Sesc SP

postado em 13/09/2016

Curado - Hurtmold & Paulo Santos

destaque hurtmold

"Curado" une a sonoridade moderna e urbana do Hurtmold, sexteto paulistano com as experiências de Paulo Santos, mineiro, ex-Uakti. A turnê de lançamento passou pelo Sesc Ribeirão Preto, dia 14/9; no Sesc Sorocaba, 15/9; no Sesc Belenzinho, dia 16/9 e, por fim, no Sesc Jundiaí, dia 17/9. Conheça o disco logo abaixo!

 

O cruzamento Minas-São Paulo, materializado em Curado, sétimo álbum do sexteto paulistano Hurtmold, com a participação do mineiro Paulo Santos, ex-Uakti, pode ser encarado como ampliação desta relação que é intrínseca à história do grupo.

Sobre o disco, você vai ler e ouvir em outros lugares. O que estamos propondo aqui, é uma leitura de alguns eventos da trajetória do grupo que culminam na obra. Quase uma desculpa para se falar sobre lugares usualmente esquecidos quando se recorta o tempo com aquela ênfase no presente: a música não é feita só de intérpretes/compositores e dos lugares onde esses atores circulam. O Hurtmold, portanto, se liga à Belo Horizonte bem antes do encontro com Paulo Santos.

Desde o lançamento do cassete 3am: a fonte secou, em 1999, o sexteto cultiva laços com a Submarine Records, selo originariamente de BH, que lançou todos os discos do grupo até este último, Curado, agora com parceria do Selo Sesc, uma vez que se trata também de um disco de parceria. A Submarine Records, por sua vez, surge da vontade de Frederico Finelli estar mais próximo dos selos e bandas nacionais na virada dos 2000 - muita gente tocando, produzindo, e muita correria.

"A ideia sempre foi colocar na rua lançamentos de bandas do cenário independente musical que eu gostasse, sem se preocupar e nem saber exatamente sobre mercado e essas coisas. Na época começou com uma coletânea com bandas nacionais e algumas internacionais dentro do universo que circulávamos e ouvíamos (punk rock, hardcore, post punk, lo-fi...). Daí, na virada de 98/99, conheci o Hurtmold, que estava divulgando uma fitinha cassete e a gente se conhecia (devido a relações de amigos, shows, fanzines etc) e iniciamos um corre, e nessas estamos juntos até hoje." (retirado de entrevista ao Matéria - perca um tempo neste blog!)

Finelli foi quem apresentou o projeto de Curado ao Selo Sesc e fez toda a correria para levantar o projeto. Antes de continuarmos com São Paulo-Minas-Hurtmold-Submarine, uma pausa: quantos selos de música independente você conhece? Quem vive um pouco mais a música, caça sons como quem caça a janta pode enumerar uma penca de selos e, a maioria, provavelmente, vai estar inscrita numa relação Dischord Records/Ian Mackaye, que fez a cena do hardcore de Washington florescer pr'além das fronteiras, fosse com o som das suas bandas (Minor Threat, Fugazi) fosse com a atuação do selo em questão. Vamos segurar esse pensamento também - se quiser, veja o documentário sobre esta cena logo abaixo.
 

 

No Brasil, a coisa antecede o que aconteceria em Washington em alguns anos - e, sistematicamente, acontece trazendo novidades que mudariam a forma como artistas e ouvintes fruiriam da música, de determinado estilo ou ainda, alterando possibilidades na indústria musical.

De '75, quando Sebastião Rodrigues Maia, o Tim Maia, cria a Seroma para lançar Tim Maia Racional - quem em sã consciência lançaria um disco desses àquela época? - passando por 1977, quando Antônio Adolfo gravou, prensou e fez, manualmente, a arte da capa de Feito em Casa com carimbos e envelopes, lançando o disco pelo seu selo, Artezanal, até 1990, ano em que a Zimbabwe Records lança Holocausto Urbano, primeiro disco dos Racionais MC's, sempre houve um espaço de disputa quando o assunto é música nova que foge à moda.

"A maneira como a música é introduzida a nós, e a forma como ela é apresentada social e economicamente, determinam se ela se integrará (ou não) às nossas vidas e até mesmo o tipo de música que poderá vir a ser criada no futuro. O capitalismo tende a criar consumidores passivos, e em vários sentidos, essa tendência é contraproducente. Afinal, nossas inovações e criações são responsáveis por manter ativos vários mercados aparentemente não relacionados." - David Byrne, em seu livro Como Funciona a Música.

Há em Curado predicados musicais muito bem assinalados pelo texto no encarte, assinado pelo jornalista Edmundo Clairefont - você pode ler o texto na íntegra abaixo, além de conferir uma prévia da arte do disco.



Ainda que a música instrumental no Brasil venha de uma tradição de músicos virtuosos - de Pixinguinha a Hermeto Paschoal, passando por Egberto Gismonti e o próprio Uakti - ainda não há um espaço claramente constituído de circulação desse tipo de música em âmbito nacional, ultrapassando os limites dos guetos musicais. Está tudo sendo construído na marra, com o carro em movimento, na correria e é simbólico poder trocar "música instrumental" deste parágrafo por qualquer outro tipo de arte que não gere milhões de cliques - mas que conecta milhares de pequenos organismos artísticos - e ainda obter sentido.

O som de Hurtmold e Paulo Santos em Curado bebe desse movimento e, em tempos olímpicos, onde a gambiarra foi exaltada para o mundo todo, a correria também é muito nossa, para o bem e para o mal, muito brazuca. Ainda que se alimentem de lugares bem diferentes, ambos atores se conectam demais a esse tipo de som feito à margem, de pensamento sintonizado num lugar não aparente que, uma vez colocado em circulação, conecta centros outros que não são visíveis à primeira escuta, à primeira procura. Escute o disco e tire suas próprias conclusões - há música ali pr'além das fronteiras das cenas, é o som da correria e você deveria ir atrás de quem está nessa: vai te levar às pessoas que vivem pela música.

 

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