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A função social da atividade física e esportiva na velhice

Foto: Adauto Perin
Foto: Adauto Perin

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Vagner Martins dos Santos Junior (1)

 

Recentemente em pesquisa da Ipsos Public2 - a partir de uma amostra em território nacional -, encomendada pelo Sesc São Paulo, com objetivo de verificar sobre a prática de atividades físicas e esportivas entre homens e mulheres dos dados coletados, encontrou-se entre os idosos a prática efetiva de atividades físicas e esportivas.

Segundo essa pesquisa A prática de esportes e atividades físicas também é mais comum entre os jovens de 16-24 anos do que entre os mais velhos. Entretanto, examinando a frequência de 3 vezes ou mais na semana, a terceira idade apresenta índices semelhantes aos muito jovens (17% e 18% respectivamente) (IPSOS, 2013, p.5). Em plena sociedade da informação,indivíduos com mais de 60 anos passam a desconstruir narrativas negativas acerca da velhice em busca de sentido e significado para suas vidas. Em posse de celulares,tabletes, computadores, participantes de redes sociais, os idosos mantêm aceso o desejo de relacionar-se, conhecer e explorar o mundo por meio das mais diferentes experiências.

Aqui, cabe ressaltar o conceito de experiência a partir de Jorge Larrosa (3) que aponta para o sujeito que se permite viver a experiência de maneira a ser afetado por ela e se transforme, se modifique. Nas relações com o mundo, com o outro e com os diferentes ambientes possa identificar e criar novos significados e dar novo sentido e perspectivas à vida.

Entre as diferentes e inúmeras experiências escolhidas durante o processo de envelhecimento surgem aquelas sugeridas por amigos, parentes e profissionais especializados. No caso dos idosos, o saber médico torna-se frequente e presente. Dados da Pesquisa IPSOS confirmam que a procura pela atividade física e esportiva em 93% dos entrevistados, acima de 60 anos se dá por motivos de saúde.

Desta forma a recomendação para a prática de atividades físicas e esportivas como promoção da saúde é bem significativa e aceita por grande parte dos idosos e seus familiares. No Sesc Santo Amaro, a partir da observação de diferentes grupos de alunos idosos, percebe-se que as atividades físicas e esportivas passam a ter significado de extrema importância em suas vidas. O que inicialmente tinha como objetivo maior a saúde, expande-se e transcende as fronteiras do corpo biológico e atinge a corporeidade, ou seja, o universo das relações humanas, os encontros e a construção de novas histórias.

Desta forma, se o principal motivo para o início ou retomada da prática de atividade física e esportiva é a saúde, então qual seria o principal motivo para a permanência nessas atividades, assim como a procura por outras nesse contexto?

Experiências com diferentes grupos deixam perceber que a sociabilização, a interação, o compartilhar experiências, podem ser excelentes motivos para permanecer e apropriar-se de um lugar e dar significado a ele. Um lugar de ser e estar, de aprender e ensinar. Observou-se que a participação nas atividades físicas em grupo que permitam maior incremento na sociabilização, conta com maior adesão do público feminino. Por outro lado, a prática de esportes encontra mais aceitação junto ao público masculino. No processo de envelhecimento essas atitudes têm continuidade e afetam significativamente homens e mulheres que mantêm essa tendência de comportamento.

Entendemos que o Programa de Atividade Física pode, e deve, oferecer oportunidade para revisão de conceitos e transposição de barreiras sedimentadas socialmente. Assim, com intuito de colocar em prática esse conceito de atuação, durante o mês de junho, integrando o Projeto Sesc na Copa – extensa programação que trouxe temas e assuntos ligados ao universo do futebol, em todas as unidades operacionais no estado de São Paulo -a unidade do Sesc Santo Amaro promoveu sob o tema “No Movimento do Chute” aulas que integram o Programa Sesc de Esportes, na turma do Programa Esporte para Idoso, para que os alunos vivenciassem a prática do futebol.

