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postado em 26/05/2021

O que que é isso afinal?

Jogos em rede. Foto: Florian Olivo | unsplash
Jogos em rede. Foto: Florian Olivo | unsplash

      


Um universo que mistura arte, tecnologia e diversão, mas também vício e violência, é explorado nas páginas de Games: cultura, arte e joystick, novo e-book da Coleção Deslocamentos

Por Tiago Ferro*

 

Este volume trata de um dos fenômenos mais importantes da indústria do entretenimento hoje: o videogame. Um objeto cultural com características bastante peculiares, e de desenvolvimento recente, o que o torna de difícil apreensão.

João Varella abre o livro colocando perguntas decisivas que indicam o caminho a ser trilhado, e perguntas que certamente nos deixam sem muitas certezas: “Afinal, videogame pode ser entendido como arte? É um esporte? É melhor ou pior que ler um livro? Faz mal para a saúde? É perda de tempo?”.

Puxar o fio da meada da história é a estratégia do autor para nos situar em um campo que toca e problematiza áreas como arte, tecnologia, indústria, vício, violência e, principalmente, diversão. Vizinho malvisto da literatura e do cinema, é justamente nos games que produção e consumo na sociedade contemporânea se encontram de forma inédita e passível de ampliar nosso entendimento do processo social contemporâneo. Ciência e indústria, arte e entretenimento, consumo digital, interatividade. Termos de difícil articulação, mas certamente condensados no universo complexo dos games.

Aqui encontramos um roteiro cronológico do desenvolvimento do videogame com seus tropeços, figuras carismáticas (e excêntricas), ambientes de trabalho peculiares, cifras astronômicas e personagens que certamente já estão cristalizados no imaginário cultural do século XXI.

 


Evolução: do Atari, responsável por popularizar os videogames nos anos 1980, aos atuais jogos de realidade virtual. Foto: reprodução / pxhere

 

Varella opera o jogo difícil e preciso de afastamento e aproximação do objeto em questão com a desenvoltura de quem maneja o aparato crítico ao mesmo tempo que tem familiaridade com a prática dos jogos. Aqui um ganho muito especial do livro: unir as pontas de dois mundos que via de regra não se tocam: o daqueles que jogam com o dos que escrevem sobre jogos e jogadores. Ora, como seria possível um crítico literário não ler literatura? Partindo dessa questão algo estapafúrdia, apresentamos ao leitor este breve ensaio que caminha em passo firme, e com graça, pela evolução dos games, desde um ponto na primeira metade do século XX até hoje.

Entre tiros, emboscadas, saltos, contratos milionários, competição acirrada, atletas e muita interatividade, Varella não tem medo de colocar o assunto em termos ambiciosos: “Se no começo do século XX os modernistas acreditavam que o cinema era a arte completa pela soma de todas as linguagens, hoje é possível dizer que o videogame deu um passo além”. 

 


Ícone: Mario Bros, sucesso da Nintendo nos anos 1990. Foto: reprodução / pxhere

 

Mas se durante a leitura a todo instante nossa memória é acionada graciosamente por personagens como o simpático Mario Bros, e as cifras confirmam a relevância dessa indústria, relações com a sociedade em termos nada divertidos também aparecem no livro: vício e violência. O massacre de Columbine e mecanismos de resultado imediato que aproximam o videogame dos jogos de azar, fomentando o vício, são assuntos tratados pelo autor. Questões espinhosas contextualizadas com episódios da própria história dos games e também de outras mídias.

Games: cultura, arte e joystick é um ensaio necessário para quem quer pensar esse admirável mundo em transformação 24 horas por dia, 7 dias por semana. O nosso mundo. Seja você um jogador ou não, ou talvez até um jogador aposentado, aperte o Play e boa leitura!

 

*Tiago Ferro é editor, escritor e organizador da Coleção Deslocamentos, série que reúne os títulos HQ: uma pequena história dos quadrinhos para uso das novas gerações e Mídias digitais: cultura, posts e redes. Este texto foi originalmente publicado no prefácio do livro.