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50 anos de samba-jazz

Sesc Campo Limpo apresenta SAMBA-JAZZ + 50, com grandes nomes do gênero brasileiro. Laércio de Freitas, João Parahyba, Amilton Godoy, Swing Samba Combo, Jorginho Neto, Marcos Paiva, Samba-Jazz: a Origem e Projeto Coisa Fina são alguns dos convidados.

Naquela época os jovens se divertiam em festas de baile, quem quisesse mandar uma mensagem tinha que enviar uma carta, ao invés de serem assistidas, as novelas eram ouvidas pela rádio, e a ditadura chegava ao país.
Este era o cenário do Brasil quando alguns artistas rompiam com a tradição da música instrumental, redesenhando fronteiras musicais e construindo territórios sonoros marcados pela efemeridade da improvisação. Assim surgia o samba-jazz.

“[...] Nas boates e inferninhos instalados nas imediações da Praça Roosevelt e Vila Buarque, assistir a jam sessions dependia apenas de alguma paciência dos frequentadores. Madrugada adentro, quando só os notívagos ortodoxos permaneciam grudados às suas mesas cativas, começava a festa: os músicos da casa e os visitantes abriam as canjas, por vezes com a presença de músicos americanos em excursão pela América do Sul. [...] De volta aos Estados Unidos, flechados pelos encantos da música brasileira, muitos deles gravaram LPs contendo faixas de samba e bossa nova. Enquanto isso os brasileiros, em São Paulo e no Rio, divertiam-se incorporando elementos do jazz ao samba e à bossa. Estava definitivamente aberta uma via de duas mãos. [...]”

Este trecho do texto do jornalista, produtor e músico, Fernando Lichti Barros, marca o momento em que se começava a experimentar a mistura de samba, bossa nova e jazz. O texto é resultado de um mergulho neste universo realizado a partir de depoimentos de ícones que marcaram época, e faz parte da pesquisa para seu livro Do Calypso ao Cha-Cha-Chá – Músicos em São Paulo na Década de 60, publicado pela editora Nova Ilusão em 2012.

Bebendo desta fonte, o Sesc Campo Limpo criou o projeto Samba-jazz +50 , que homenageia os 50 anos do gênero, reunindo artistas que tiveram grande representatividade em sua criação e perpetuação. Serão shows e bate-papos que tem convidados como: Laércio de Freitas, João Parahyba, Amilton Godoy, Swing Samba Combo, Jorginho Neto, Marcos Paiva, Gabriel, Zinho, Luiz Mello, Hector Costita, Carlos Alberto Alcântara e Projeto Coisa Fina.

Recordar é eternizar

Atualmente a experimentação de diversas misturas de ritmos pode ser explorada com mais facilidade, mas na década de 60 não bastava ter criatividade e talento. “Ao mesmo tempo em que existia na música essa vontade de inovar, vontade de liberdade, nós caímos numa ditadura. Então nesse tempo aconteceram muitas coisas. Tiveram grupos que foram intimados a depor no exército, acusados de ter tocado o hino nacional em ritmo de Twister. E enquanto, institucionalmente, o país estava patinando para trás, os músicos estavam mandando a bola pra frente”, comenta o Fernando Barros.

Em uma época em que o computador pesava em média 200 kg e aconteciam as primeiras evoluções na transmissão de dados, trocar ideias exigia um esforço maior. “Hoje existe faculdade de música popular, antigamente não. O cara tinha que ir tocar na banda da cidade, no coreto, ou ia ao baile aprender com os amigos. Porque a comunicação era muito difícil”, continua o jornalista. “Teve uma ebulição musical, inclusive por causa da tecnologia muito modesta que existia na época, então a música era improviso. Não tinha recursos como hoje que a gente aperta o play e se quiser faz um baile inteiro. Antigamente não tinha isso, então os músicos estavam sempre ali tocando de verdade”, completa.

Foi nesta mesma década que, no alto dos seus 18 anos, o percussionista, arranjador e compositor, João Parahyba, conheceu o gênero que mudaria sua carreira, ao tornar-se integrante do Zimbo Trio. “Estava começando a minha carreira de músico e eles foram grandes professores e muito abertos àqueles que estavam começando. Até hoje eles são assim”, comenta o músico, que mantém o contato com os músicos do grupo e os considera parte de sua família. Atualmente, com 65 anos, João realiza shows que fortalecem o samba-jazz e gravou o CD "O Samba no Balanço do Jazz", lançado pelo Selo Sesc em 2011. 