Quanto à participação dos alunos, observou-se:

• Resistência inicial das mulheres à prática do futebol: Socialmente, o aspecto masculino do futebol ainda é forte, sugerindo que determinados esportes estão relacionados a determinados gêneros.
• O futebol sob o estereótipo da violência: Ainda sob o olhar feminino, e em alguns poucos casos sob o olhar masculino, o futebol é visto e entendido como um esporte violento.
• Fragilidade dos corpos na velhice: Com o olhar voltado para as limitações dos corpos na velhice, surge a sensação de impossibilidade dessa prática, tanto por homens como mulheres.
• Relações de poder: As questões de gênero e construção social do masculino e do feminino bem como os mecanismos de regulação e controle.

A observação do comportamento dos alunos e alunas frente a esse novo desafio, dá-se a partir da prática do jogo em si. No aprender por meio de diferentes estratégias, as aulas passam a configurar um espaço lúdico onde as regras são construídas 
com os alunos, tem espaço e tempo definidos e caráter desinteressado, espontâneo. Certamente, a natureza competitiva é levada em consideração e estimulada por meio da cooperação durante os jogos propostos.

Desta forma, as estratégias traçadas nesta experiência favoreceram a prática do futebol respeitando algumas características do grupo:
• Habilidades motoras e capacidades físicas;
• Grau de interação entre os participantes da turma de Esporte para Idosos;
• Interesse do grupo nas experiências oferecidas anteriormente;
• Lideranças construídas e eleitas pelo grupo;
• Entendimento do grupo acerca do conceito do futebol como prática esportiva e de lazer;
• Entendimento do grupo quanto aos conceitos de competição e cooperação e seus desdobramentos.

A partir dessa análise e observação foram traçadas estratégias baseadas na adequação do ambiente, materiais, regras e comunicação verbal (instrutor com alunos). Como por exemplo:
• Redução das dimensões do campo para facilitar a mobilidade dos alunos e treinar a capacidade cardio respiratória;
• Equiparação das equipes por meio da observação das diferentes habilidades motoras e capacidades físicas dos alunos;
• Utilização de material adequado, como por exemplo, bolas de borracha para que alunos ou alunas em condições de fragilidade não se ferissem ao, eventualmente, serem atingidos;
• Construção coletiva das regras dos diferentes jogos a partir da sua realização;
• Utilização de jogos adaptados para o desenvolvimento de habilidades individuais como chute ao gol, condução de bola e passe.
• Apresentação de imagens de diferentes esportes que traziam questões como violência, vibração,e cooperação como disparadores de discussões e reflexões acerca da participação individual e coletiva do esporte.

Em algumas aulas pudemos observar que, durante a prática do esporte, alguns participantes trazem consigo o imaginário e estereótipos construídos socialmente. Entendemos que a partir da convivência e de diferentes interações sociais por meio do esporte, podem surgir novas construções coletivas de imagens que tornam mais bela a experiência de envelhecer. Faz-se necessária a utilização de diferentes estratégias para que indivíduos e grupos criem oportunidade para o convívio por meio da prática da atividade física e esportiva, vivenciem novas e velhas experiências de maneira espontânea e prazerosa com vistas ao desenvolvimento pleno, individual e coletivo.

Ainda, nas aulas de esporte transparecem outros aspectos da convivência como a cooperação, o compartilhamento de valores, novas amizades, encontros organizados pelo grupo para além das instalações da unidade. Desta forma, torna-se importante o repensar constante da prática; a revisão das estratégias utilizadas no desenvolvimento das atividades para que possam, cumprir, também, sua função social, particularmente, seu papel significativo durante o envelhecimento; o compartilhamento de experiências entre profissionais e alunos e entre os próprios profissionais para perceber as diferentes questões - física, cultural, social – que
estão presentes nessas práticas.

A educação torna possível a transformação social, a mudança de paradigmas e a construção de novas narrativas, acerca do que possa ser a velhice ou de como o idoso se percebe e olha para o mundo.

(1) Graduado em Educação Física pela Universidade de Mogi das Cruzes-SP, Instrutor de Atividades Físicas no Sesc São Paulo Unidade Santo Amaro, Consultor e Assessor em Projetos de Educação, Esportes, Lazer e Cultura Inclusivos.

(2) Disponível em www.movebrasil.org.br/movimente-essa-ideia. Acesso em 11.setembro.2014

(3) LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf. Acesso em 11.setembro.2014