Sesc SP

Matérias da edição

Postado em

Bela Viola

 

Presente em diferentes regiões do país, instrumento representa a inventividade da música nacional


A viola é um aparato que reflete a criatividade musical do país. Nas mãos brasileiras, os nove tipos de afinação vindos de Portugal durante a colonização multiplicaram-se em pelo menos 20 maneiras de afinar o instrumento. Hoje, entre as variantes encontradas no Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil é possível observar diferentes ritmos, formas de tocar e modos de fabricação. 

Enquanto no Nordeste a viola possui harmonias requintadas que ecoam a época da exploração da cana-de-açúcar pela coroa portuguesa, o Sudeste revela ritmos mais intensos, reflexo do período em que bandeirantes e tropeiros tocavam durante os deslocamentos pela região. Para o violeiro Zeca Collares, entre as várias vertentes há em comum o fato de a viola ser uma espécie de bandeira da cultura do país: “A viola passa por diversas manifestações culturais brasileiras. Hoje, ela vai da folia do divino e da reza do terço ao rock. Ela é muito mais latente na alma do brasileiro do que qualquer outro instrumento”, diz.

Apesar de ter ficado conhecida como símbolo da música caipira, a viola começou como um instrumento urbano, tocado em cidades como Rio de Janeiro, Recife e Salvador. No Rio, até o século 19 era usada para acompanhar cantores. Só depois é que foi sendo gradualmente substituída pelo violão e começou a migrar para o ambiente rural.

Segundo o professor da Faculdade de Música da Universidade de São Paulo (USP) e autor de Cantando a Própria História – Música Caipira e Enraizamento (Edusp, 2013), Ivan Vilela, as mudanças pelas quais a viola passou estão relacionadas aos processos históricos. No Nordeste, além de conservar características portuguesas, ficou marcada pelos repentistas, influenciados pela presença árabe na região. No repente utiliza-se a chamada viola dinâmica, que possui amplificadores naturais feitos com cones de alumínio e que se harmoniza com a sonoridade aberta das vozes. “O que o árabe fazia com o alaúde ou com a guitarra latina, o nordestino faz com a viola”, explica o professor.

Já no Sudeste, os caminhos foram distintos. “Surgiram novas afinações, e ela incorporou uma enormidade de ritmos, como pagode caipira, o batuque caipira, o cateretê. Depois, na mão dos bandeirantes foi migrando para o Centro-Oeste, onde teve um contato muito intenso com as culturas do Paraguai e Argentina”, acrescenta Ivan. Para ele, essas diferentes afinações revelam a intimidade que a viola criou com o brasileiro.

Mesmo com presença tímida no Sul e no Norte do país, é associada à nossa identidade nacional, segundo o professor. “Em Portugal, ela está muito relegada às questões folclóricas. As nossas violas são mais tocáveis e modernas do que as portuguesas, que são muito rústicas”, compara. “O que o Brasil fez com a viola nem Portugal nem nenhum país de origem portuguesa fez.”

 

MAPA MUSICAL

EM SÉRIE DE SHOWS, PÚBLICO ENTRA EM CONTATO COM DIFERENTES TÉCNICAS DE GRANDES VIOLEIROS


Em junho, grandes representantes da viola de diversas regiões brasileiras subiram no palco do Sesc Vila Mariana. Apresentado entre os dias 12 e 18, o projeto Viola dos Cinco Cantos levou ao público uma série de shows com diferentes nuances desse importante instrumento da música popular brasileira.

Abrindo o projeto no dia 12, Daniel de Paula (foto) apresentou a viola de cocho, nascida no pantanal. No show, o músico cantou e executou suas obras por meio da sonoridade ímpar do instrumento pantaneiro. No dia 14, a dupla Floresta e Tião Ramalho foi acompanhada pelo grupo de dança Botas de Ouro, que convidou o público a participar de uma roda de catira ao ritmo da moda de viola, recortado e chula.

Adelmo Arcoverde, que se apresentou no dia 19, trouxe a viola saída dos repentes nordestinos, demonstrando a versatilidade do instrumento ao flertar com ritmos como o maracatu rural, o bumba meu boi, o fandango e o bluegrass. No dia 18, Zeca Collares apresentou um espetáculo musical e poético com as influências das folias de reis, calangos, cocos e marujadas do estado de Minas Gerais.



::