Saias | Bienal Sesc de Dança

02/09/2025

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Foto: Vitor Damiani

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Entrevista com Renata de Oliveira | Idealização, Direção cenográfica e Dança

Ao trabalhar com as danças populares brasileiras sob a ótica do feminino, que outros aspectos e narrativas despontam?
O espetáculo mostra que a figura da mulher dentro dessas manifestações traz consigo uma grande importância para a manutenção das culturas afrodiaspóricas a partir das danças que são apresentadas. Mães, cozinheiras, bordadeiras, trabalhadoras rurais, sambadeiras, artistas e brincantes carregam consigo a manutenção desses saberes quando dançam, cantam, tocam, trabalham, cuidam dos seus. Saias traz a reflexão de que toda mulher carrega em si aspectos divinos e profanos, em que o limiar entre um e outro é muito sutil. O espetáculo também mostra o quanto ser mulher preta sempre exigiu de nós força, persistência, resiliência e os pés fincados na terra junto à nossa ancestralidade para não sucumbir às injustiças, lutas e opressões. Com dança, música, poesia e arte, é possível não sucumbir.

Um corpo que é festa, não condicionado pelas prisões estéticas que nos são impostas em um tempo que cada vez mais nos limita em nossa própria identidade

Saias. Foto de Vitor Damiani
Foto: Vitor Damiani

Como a saia articula a desconstrução de padrões homogeneizantes?
Em quase todas as manifestações da cultura afro-brasileira, as saias se fazem presentes como elemento essencial. Elas possibilitam liberdade aos corpos, que giram e constroem movimentos espontâneos. Para a dança dos orixás, jongo, coco alagoano, samba de roda e ciranda, elas compõem e dão sentido às movimentações, atuando para além da vestimenta. No espetáculo, as saias e os elementos de cabeça são destaque. O corpo dá vida às saias, sendo ponte para que conhecimentos e vivências possam girar e ganhar terreno. A corporeidade apresentada revela corpos livres dos padrões que tentam homogeneizar as diferenças: um corpo que gira, que se alegra, que se movimenta com mais liberdade e consciência de si, que brinca e compartilha com o outro. Um corpo que é festa, não condicionado pelas prisões estéticas que nos são impostas em um tempo que cada vez mais nos limita em nossa própria identidade, vivências, trajetórias e histórias. A saia fazendo girar o que realmente somos.

Como você enxerga o papel da dança na sociedade atual e o que ela pode mobilizar ou revelar sobre nossos tempos?
Para as danças afro-brasileiras, o indivíduo é um ser único, constituído a partir de sua ancestralidade, do seu corpo e de suas relações. Oralidade, circularidade, corporeidade e coletividade compõem a cosmovisão afrodiaspórica. É nas danças, nas rodas, nos giros das saias, nos cantos conversando com os tambores, nos terreiros e nos territórios que se firma a relação intrínseca entre passado-presente-futuro, e onde o indivíduo forma e fortalece sua identidade. Acredito que as danças afro-brasileiras lançam uma luz e um convite para “girarmos no sentido contrário do relógio”, questionando e reinventando nossas vidas imersas na urgência e na falta de afetos. Onde os corpos e as relações se ressignifiquem e tenham a possibilidade de fazer a viagem de retorno para a casa – baseando-me na filosofia do Sankofa (olhar para trás e pegar de volta o que esqueceu), apoiados na ancestralidade e na corporeidade para construir outros tempos em que a dança seja um caminho potente, sensível e consciente.

Saias. Foto de Vitor Damiani
Foto: Vitor Damiani

Sinopse

Saias

A beleza do mundo feminino dentro das manifestações culturais brasileiras guia a construção do espetáculo. Idealizado por Renata de Oliveira e Nil Sena, o trabalho parte de um mergulho no universo das danças afro-brasileiras, sobretudo maracatu, jongo, simbologia dos orixás, coco de alagoas, ijexá, lundu colonial, samba de roda e ciranda. Em cada cena-dança, as artistas trazem suas experiências corporais e afetivas por meio de diversas linguagens: poemas autorais, percussão e cantos se articulam ao movimento de seus corpos. Neles, a saia é um elemento fundamental, que, além de representar a força da mulher, confere leveza e liberdade aos seus rodopios e passos. Fazendo girar cultura, arte e ancestralidade, a obra evoca o poder do feminino e a espontaneidade das danças populares.


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Interview with Renata de Oliveira | Creator, Choreographic Director and Dancer

When working with Brazilian folk dances from a female perspective, what other aspects and narratives emerge?
The work shows that women play a significant role in maintaining Afro-diasporic cultures through the dances that are performed. Mothers, cooks, embroiderers, rural workers, samba dancers, artists, and revelers carry with them the preservation of this knowledge when they dance, sing, play, work, and care for their people. Skirts reflects on how every woman carries divine and profane aspects within herself, where the line between one and the other is very subtle. It also shows how being a Black woman has always required strength, persistence, resilience, and deep roots in our ancestry so as not to succumb to injustice, struggle, and oppression. Through dance, music, poetry, and art, it is possible not to succumb.

A body that is a celebration, unconditioned by the aesthetic constraints imposed on us at a time that is increasingly restraining our own identity

Saias. Foto de Vitor Damiani
Foto: Vitor Damiani

How does the skirt challenge homogenizing norms?
Skirts are there as an essential element in almost every expression of Afro-Brazilian culture. They allow bodies to move freely as they spin and create spontaneous movements. More than pieces of clothing, they make up and give meaning to the movements in the dance of the orixás, jongo, coco alagoano, samba de roda, and ciranda. The skirts and headdresses are the highlight of the show. The body brings the skirt to life, acting as a bridge for knowledge and experiences to spin and become grounded. The physicality here reveals bodies that are free from the norms that aim to homogenize differences: a body that spins, rejoices, moves more freely and with more self-awareness, plays, and shares with others. A body that is a celebration, unconditioned by the aesthetic constraints imposed on us at a time that is increasingly restraining our own identity, experiences, pathways, and stories. The skirt spins what we really are.

How do you see the role of dance in today’s society and what can it mobilize or reveal about our times?
In Afro-Brazilian dances, the individual is a unique being, shaped by their ancestry, their body, and their relationships. Orality, circularity, corporeality, and collectivity make up the Afro-diasporic worldview. It is through the dances, the rodas, in the twirling of the skirts, in the chants conversing with the drums, in the terreiros, on the ground that an intrinsic relationship between past, present, and future is established, and where individuals form and strengthen their identity. I believe that Afro-Brazilian dances shed light and invite us to “turn counterclockwise,” questioning and reinventing our lives immersed in urgency and lack of affection. Where bodies and relationships gain new meaning and can make the journey back home — based on the philosophy of Sankofa (looking back and taking back what you forgot), supported by ancestry and corporeality to build other times in which dance is a powerful, sensitive, and conscious path.

Synopsis

Skirts

The beauty of the female world within Brazilian cultural expressions guides the way the show is built. Conceived by Renata de Oliveira and Nil Sena, the piece dives into the universe of Afro-Brazilian dances, especially maracatu, jongo, the symbolism of the orixás, coco alagoano, ijexá, lundu, samba de roda, and ciranda. In each dance-scene, the performers use different languages to bring their physical and emotional experiences to life: original poems, percussion, and songs are articulated through their body movements. The skirts on their bodies are a fundamental element here, representing the power of women while also offering lightness and freedom to twirls and steps. Spinning culture, art, and ancestry, the show evokes the power of the feminine and the spontaneity of folk dances.

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