A história da guardiã do único atol do Atlântico Sul 

13/02/2024

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*Por Paulina Chamorro

Abrimos nossas histórias de mulheres e seu amor pela natureza com uma personagem emblemática quando falamos de conservação marinha: Maurizélia de Brito e Silva, a Zelinha do Atol, chefe da Reserva Biológica (Rebio) Atol das Rocas, o único atol do Atlântico Sul e um dos menores do mundo.

Esta repórter e o fotógrafo João Marcos Rosa puderam ver de perto, no final de 2021, o porquê da fama. Ela é a protetora desta pequena porção de areia, envolta por um cordão de recifes de corais e formações de algas, que fica no topo de uma cadeia de montanhas submarinas, no meio do Oceano Atlântico.

Zelinha, a guardiã do Atol das Rocas, há mais de três décadas dedica a maior parte do seu tempo e vida morando neste local, percorrendo, mergulhando, cuidando e protegendo o delicado ambiente marinho.

“Quando penso em desistir, subo no farol. De lá, vejo todo o atol e grande parte da área da unidade. Tenho um retrato mental de todo esse lugar, conheço cada pedacinho, até as rocas, e olho e penso em tudo o que fiz.” Maurizélia de Brito e Silva

Foto: João Marco Rosa

#PraCegoVer Imagem retangular e colorida do oceano, em destaque de uma área de recife com uma lancha no centro e uma mergulhadora entre os corais. 

Sua casa e local de trabalho há mais de 30 anos, a Rebio, é um dos ambientes marinhos naturais com menos impacto humano no mundo. Um lugar feito para tubarões, raias, caranguejos, peixes, lagostas, polvos, moreias e milhares de aves, que compõem um enorme ninhal. Zélia talvez seja a única espécie humana totalmente adaptada a este ambiente inóspito e solitário. É endêmica atolense, que tem sua personalidade variando com a força das marés internas e externas, e a resiliência dos corais que se recuperam a cada troca de sedimento.

O interior do atol, a parte habitável, é extremamente restrita de espaço e com visitas de pesquisadores que, às vezes, esperam anos por esta oportunidade. Tem apenas uma faixa de areia e não há água potável no Atol das Rocas. A única casa tem três quartos, dois para as equipes e um para Zelinha e seus mantimentos. A cozinha não tem pia e não existe banheiro. A energia é fornecida por 48 placas solares que abastecem geladeiras, luz e internet, que chegou em 2007.

Foto: João Marcos Rosa

#PraCegoVer Imagem retangular e colorida de baixo d’água, de uma mergulhadora próxima de dois tubarões.

O que pudemos acompanhar nos dez dias neste ambiente único, no meio do oceano, a 270 km de Natal/RN, foram momentos já de calmaria de uma história que começou cheia de desafios. Hoje, ao vermos Zelinha fazendo monitoramento diário de ninhos, caranguejos, tocas de polvos, tubarões fêmeas, corais, budiões e a dinâmica de sedimentos, não imaginamos que os primeiros dez anos foram de muita luta, tendo que encarar o medo de frente.

Os primeiros anos, quando Zelinha ainda era subchefe – foi nomeada chefe da unidade dois anos depois de chegar –, foram duros e intensos. As equipes dormiam em barracas, ficavam acampadas por meses e eram alvos constantes de ameaças por pescadores, que chegavam de barco para pescar em volta do atol. “Os desafios foram todos, de ocupação, de continuidade, de aprendizado, de conhecimento, de persistência, de insistência, do acordar, do amanhecer, do anoitecer, de tudo. Muitos desafios, mas o maior deles foi o medo”.

Foto: João Marcos Rosa

#PraCegoVer Imagem retangular e colorida de uma mulher vestida de azul e branco, com uma mochila nas costas e uma máquina fotográfica apontada para uma ave marrom acinzentada.

Foi muitas vezes encarando sozinha estes perigos que Zelinha se impôs, recebendo até o título de Xerife do Mar. Hoje, prefere mais a alcunha de Guardiã do Atol. Estar em Rocas é estar em um lugar onde percebemos como é o mundo com pouca interferência humana. Tudo em equilíbrio, graças à incansável Zelinha e seu amor, recíproco, pelo Atol das Rocas.

Estar na Reserva Biológica Atol das Rocas é uma oportunidade rara, destinada a pesquisadores e pesquisadoras que às vezes esperam anos por esta oportunidade. Mas presenciar os fenômenos naturais acontecendo no meio do oceano é contemplar um pouco sobre como é o mundo com pouca interferência humana. Tudo em equilíbrio, graças à incansável Zelinha e seu amor, recíproco, pelo Atol das Rocas.

“Agradeço principalmente ao atol, por ter aceitado essa parceria. Essa é minha maior vitória.
É saber que existe esse amor e esse compromisso entre nós dois”.

Maurizélia de Brito e Silva

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