
O título faz referência ao esforço, muitas vezes invisível, necessário para manter uma companhia de dança viva. Qual é esse balé que não se vê e como ele se faz presente em cena?
Esta ideia surgiu há alguns anos, primeiro como projeto e não como espetáculo. Foi criado para suprir nossa carência financeira, que impedia a realização de projetos cênicos. Nosso diretor artístico, o Zebrinha, teve essa ideia para incentivar os bailarinos, estendendo o convite aos músicos, cantoras e técnicos da companhia, como forma de desenvolverem habilidades conhecidas e desconhecidas.
Passamos a experimentar a criação de várias células coreográficas e de tudo mais que pudesse ser idealizado pelos participantes. Dessa primeira tentativa surgiram surpresas fantásticas que chamaram a nossa atenção para o fato de que este Balé Folclórico da Bahia não era conhecido nem mesmo por nós. O balé do dia a dia, da ralação, dos entraves, das aulas exaustivas, dos sucessos, dos resultados surpreendentes e das transformações. As pessoas acham que pelo fato de ter um imaginário construído de que “baiano não nasce, mas sim estreia”, as cortinas se abrem e saímos bailando, tocando berimbau e tambores, jogando capoeira. E, sim, somos assim, mas a realidade é que tudo isso requer trabalho árduo, disciplina, formação técnica, profissionalismo e competência. E é este balé que ninguém imagina que existe, que ninguém conhece tão a fundo – por isso queremos mostrar este balé que ninguém vê.
Fazemos um passeio entre a tradição e o contemporâneo, porém sem sair da nossa linguagem e sem abandonar nossas raízes

O espetáculo é composto de quatro coreografias que passeiam pelo tradicional e pelo contemporâneo. Como esse diálogo se manifesta em cena?
Fazemos um passeio entre a tradição e o contemporâneo, porém sem sair da nossa linguagem e sem abandonar nossas raízes. No fundo, é só uma forma diferente de nos mostrarmos e dizermos o quanto somos versáteis e ousados. Afixirê é nossa coreografia master, aquela que já é esperada por todos os nossos fãs. É impressionante como as pessoas se identificam, principalmente a população negra de todos os lugares. Ela éuma ode à diáspora africana pelo mundo. Daí a gente se arrisca a trazer ao lado dela três coreografias que expõem um lado mais alternativo da companhia. Pela formação bastante completa, nosso elenco está apto a dançar em qualquer linguagem corporal. No espetáculo, incitamos o público a descobrir este diálogo e nos dizer: “deu certo?”.
Como você enxerga o papel da dança na sociedade atual e o que ela pode mobilizar ou revelar sobre nossos tempos?
Dançar foi a primeira expressão desenvolvida pelo ser humano para demonstrar seus sentimentos, além de ser um meio de comunicação. Foi através da dança que o ser humano moldou sua vida e espelhou felicidade, angústia, medo, temor, que se transformaram em arte, religião, política, sociedade e tudo que faz parte do dia a dia da humanidade. O corpo sempre serviu de tela para refletir os sentimentos em todos os tempos, e isso perdura até os dias atuais. A dança liberta e expõe nossa linha do tempo. O próprio corpo é um palco nu. A cada movimento surgido durante séculos de evolução da dança, esta arte reflete fielmente a realidade vivida, seja nas aldeias, nas salas de aula e nos palcos do mundo, seja nas reflexões e até mesmo nas teorias criadas pelos pensadores dessa arte.

Inspirado na luta diária de uma companhia profissional para continuar existindo, o espetáculo do Balé Folclórico da Bahia lança luz aos bastidores e a aspectos desconhecidos do balé. Em cena, o grupo se arrisca em novas linguagens, passeando pelo tradicional e pelo contemporâneo, mas sem abrir mão de sua raiz afro-baiana. A obra é composta por quatro coreografias, sendo três delas criadas por artistas saídos do BFB e que hoje são expoentes da dança internacional. Em Okan, de Nildinha Fonseca, o universo feminino é o fio condutor da coreografia. Já 2.3.8, de Slim Mello, coloca Plataforma, bairro periférico de Salvador, no centro da narrativa. Bolero, obra musical do compositor francês Maurice Ravel, é revisitada na coreografia de mesmo nome de Carlos Santos. A elas une-se Afixirê, de Rosângela Silvestre, repertório clássico da companhia que celebra os povos africanos e a Bahia.
The title alludes to the often invisible effort it takes to keep a dance company alive. What is the ballet we don’t see, and how is it present on stage?
The idea first came about years ago as a project—not yet a stage production. It was born out of a lack of funding, which made it difficult to produce full-scale shows. Our artistic director, Zebrinha, suggested creating something that could motivate our dancers, inviting musicians, singers, and technicians to explore both familiar and unfamiliar artistic skills. We began experimenting with short choreographic phrases and everything else the group could conceive. From that first attempt came surprising results. It made us realize that even we didn’t fully know this Balé Folclórico da Bahia — the company that exists behind the scenes, through daily grind, challenges, exhausting rehearsals, achievements, and transformations. People often imagine that because of our cultural image — “people from Bahia don’t just live, they perform” — we just step onstage, dancing, drumming, playing berimbau and capoeira. And yes, we do all that. But it takes hard work, discipline, technical training, professionalism, and skill. That’s the ballet no one sees, the one we want to make visible now.
We move between tradition and the contemporary without losing our language or distancing ourselves from our roots

The show features four choreographies that blend traditional and contemporary influences. How does this dialogue appear on stage?
We move between tradition and the contemporary without losing our language or distancing ourselves from our roots. It’s just a different way of showing who we are — our versatility and boldness. Afixirê is our signature piece, the one our fans always expect. It deeply resonates, especially with Black audiences around the world. It’s an ode to the African diaspora. Alongside it, we bet and present three works that explore the company’s more alternative side. Thanks to their comprehensive training, our dancers are equipped to work across a wide range of styles. The show invites audiences to explore this dialogue with us and ask: “Did it work?”
How do you see the role of dance in today’s society and what can it mobilize or reveal about our times?
Dance was humanity’s first expressive language — used to convey emotion and communicate. Through dance, people have mirrored joy, sorrow, fear, and reverence. Those expressions have become art, religion, politics, society — everything we live as humans. The body has always been a canvas for emotion, and that’s still true today. Dance frees us and reveals our timeline. The body is its own stage. With each movement developed across centuries of dance evolution, this art form continues to reflect lived realities — in villages, classrooms, theaters, reflections, and even the theories created by dance thinkers.
Inspired by the daily struggles of a professional company to survive, Balé Folclórico da Bahia’s performance sheds light on behind-the-scenes dynamics and lesser-known aspects of ballet. On stage, the group explores new expressive forms, moving between the traditional and the contemporary, while staying deeply rooted in the Afro-Brazilian traditions of Bahia. The performance features four choreographies, three of which were created by former BFB dancers who are now leading names in international dance. Okan, by Nildinha Fonseca, explores the feminine universe. 2.3.8, by Slim Mello, brings Plataforma — a marginalized neighborhood in Salvador — to the center stage. In Bolero, Carlos Santos reimagines Maurice Ravel’s iconic score. Completing the program is Afixirê, by Rosângela Silvestre, a company classic that celebrates African diasporic culture and Bahia.
Confira a entrevista com com DJ Michell.
Utilizamos cookies essenciais para personalizar e aprimorar sua experiência neste site. Ao continuar navegando você concorda com estas condições, detalhadas na nossa Política de Cookies de acordo com a nossa Política de Privacidade.