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Careqa de Saber

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

O ator e músico Carlos Careqa está completando 30 anos de carreira em 2014 e, para comemorar, apresenta o show "30 anos na contramão" no Sesc Consolação, com convidados especiais: Arrigo Barnabé, no dia 19/ago, e Mônica Salmaso e Zeca Baleiro no dia 20

“30 anos na contramão!” como ele mesmo define. Carlos Careqa iniciou a carreira de músico em Nova Iorque tocando em bares e restaurantes antes de se radicar em São Paulo, há 23 anos, mas o “curitibano nascido em Santa Catarina” sentiu-se em casa mesmo quando conheceu a Praça Roosevelt.

Chegou por aqui quando já haviam premeditado o breque, mas a afinidade foi instantânea – “foi como se eu tivesse uns parentes distantes pensando o mesmo que eu”, afirmou o cantor. No CD Ladeira da Memória, lançado pelo Selo Sesc em 2013, Careqa presta homenagem aos compositores da Vanguarda Paulistana.

Ao longo da carreira artística colecionou no currículo, além dos 10 discos, peças e filmes, amigos como Chico Buarque, Vania Abreu e André Abujamra, entre muitos outros que são participações certas em seus trabalhos.

No show que celebra estas três décadas de vida artística, o “ex-zagueiro do juvenil do Água Verde e ex-seminarista” recebe no palco do Teatro Anchieta, no Sesc Consolação, os amigos Arrigo Barnabé (no dia 19 de agosto), Zeca Baleiro e Mônica Salmaso (dia 20).

Antes, no entanto, o trio aceitou o convite da EOnline para apresentar o Careqa dos platinados fios desalinhados, e o fizeram com o mesmo bom humor de músicas como ‘Não Dê Pipoca aos Turistas’ e ‘O que é que cê tem na cabeça’.

 

(Foto: Divulgação)
 

Carlos Careqa, pseudônimo de Carlos de Souza, pai barbeiro, mãe dona de casa, família grande, muitos irmãos, ex-seminarista.

Ficou célebre quando, em promissora carreira de beque central (no juvenil no Agua Verde, hoje extinto clube da capital paranaense) enfrentando o Arapongas Esporte Clube, em decisão válida pelo título juvenil paranaense, o altaneiro Careqa, anulou Beleléu - centroavante  revelação do campeonato. Em um lance duvidoso, porém, aplicou-lhe violenta canelada dentro da área.

Como o jogo era em Curitiba, o juiz não deu pênalti. Beleléu, porém, contorcia-se no gramado clamando pelo pênalti. O juiz deu tiro de meta, e Careqa gritou: - deixa de conversa mole negão! Deixa de conversa! Parece a nega Luzia! Beleléu, (também conhecido por Nego Dito) enfurecido partiu para cima do bravo zagueiro!  Sopapos voaram pelo gramado! Nego Dito foi expulso e desistiu da carreira, tornando-se posteriormente compositor.

Carlos Careqa, traumatizado com a própria violência, entrou no seminário salesiano de Caiobá, onde viveu em penitência, catando conchinhas na areia do mar. Adotou, então, o pseudônimo de "Gafanhoto" em homenagem ao personagem televisivo da série Kung Fu. Por sua piedade e devoção (além da compleição física) seus coleguinhas adotaram o apelido de "Louva Deus".

Numa manhã cinzenta, enquanto catava conchinhas na praia, Gafanhoto encontrou uma garrafa. Dentro dela uma mensagem perturbadora: a imagem de São Jorge lutando contra um gigantesco crocodilo. Carlos Careqa passou a ter pesadelos horríveis com o crocodilo!

Preocupado com a saúde mental daquele estranho seminarista, o padre superior convocou o eminente jesuíta Padre Quevedo, e solicitou sua ajuda para resolver o problema.

O padre Quevedo logo percebeu um excesso de sensibilidade naquela jovem alma, que, em sua profunda melancolia só queria voltar a rever o batatal, as galinhas e o marreco de sua horta caseira.

Era necessário alguma distração, alguma coisa que tirasse o crocodilo da cabeça da jovem alma!  Foi um formidável "insight" do padre Quevedo, perceber no rapaz um pendor para o canto… Avisou ao superior que ele deveria fazer com que "Louva Deus"  ingressasse no coral.

Que bênção, para o ainda glabro Souza! Cantar passou a ser a sua salvação! Aliviava a alma na capela, sua bela voz, transtornada pela angústia, tornava-se, a cada dia, mais e mais pungente.

Transforma-se em uma atração nos ofícios. Acabou por despertar a atenção de um sacerdote moderno, que o assedia com propostas para gravar hinos religiosos. Convicto que o noviço seria um grande sucesso, o sacerdote não hesitou em seduzi-lo com ouro e bens materiais.

Aquilo  fulminou os sonhos religiosos do ex-zagueiro.

Desiludido com o materialismo da igreja jogou a batina no ringue. O episódio, porém, longe da abatê-lo, tonificou-lhe os músculos morais. Decidido a aprimorar seus talentos, ingressou na carreira de cantor/compositor sempre com a esperança de um dia poder abrandar a violência que carrega insuspeita, em seu coração (e pés, sempre que coloca uma chuteira…). Desde então tem colhido louros, palmas e orégano! Seu maior sonho é poder encontrar Beleléu, para então dizer-lhe: - compadre, não se amofine, os homens não são todos iguais…

Arrigo Barnabé

(Foto: Gal Oppido)
 

Desde a origem, Carlos Careqa (assim, com Q mesmo) é um caso à parte na música brasileira.

Curitibano nascido em Santa Catarina, ele poderia ter sido padre, barbeiro ou coisa que o (na)valha.

Podia ter sido comediante também. Se bem que, pensando bem, isso ele é (ainda que um comediante, digamos, enrustido).

O fato é que ele optou (ou foi cooptado) pela música popular e se tornou um “cantautor”  único, um fazedor de canções que juntam inteligentemente sarcasmo e lirismo, saudosismo e vanguardices, punk e bossa nova.

Um dia um anjo surgiu das sombras e lhe disse: "Vai, Carlos, ser gauche na vida!".
Ele entendeu Groucho e virou o palhaço adorável que é fora do palco (e às vezes dentro também, pra nosso desespero).

Eu, por minha vez, lhe disse seguidas vezes: "Cara, você é um grande cantor, assuma o seu lado Roberto Carlos".

Ele preferiu ser o Erasmo da história. E que baita Erasmo!

Zeca Baleiro
 

(Foto: Divulgação)
 

O Careqa é um artista ousado.

Falei isso pra ele e ele não sabia se eu queria dizer uma coisa boa ou ruim.

Isso é bom. E é pra poucos.

Às vezes, eu acho que ele faz de propósito. Pra provocar.

Outras vezes eu acho que ele é assim mesmo. Nasceu provocador.

O fato é que ele faz seu caminho seguindo adiante, viabilizando formas de seguir produzindo livremente.

E assumindo os riscos, a beleza e as dificuldades desse caminho que é o dele.

O da natureza dele.

Monica Salmaso