Paralelamente, o pianista, maestro e compositor, Laércio de Freitas, conhecia o saxofonista, arranjador e também compositor, J. T. Meirelles. Os músicos, que tinham em comum a vontade de quebrar as amarras da música instrumental, tinham longas conversas.  “Nós procurávamos abrir janelas no tempo pra ficar conversando, e nisso havia um entendimento. Nós concordávamos com muitas coisas, muitas coisas que pensávamos. E isso fazia com que a nossa relação se tornasse uma coisa mais amigável, não profissional, eram duas pessoas conversando sobre algo de interesse de ambos”, lembra.

Laércio não tem mais seu amigo para dividir o palco, mas recordar os momentos que tiveram juntos o alegra. “Ele compunha temas de samba para samba, mas com sotaques jazzísticos. Ficou muito interessante e eu gostei disso. Conversei com ele a respeito e muita coisa que ele me dizia batia com coisas que eu já tinha na cabeça sobre Jazz, mas sem deixar o samba de lado”, conta o pianista.

Estes foram alguns dos importantes encontros que fizeram o casamento entre a bossa nova, o samba e o jazz. Aconteceram muitos outros, e agora, para revigorar esta produção musical, acontecerão novos encontros no palco do Sesc Campo Limpo.

O samba-jazz pede passagem

Talvez você pense que não gosta muito de música instrumental, mas certamente existe alguma composição que você gosta e que tem o tempero do samba-jazz. Um exemplo é o sucesso "Mas Que Nada", de Jorge Ben Jor, que teve arranjos criados por J. T. Meirelles. Laércio promete mostrar esta contemporaneidade em sua apresentação. “Eu vou mostrar um exemplo disso no show. Sabe que meu pai dizia ‘mate a cobra e mostre o pau e a cobra’”, afirma o pianista.

Com sucessos como este podemos perceber que o gênero possui grande representatividade na música brasileira. “É a evolução do samba brasileiro em contato com a música internacional, principalmente a influência do jazz americano no Brasil”, resume João Parahyba.

Para Fernando Barros existe uma retomada do gênero com o trabalho de músicos da nova geração que se encantaram pelo samba-jazz. “Inclusive nesse projeto do Sesc Campo Limpo está bem evidente pela programação. O Jorginho Neto é um jovem trombonista excepcional, um grande músico. Eu acho que é um gênero que está sendo reanimado. É ótimo isso porque a música instrumental tem todo o direito de ter seu espaço garantido na indústria cultural.”

Jorginho Neto conhecia a música pelo seu lado erudito, quando tocava na banda marcial da igreja. Ao conhecer Raul de Souza descobriu que existia um lado mais popular, leve e jovem, e a partir daí aprofundou-se cada vez mais. O músico ainda foi além e trouxe o hip hop para suas composições. O rapper KL Jay traz suas mixagens para o samba-jazz no show de Jorginho, o que representa para ele um convite aos jovens à experimentação de uma nova sonoridade. “Eu tive essa ideia de misturar, porque a música popular hoje não é muito divulgada. Não chega muito aos jovens da periferia, então eu quis fazer essa mistura porque o KL Jay tem essa porta, essa abertura.”

Para os artistas, participar do Samba-jazz +50 será o momento de reencontrar velhos amigos e grandes ídolos. Para que, juntos, revivam momentos e criem novas histórias. “Eu acho que esse projeto dá uma oxigenada na música instrumental, acho que é de uma importância fundamental.” conclui Fernando.

Jorginho, que representa a nova geração, relembra que muitos músicos saíram do Brasil por encontrarem dificuldades em desenvolver seus trabalhos. Em projetos com este, ele vê uma oportunidade de evitar este quadro. “É sempre bom relembrar, e esse projeto tem esse propósito, eu acredito nisso”, relata o trombonista.

Mais do que um momento de entretenimento, Laércio comenta que esta é a chance de contribuir com o acesso a uma linguagem que pode ser perpetuada pelo conhecimento. “Eu gostaria que as pessoas fossem ouvir, pra compreender o porquê. Informar para poder formar, isso é pedagógico.”

E João Parahyba acredita que as pessoas devem se apropriar desta oportunidade. “Toda a informação musical que o brasileiro recebe é importante pra ele, é a história dele, faz parte da música dele. E é cultura, isso é uma coisa que fica na raiz do nosso DNA, isso é muito importante ter sempre.”

o que: Samba-jazz +50
quando:

De 15/10 a 1/11/2015. diversos horários.

onde:

Sesc Campo Limpo | Rua Nossa Senhora do Bom Conselho, 120

ingressos:

Grátis.