Entrevista com Anete Abramowicz

27/08/2012

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Centro de Pesquisa e Formação: Em sua trajetória acadêmica, as
pesquisas que vem desenvolvendo buscam contribuir para a configuração
do campo dos estudos da infância no Brasil. Poderia traçar um panorama
das mudanças e avanços observados ao longo dos últimos anos, considerando
o cenário na época da publicação de seu livro Estudos da infância
no Brasil e o panorama atual?

Anete Abramowicz: Os avanços foram inúmeros, como todo campo científico, mas
ainda permanecem pontos estruturais que definem e compõem esse território.
Como o livro indica, partimos de uma espécie de “ponto zero” sobre
a emergência desse campo na atmosfera científica brasileira e ocidental,
que foi o trabalho de Florestan Fernandes2 e de Virginia Leone Bicudo3.
Florestan constituiu, na época, a sociologia brasileira, e Virginia podemos
dizer que compunha o campo das relações étnico-raciais. A partir daí temos
uma primeira onda – tomando a ideia de “onda” do movimento feminista
– nas décadas de 1970 e 1980, quando o tema da infância emerge em
diversos contextos e nas discussões sociais. Podemos resumir que, nesse
período, as temáticas referiam-se principalmente às questões derivadas
da desigualdade social, marginalidade cultural, pobreza, trabalho infantil,
indicadores de desempenho escolar, entre outras. Podemos chamar de
segunda onda a década de 1990, quando ocorre uma eclosão e emergência
de trabalhos vinculados às relações étnico-raciais e à sociologia da infância,
como avaliação, qualidade, política pública e currículo, por exemplo.
Contemporaneamente, podemos falar de uma quarta onda, na qual alguns
temas seguem com vigor, como a infância negra e indígena. Há também
uma ênfase em estudos sobre bebês, com uma tendência crescente de
que essa área tenha um campo científico próprio, denominado “Estudos
de Bebês”. Além disso, surgem estudos do que tem sido chamado de “ciberinfância”,
ou seja, a relação das crianças com as mídias sociais e com
os dispositivos de controle e de subjetivação, como a internet, os celulares,
tablets etc. A relação entre crianças e objetos, que antes parecia separada,
hoje se apresenta de maneira distinta, especialmente no que diz respeito aos computadores e à internet. Somos agora “pessoas-objetos”, acopladas
às máquinas — cibermáquinas, como sujeitos imersos na ciberinfância.
Como sairemos disso se passamos a compor nossos corpos com a internet?
Ainda há continuidade de estudos sobre Educação infantil, com ênfase em
temas como alfabetização, a importância do brincar o abandono das creches
pelo Estado, o que tem gerado o fenômeno da “filantropização” das
creches, ou seja, a transferência das crianças de 0 a 2 anos e 11 meses
para convênios com as prefeituras, acompanhada de um “apostilamento”
progressivo, fornecido por empresas pedagógicas para as atividades das
crianças pequenas. Há também pesquisas no campo da Educação Especial,
com o crescente diagnóstico de transtornos do espectro autista, além
do tema da medicalização das crianças, que sempre foi uma preocupação
nos estudos sobre a infância. Um aspecto relevante que está emergindo
que é a violência do Estado brasileiro e o assassinato de crianças, muitas
vezes referidos como “balas perdidas”, que atingem principalmente
os corpos de crianças pobres e negras. Também assistimos a guerras que
vitimam crianças de maneira inaudita, sem que os organismos internacionais
se posicionem adequadamente para protegê-las. Estamos diante de
um infanticídio em curso, como se vê nas guerras em Gaza, no Sudão, na
Ucrânia e no Brasil, por meio das chamadas “balas perdidas”. Além disso,
continuam a ser debatidos temas estruturais da sociologia da infância,
como trabalho infantil, mortalidade infantil e desigualdade social.

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