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Tata Amaral

Crédito: Ding Musa
Crédito: Ding Musa


A paulistana Tata Amaral é uma das mais premiadas cineastas brasileiras da atualidade. Seu longa-metragem de estreia, Um Céu de Estrelas (1997), foi considerado pela crítica como um marco do cinema brasileiro, além de ter recebido 18 prêmios no Brasil, Estados Unidos, Itália, Cuba e França. A produção Antônia (2006), por sua vez, inspirou a série de televisão homônima exibida na Rede Globo, que foi indicada ao Emmy em 2007. Neste Encontros, Tata Amaral fala sobre a série de documentários Rua, lançada em junho, e sobre o filme O Vilão da República, ainda em produção. “Esse filme é com o José Dirceu, não é sobre o José Dirceu”, adianta.


Cidade no cinema

A cidade invade os meus temas. Não digo que seja sem querer. É que a cidade invade o meu imaginário. Acho São Paulo incrível, nasci aqui, na rua Major Quedinho. Abria a janela e via a Nove de Julho na minha frente, com seus viadutos para cá e para lá. Então essa relação do íntimo com o urbano foi em toda a minha vida. Até eu sair do centro, com uns 25 anos, a cena íntima acontecia com aquela moldura da Nove de Julho. É inevitável para mim.

E a coisa dos temas propositivos, do político, acho que tem a ver com a minha formação. Fui militante na adolescência, e esse olhar para questões sociais foi também inevitável para mim. Já fiz alguns filmes de entretenimento, que as pessoas dão risada, mas há sempre uma coisa política e social implícita, como em Viver a Vida, que é um dia na vida de um office boy, cheio de situações engraçadas. Cada vez mais estou indo para essa coisa de humor e política ao mesmo tempo.


“Rua”

Acabo de produzir essa série, que foi realizada pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania. Ela surgiu muitos anos atrás, talvez quando proibiram a venda de cachorro-quente na rua. Tinha um caráter de memória, relacionada à especulação imobiliária, pois a minha avó tinha uma casa no bairro de Pinheiros, onde passei a infância, que hoje não existe mais. Era contar a história dessa cidade que não está em um passado tão remoto assim.

É uma série na qual os 13 documentários olham para a rua e buscam iluminar iniciativas que estão acontecendo em São Paulo, como hortas comunitárias, grafite, ativismo, carnaval… Enfim, tudo o que acontece na rua. Até porque, hoje, eu acho que São Paulo é um paradoxo, pois por tantos anos foi um lugar de proibições, onde um vendedor de comida ambulante não podia isso ou não podia aquilo, e hoje é a cidade onde tanto ativismo está acontecendo. Eu me lembro que no final do ano passado, inclusive, o Sesc Pompeia fez uma programação muito especial sobre o tema.

Eu documentei 13 iniciativas, mas, para mim, elas são infinitas. Eu adoraria continuar fazendo infinitamente, pois todas essas iniciativas propõem transformações na cidade, transformações para melhor. Ela foi lançada em junho, com episódios exibidos na rua, em vários pontos da cidade, como o Grajaú, Ermelino Matarazzo, Largo da Batata e Praça Roosevelt.


O vilão

Esse filme é com o José Dirceu, não é sobre o José Dirceu. Eu me preocupei muito mais em conhecer a intimidade, quebrar a persona pública do Dirceu. Na minha cabeça, o filme começou na época do Collor, com a ideia do “caçador de marajás” e de como foi construída na mente das pessoas a existência dos marajás e do salvador, que foi eleito, por meio das narrativas audiovisuais da imprensa. Quando comecei a ver, em 2004, as denúncias do mensalão, eu identifiquei uma narrativa. E essa narrativa construiu um vilão da República.

O Jorge Furtado me falou uma coisa muito interessante: se o povo brasileiro fosse alfabetizado audiovisualmente, nós não teríamos votado no Collor, porque a gente teria identificado a construção. E acho que isso aconteceu na época do mensalão, como eu acho que está acontecendo agora. E hoje, com as redes sociais, você tem muito mais acesso à informação, pois não depende de apenas cinco veículos de comunicação. Esse filme problematiza o fato de que, até pouco tempo atrás, a informação era de mão única.


Próximos passos

Faço longas-metragens. Talvez o mais conhecido seja Antônia, que foi licenciado para a Globo e depois gerou uma série de duas temporadas, com dez episódios ao todo. Ano passado lancei o Hoje, com a Denise Fraga e o César Troncoso. É a história de uma mulher que compra um apartamento com o dinheiro que ela recebe do Estado Brasileiro por indenização pelo desaparecimento do marido. Nesse momento, estou finalizando o Trago Comigo, que é derivado dessa série, copatrocinada pelo Sesc. E estou lançando o De Menor, um filme da Caru Alves de Souza, minha sócia. É o primeiro longa dela, e vamos lançá-lo dia 4 de setembro.


“A cidade invade os meus temas. Não digo que seja sem querer. É que a cidade invade o meu imaginário”

A cineasta Tata Amaral esteve presente na reunião do Conselho Editorial da Revista E no dia 11 de junho de 2014