não é o caso, pois há trabalhos do grupo em que a forma é inspirada no universo popular (no formato de um cortejo, ou de uma celebração) e o conteúdo é que é complexo, sofisticado, filosófico...

Quanto à segunda parte da pergunta, vamos partir do pressuposto de que a produção artística em todas as linguagens não é acessada pela maior parte das pessoas e que faz parte da missão do Sesc ampliar este acesso através de programação constante, de qualidade, a preços populares. Não acredito que a dança contemporânea seja por excelência nada, pois como disse antes, o grande barato é ser uma produção plural e diversa e se, por um lado há espetáculos que serão apreciados por poucos, também há gente fazendo dança contemporânea na rua, na periferia, fora do eixo Rio-São Paulo, entregando dança a domicílio...

EOnline: O Grial foi criado em 1997 e possui mais espetáculos na trajetória do que os que serão encenados aqui - um solo e outro sobre a formação cultural do povo brasileiro. Seguramente, existe uma razão para "Castanho, sua cor" e "Terra" fazerem parte da programação: você poderia falar um pouco sobre este recorte?
C.G.: Sim, há sempre uma razão para esse recorte. "O Castanho Sua Cor" é um espetáculo em que a Maria Paula Costa Rêgo, que criou o Grupo Grial em parceria com o Ariano Suassuna, está em cena, contracenando com Seu Martelo, um brincante de cavalo marinho muito tradicional de Pernambuco. O espetáculo retoma mitos e lendas em torno da formação do povo brasileiro e mistura elementos contemporâneos e populares. Já "Terra" é um solo da Maria Paula. É a última criação do grupo e traz para a cena uma discussão densa sobre as origens do Brasil, através da metáfora da terra, do chão que pisamos.

EOnlie: Você destacaria algum momento/performance nos espetáculos? Algo que tenha te tocado ou que tenha provocado reflexão a partir da encenação?
C.G.: Os dois trabalhos são belíssimos e muito diferentes um do outro. Em "Castanho Sua Cor", gosto muito de ver Seu Martelo em cena, uma figura que carrega em si o corpo e a expressão de todo um povo! Já "Terra" estreia aqui no Belenzinho, então acho que será uma surpresa bacana para todos nós.

EOnline: Ainda que o grupo tenha sido formado por uma figura que dialoga com o popular e o "massivo", como o Suassuna, o Grial não desfruta de um reconhecimento igualmente popular e/ou massivo. No começo desse ano, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad escolheu uma coreógrafa carioca (Deborah Colker) para o Conselho da Cidade, causando indignação da categoria paulistana. Depois, permitiu-se a inclusão de um representante indicado pelo movimento "A Dança se Move". Partindo disso, você poderia falar das dificuldades de se produzir e fruir da dança contemporânea? Existem espaços constituídos para essa fruição ou trata-se de algo fechado, quase restrito ao público habitual das apresentações?
C.G.: Legal essa pergunta! Deste episódio com o Conselho da Cidade, penso que nós paulistanos podemos ficar muito satisfeitos de ver uma parte da classe se articulando (falo do “Dança se Move”) e querendo participar da construção de políticas públicas para a área. Penso que um dos grandes desafios para os criadores na cidade é circular mais, mostrar seu trabalho em outros lugares do Brasil, difundir sua produção. Na cidade de São Paulo, o circuito para ver dança pagando pouco ou gratuitamente se restringe aos Sescs, ao Centro Cultural São Paulo, à Galeria Olido e mais algumas poucas salas, e pelo tamanho da cidade, há também poucos Festivais e Circuitos em que a produção de dança possa ser apreciada. Penso que a pouca oferta de dança provoca pouca demanda por dança e que é necessário ofertar sempre para criar novos públicos e estimular os criadores a produzir e dialogar cada vez mais.

Então você pode muito bem aproveitar o espaço do Sesc Belenzinho e vir conhecer o trabalho do grupo Grial, no Trajeto de agosto.  

o que: Castanho Sua Cor
Grupo Grial de Dança
quando: 22/agosto | Qui., 21h
onde:

Sesc Belenzinho

o que: Terra
quando:

24/agosto | Sáb., 21h30

25/agosto | Dom., 17h

onde:

Sesc Belenzinho