A performance “pelo Bilro e pelo Espinho” foi criada a partir da confluência de aspectos afetivo-biográficos e político-poéticos na prática da renda de bilros da bisavó da artista Jucélia da Silva e pelo contexto de inserção da técnica estrangeira por portugueses nas Vilas de Índios do Norte e Nordeste do Brasil, em meados do século XVIII. Contato que teria gerado mudanças em seus materiais e modos de fazer, devido às diferenças culturais do seu local.

A artista se faz cabeça-almofada para se aproximar, pelo ori, da sacralidade telúrica impregnada nos materiais da trama – agora transmutada em máscara. Ao seu redor duas rendeiras caminham lentamente para tecer a máscara-veste. Girar os corpos para descer a renda. E como agora o suporte é a sua cabeça, os espinhos foram inseridos de dentro para fora da trama. Assim, ainda atuam para evitar que a renda se desmanche, mas sem serem fincados em nenhuma base.

A imagem-corpo performada durante a ação surge como uma encruzilhada de temporalidades e dá a certeza de que não está ali – e não está aqui – sozinha. Ao fim desse processo – que é complexo na mesma medida que fascinante – a maioria dos elementos que co-atuaram no espetáculo visual de tessitura da renda de bilros saem de cena, permanecendo a linha tramada: dimensão tátil e visível do gesto de quem as produziu.

Jucélia da Silva é mestranda em Poéticas de Atuação em Artes pela Universidade Federal do Pará (UFPA/PPGArtes). Bacharela e licenciada em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Unesp (IA-SP) e licenciada em Estudos Artísticos pela Universidade de Coimbra (UC-PT). Integrante do grupo de pesquisa PETECA e bolsista pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).