Postado em 09/08/2018
Playlist PAULERA! traz um apanhado de bandas punk, hardcore e metal onde o discurso político é acentuado
*Por Sandro Saraiva
O punk/hardcore e o heavy metal no Brasil são gêneros musicais que cresceram fora dos holofotes das grandes gravadoras. O cenário da música pesada no país desenvolveu-se praticamente na base da autogestão por meio de selos independentes, zines e festivais criados a partir do bom e velho “faça você mesmo”, sem apoio da mídia institucionalizada e caminhando à margem da indústria cultural estabelecida. Este contexto possibilitou uma liberdade criativa sem precedentes, embora ainda existisse resquícios de uma ditadura militar que perdurou no país durante 21 anos, entre 1964 e 1985. No início do movimento punk e durante os primeiros passos do heavy metal no país, a presença da censura ainda era constante.
O discurso politizado, ainda que não necessariamente panfletário, está presente no movimento punk dos primórdios e em muitas bandas de metal. Tanto o punk como o metal e seus diversos subgêneros, como o death, o thrash e, sobretudo, o grindcore, adotam um discurso contestador que aponta para as mazelas da sociedade. A música pesada, em certo sentido, é uma música periférica, assim como o samba, o rap e o funk. Tanto o Movimento Punk em São Paulo quanto o cenário de música extrema de Belo Horizonte, ambos dos anos 80, tinham em sua fileira uma maioria esmagadora de músicos e artistas de classe média-baixa. Equipamentos precários e falta de estrutura transformaram-se em linguagem.
Esta playlist traz um apanhado de faixas de bandas punk, hardcore e metal onde o discurso político é acentuado. Seja para falar de violência policial (braço armado da elite), da destruição do meio ambiente, dos excluídos em grandes centros urbanos como São Paulo, narcotráfico na América Latina, desemprego e racismo, além de canções de protesto e homenagem a militantes.
Ratamahatta, do Sepultura, música com forte influência da percussão baiana e cantos da tribo Kaiowas, faz parte de Roots, disco em que a banda flertou com elementos de música indígena. Grândola (Vila Morena), música do português Zeca Afonso, está presente numa versão dos Garotos Podres - que foi entoada pelos manifestantes durante a Revolução dos Cravos. Aos Fuzilados da CSN, também dos Garotos Podres, presta homenagem aos metalúrgicos da Companhia Siderúrgica Nacional que depois de promoverem uma greve histórica em 1988, durante o Governo José Sarney, período de redemocratização do Brasil, foram reprimidos e mortos pelo exército, causando comoção e repercussão internacional. Já a banda Agrotóxico presta sua homenagem aos militantes anarquistas.
Muitas das músicas listadas foram compostas há mais de 30 anos e ainda hoje permanecem atuais. Reflexo de um Brasil que sofreu um golpe em sua jovem e combalida democracia e andou pra trás.
Sigamos resistindo, camaradas. Deixe o peso subir pelos fios do headphone e sinta a porrada nos tímpanos.
*Sandro Saraiva é programador de música do Sesc Belenzinho.
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