O show da cantora e compositora carioca Leci Brandão no ginásio do Sesc Piracicaba teve um clima de celebração ancestral, desde sua entrada no palco até as fotos com sua imensa fila de fãs. A apresentação abriu a programação do 11º Festival Afropira
Em 12 de setembro de 2024, Leci completou 80 anos de vida e 50 anos de carreira. No show, cantou por duas horas acompanhada por sua banda, passeando pelos sucessos cantados em coro pela plateia. Além dos sambas românticos, no repertório letras de cunho social e de autoafirmação da cultura afro.
Após sua apresentação marcante, Leci cedeu entrevista com a disposição e gentileza condizentes a sua trajetória, uma diva guerreira do Samba.
Leci Brandão, na sua trajetória musical, você gravou mais sambas com mensagens de cunho social ou romântico?
Leci Brandão: Eu acho que eu gravei mais sambas com letras de cunho social, por isso fui muito criticada nos anos 70, pois as pessoas diziam que eu ficava querendo só falar de problemas e que eu devia mudar um pouco, pois nem todo mundo concordava com esse tipo de repertório e de mensagens. Em 1981, o meu repertório para o disco não foi aceito e eu saí da gravadora PolyGram. Achavam que meus sambas estavam muito sérios, né? Eu fiquei 5 anos sem gravar e só voltei a lançar um disco em 1985.
Qual a importância de ser homenageada sendo tema de samba enredo pela Acadêmicos do Tatuapé?
Leci Brandão: Foi muito emocionante e inesquecível. Um momento muito especial na minha vida e tive a felicidade de ter minha mãe, irmã e sobrinhas no mesmo carro alegórico que desfilei. E a minha mãe e irmã, que já estão outro em plano, mas pelo menos, elas tiveram a oportunidade de desfilar no carnaval de São Paulo em 2012 na primeira e única Escola que me que homenageou. Eu fiquei muito feliz, pois a Acadêmicos do Tatuapé estava no segundo grupo e conseguiu com esse enredo voltar para o grupo especial em 2013.
Os pagodeiros como os sambistas, tocam samba. Por que da contradição de algumas pessoas fazerem a separação entre sambista e pagodeiros?
Leci Brandão: Eu acho que todo mundo tem direito de fazer sucesso. As pessoas discutem que as letras dos grupos de Pagode falam muito de amor e tal, mas o público feminino abraçou Pagode, pois as letras são românticas, falam do amor, da ternura, da conquista amorosa e da felicidade, essas mensagens arrebataram um maior número de mulheres que passaram a gostar do pagode.
A minha conduta na vida, é de não criticar algo que não seja igual o que eu faço. No passado, eu falei para alguns meninos do Pagode, que seria muito importante eles também abordar as questões sociais, pois a sociedade brasileira, precisa entender, que existe uma diferença dentro do Brasil, em relação a classe social. Hoje, a gente percebe que os pretos estão com mais protagonismo, nas novelas, nas matérias em grandes canais de TV. Começou a haver uma importância para a comunidade, para as favelas, etc.
Os grupos de Pagode mereceram o lugar de sucesso que ocuparam, pois o público gostou. É claro que nem todos tiveram a oportunidade de construir uma grande carreira, mas eu nunca fui contra. Inclusive, gravei alguns sambas de alguns grupos de Pagode que me deram muito sucesso na minha carreira.
A discussão para caracterizar quem é melhor ou quem é pior, não é válida e perdemos muito tempo. Temos que ajudar a construir, orientar e aconselhar. É melhor assim!
Na década de 70, você foi pioneira se posicionando contra o machismo, a homofobia, o racismo. No século XXI, o que a sociedade avançou nessas pautas?
Leci Brandão: Quem me criticou e me questionou no passado sobre eu fazer música que abordavam essas pautas, hoje, elas estão nas páginas dos jornais, nas TVs, na comunicação em geral. Hoje, as pessoas passaram assumir sua condição, algo que naquela época (nos anos 70) era uma coisa escondida, não era reverenciada. Na sociedade não se podia falar em determinados temas. Para minha felicidade, hoje, as minhas abordagens estão atuais. Eu sou precursora de muita coisa e me sinto muito feliz por isso.
Você foi a primeira mulher a entrar para a Ala de Compositores da Estação Primeira da Mangueira. Quais foram os obstáculos que você enfrentou para chegar e dar continuidade fazendo samba enredo com eles?
Leci Brandão: Quase não houve obstáculo, pois fui convidada pelo Zé Branco, que era um compositor da Ala, ele sabia que eu participava de festivais estudantis e tal. Eu, ainda não era da Mangueira, mas já fazia sambas. No primeiro momento houve um certo espanto e depois concordaram que eu poderia entrar e ficar fazendo samba de Quadra e tal. E que eu seria avaliada se tinha valor e se valeria a pena entrar na Ala. Em 1971 entrei simbolicamente e em 1972 passei a fazer parte da Ala e comecei a desfilar no carnaval carioca pela Mangueira.
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