Sesc SP

postado em 06/11/2017

Outubro Vermelho

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1917: o ano que abalou o mundo, organizado por Ivana Jinkings e Kim Doria, reúne estudos fundamentais sobre a Revolução Soviética, a maior tentativa de transformação social já empreendida na história da humanidade

Por Osvaldo Coggiola*

 

Cem anos depois, a Revolução de Outubro continua a abalar o mundo. As polêmicas que suscitou, longe de enterradas, reaparecem em toda a sua força. Na verdade, com mais força ainda.  A crise econômica do capital que enfrentamos hoje, somada às guerras e ameaças bélicas em sequência interminável, à destruição ambiental e à angústia diante do futuro face ao desemprego e à destruição das conquistas sociais de séculos, repõe a questão de abrir uma nova via histórica para a humanidade trabalhadora. Sobre um patamar social inédito: a generalização da condição proletária – isto é, assalariada em qualquer uma de suas formas – em todos os cantos do planeta, atingindo bilhões de pessoas, e o aguçamento das formas históricas de opressão e alienação (nacional, racial, sexual, geracional) postas como nunca ao serviço da exploração econômica e da opressão social pelo capital.   

Há um século, a Revolução Russa abria uma nova era histórica. Se a Revolução Francesa proclamara a universalidade dos direitos humanos, inaugurando a era da democracia e das nações, o Outubro Vermelho de 1917 proclamou a universalidade da luta pela emancipação do trabalho como condição primeira para a erradicação de todas as mazelas que a democracia política e a independência nacional não tinham destruído – ao contrário, a começar pela escravidão pura e simples, posta a serviço da escravidão assalariada. O destino e as contradições dessa revolução foram o ponto nodal de todos os grandes embates políticos e bélicos do século XX. A dissolução da URSS, em 1991, e a consequente restauração do capital nos países e regiões onde fora expropriado foram apressadamente proclamadas como o início de outra era, em que a dominação tranquila e inconteste do capital se projetava para a eternidade.

Pouco durou essa ilusão. Em 1997, a partir da Ásia, uma crise econômica abalou os alicerces da ordem mundial. O reingresso de regiões enormes e de bilhões de seres humanos ao mercado capitalista aguçou todas as suas contradições, a começar pela hiperprodução de mercadorias e a hiperacumulação de capitais, levando ao terremoto que assolou (e ainda assola) o planeta em 2008. A Revolução de Outubro saiu do museu ao qual fora precipitadamente confinada, junto com Karl Marx, para voltar às ruas de um mundo abalado. Suas interpretações históricas, parciais ou de conjunto voltam a ganhar atualidade política, embora nem por isso deixem de ser “históricas”, no sentido nobre do termo. Mas seu debate mudou de forma e de conteúdo. Hoje, mitificação ou deturpação aparecem, muito mais claramente do que no passado, como o obstáculo a ser urgentemente removido para que possamos dialogar com a história viva dos homens e mulheres que, há cem anos, tocaram o céu e também o inferno com as próprias mãos. Este centenário, longe da celebração ritual ou da condenação ignorante, deveria ser um marco desse esforço, ao qual a Boitempo e a Edições Sesc se integram com este volume de textos.

 


*Osvaldo Coggiola é professor titular de história contemporânea da Universidade de São Paulo. Nascido na Argentina, é autor, entre outros livros, de Introdução à teoria econômica marxista. Este texto foi originalmente publicado na orelha do livro.

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