Sesc SP

Música Instrumental postado em 21/07/2017

Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz e MPB4: vencedores do Prêmio da Música Brasileira!

capa premiados

O Selo Sesc marcou presença no Prêmio da Música Brasileira, realizado no último dia 19. Dois projetos muito queridos na casa foram laureados em 4 categorias: Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz levaram, na categoria instrumental, os prêmios de melhor álbum e melhor grupo - Letieres ainda levou pra casa o prêmio de Melhor Arranjador pelo disco a "Saga da Travessia". Na categoria MPB, o prêmio de Melhor Álbum é do MPB4 pelo disco, "O Sonho, A Vida, A Roda Viva".

 

MPB4 - O Sonho, A vida, A Roda Viva

Ao completar 50 anos de estrada, um disco de inéditas lançado pelo Selo Sesc. Em "O sonho, a vida, a roda-viva!", o conjunto agora formado por Dalmo Medeiros e Paulo Malaguti, nos lugares de Ruy Faria e Magro Waghabi - morto em 2012 - investe numa temática mais lírica, entre o maravilhoso e misterioso, como na canção "Milagres" que abre o disco.

Não se engane porém, ao pensar que escolher este caminho impede a arte do quarteto de florescer em diferentes direções. "O sonho..." é uma peça de ourivesaria, no qual cada canção é esculpida na melodia das 4 vozes - e de parcerias do quilate de João Bosco, Paulo César Pinheiro, a dupla Kleiton e Kledir, Vitor Ramil, Guinga e Mario Adnet.

"O disco foi tomando forma durante um ano de trabalho em ensaios semanais. Convidamos Gilson Peranzzetta como arranjador. Miltinho e Paulo Malagutti estão nos arranjos vocais. Nós o dedicamos para Magro porque queremos que a música do MPB4 esteja sempre ao seu lado", comenta Aquiles. Por mais que seja um disco de comemoração e o grupo tenha dado uma guinada rumo ao amor, as cutucadas estão ali, principalmente em canções como a literária "Brasiléia" e "Ateu é tu" - ouça abaixo.

 

 

 

Letieres Leite - A Saga da Travessia

Partindo do universo percussivo baiano, termo que circunda a música de matriz africana na Bahia e dá nome ao método desenvolvido por Letieres Leite para transmitir os desenhos rítmicos e claves da música africana para instrumentos como sax, flauta, baixo e bateria, relacionando a tradição oral e a tradição da escrita musical europeia - uma outra forma de aprender/ensinar música, portanto -, Leite se utiliza de um verdadeiro exército de músicos para por suas ideias, há muito elaboradas, em prática. "O conceito estético da Rumpilezz surgiu bem antes deste trabalho ser lançado, ainda na década de 1980 quando comecei a compor com estes elementos. Todo o repertório é autoral, composto por mim, exclusivamente para este formato tradicional do jazz".

Ao ouvir o trabalho da Orkestra Rumpilezz entendendo que a estética do projeto incorpora o conhecimento ancestral ao formato de big band jazzística - "Rumpilezz" é a soma dos tambores do candomblé Rum, Rumpi e Lê ao jazz -, sem cordas, com a percussão na "sala de estar" e os sopros ao fundo, percebemos não só um novo enunciado, mas uma nova maneira de enunciar: a reafirmação de uma maneira outra de ver, se portar e de falar sobre o mundo. Aproximar Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, educador e inventor da capoeira regional (essa que conhecemos, com música e ginga) de Ogum, orixá guerreiro, na música que encerra o disco, parece uma pista sobre o rico manancial de onde bebe a criatividade de Letieres e toda a Rumpilezz - e como transformam tudo isso em música!

Ouça o berimbau criando texturas, a tuba fazendo as vezes de baixo, gerando o mesmo pulso, mas dando outra cara às sessões mais próximas do jazz tradicional. A atabaqueria! Uma "bateria" cujos tambores foram substituídos pelos atabaques do candomblé. Separe as texturas dessa big band, num exercício, e perceba como tudo faz sentido: os metais dando as cores dramáticas da travessia, os pratos fazendo as vagas do mar, os solos descolando uma textura-personagem, uma visão solitária que conversa com todo o contexto e nos coloca em contato com o desespero, a tristeza e a possibilidade de uma resignação dos vencidos que não se confirma nunca: transforma-se em catarse no som da Orkestra. Escurte e confime:

 

 

Tendo todo este pano de fundo, observamos melhor a fala de Letieres quando diz que a música na Bahia é um tronco, representado pelo candomblé, e os galhos são os ajuntamentos urbanos como o Ilê Aiyê, a Timbalada, o Olodum, os afoxés e, adentrando os palcos, a própria Rumpilezz. Não é possível ouvir o que está n'A Saga da Travessia e ficar imune aos signos e símbolos do som, aos significados que a amálgama de Letieres nos dá: não é preciso ir à Bahia para sentir a potência deste estudo, desta prática. É um disco que transporta o ouvinte para outros planos de percepção acerca do seu próprio cotidiano, daquilo que ali escuta e desfruta: o disco conta uma outra história da música brasileira.

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