O Ciclo P2A2 como ferramenta de gestão do tempo

11/04/2023

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Por Patricia Tempski e Milton Martins

Resumo

Gestão de tempo é uma competência a ser desenvolvida e não deve servir para fazer mais, mas para fazer melhor, desfrutar do tempo e da vida. O Centro de Desenvolvimento de Educação Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (CEDEM-FMUSP), a partir da análise de evidências e experiência com orientação de professores e alunos, propôs um novo modelo para gestão do tempo, baseado em quatro etapas: planejar, priorizar, agir e acompanhar (P2A2). Com treino e persistência, é possível fazer uma lista de tarefas com objetivos claros e realistas; priorizar ações baseando-se na classificação de tarefas urgentes, circunstanciais e importantes; agendar e cumprir as tarefas; e acompanhar sua execução, mantendo o foco.


Gestão do tempo para quê?

Segundo Peter Bergman (2012) um dos autores do livro Harvard Business Review “Faça o trabalho que precisa ser feito”, há associação positiva entre gerenciar o tempo com eficiência e melhora da performance profissional. Shawn Anchor (2012) também pesquisador da Harvard, afirma que gerenciar o tempo melhora nossa percepção de bem-estar e felicidade.

Talvez essas associações de gestão do tempo, com melhora da felicidade e eficiência, aconteçam porque gerir o tempo nos aproxime do nosso propósito, como descreve Simon Sinek (2009) no seu livro “Comece pelo porquê”. Começar pelo “porquê” significa manter nosso foco e nossa energia nas atividades que estão em coerência com nosso propósito de vida.

O Projeto VERAS – Vida de Estudante e Residente da Área da Saúde, analisando a percepção de qualidade de vida, ambiente de ensino e as competências emocionais de 1.350 estudantes de medicina brasileiros, verificou que a variável ‘tempo’ é aquela que mais tem impacto na qualidade de vida dos estudantes (Tempski et al. 2009, 2012, 2016, 2018). Portanto, gerir o tempo é preditivo de qualidade de vida e sucesso para estudantes e profissionais!

O Ciclo P2A2

O Centro de Desenvolvimento de Educação Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (CEDEM-FMUSP), a partir da análise de evidências e experiência com orientação de professores e alunos, propôs um novo modelo para gestão do tempo, baseado em quatro etapas: planejar, priorizar, agir e acompanhar (P2A2). Inspirados pelo modelo de planejamento de projetos PDCA: plan-do-check-act (Shewhart, 1939) e os princípios de aprendizagem de adultos, em especial o ciclo de aprendizagem de Kolb (Kolb, 1984), reunimos nesta proposta evidências científicas sobre aprendizagem, gestão e qualidade de vida.

Passo 1: Planejar

O primeiro passo da gestão do tempo é fazer uma lista de tarefas, com objetivos claros e dimensionados de forma realista. As listas podem ser compostas por atividades distribuídas ao longo do dia, ou para uma semana, ou ainda períodos maiores que definem metas de longo prazo. Listas detalhadas têm maior chance de serem seguidas. 

Por outro lado, listas intermináveis correm maior risco de serem abandonadas. O ideal é escolher um método de preferência e refazer a lista a cada dois ou três dias. Atualmente, há aplicativos que ajudam a construir e acompanhar sua lista de tarefas como o Google Keep, Notion e o TODOIST, que recomendamos, mas você pode continuar usando sua agenda, Bullet Journals e planners de papel ou no formato digital com o aplicativo GoodNotes. 

Para qualquer modelo de lista que você escolha, a dica é a mesma: escrever as tarefas com verbos e, de preferência, definindo ‘quando’ e ‘como’. Por exemplo, se você escrever “Ligar para a Andréa no intervalo da manhã”, será mais provável que você realize essa tarefa do que se escrevesse na sua lista “Aniversário da irmã”.

Passo 2: Priorizar

O segundo passo da gestão do tempo é priorizar. Ter clareza sobre quem somos, quais são as nossas prioridades e valores, nossos objetivos e metas de curto, médio e longo prazo, pode nos ajudar a priorizar o uso do nosso tempo. Pois, tudo não cabe na agenda!

Segundo William Glasser, autor da Teoria da Escolha, a percepção do que é essencial difere para cada pessoa. Por exemplo, alguém que tem muita necessidade de pertencimento sofrerá mais ficando longe da família, que outro sem a mesma necessidade. Outro exemplo diz respeito às necessidades fisiológicas, como dormir e comer em horários definidos. Há pessoas que não conseguem ser produtivas e felizes se suas necessidades não forem atendidas conforme uma rotina determinada. 

A Teoria da Escolha refere-se às escolhas conscientes e pautadas em autoconhecimento, que direcionem as pessoas àquilo que lhes faz bem, ou é essencial para sua saúde física e mental. Uma forma de refletir sobre isso é responder às perguntas da Matriz de Uso do Tempo: o que gosta e faz, o que gosta e não faz, o que não gosta e faz, e o que não gosta e não faz. Em outras palavras, o princípio para definir o que é essencial e priorizar isto, é saber o que gosta de fazer (desejos), o que você gosta, mas não faz (renúncia) que não gosta, mas precisa fazer (obrigação) e o que pode evitar (escolhas).

Todos temos as mesmas 24 horas a cada dia, ou seja, ao invés da afirmação “não tenho tempo” o correto seria dizer, “não tenho tempo porque não priorizo essa ou aquela atividade”. Mas, como priorizar? Existem muitos métodos que auxiliam a priorização de ações, baseados na classificação de tarefas em urgentes, circunstanciais e importantes.

Tríade do Tempo é um método de priorização, popularizado no Brasil por Christian Barbosa, que classifica as tarefas em Importantes, Urgente e Circunstanciais. Tarefas urgentes precisam ser feitas imediatamente e geram estresse; aquelas circunstanciais se relacionam com hábitos e situação que não agregam valor, consideradas perda de tempo. Já as tarefas classificadas como importantes, são as que fazem diferença nas nossas vidas, gerando resultados financeiros ou acadêmicos e benefícios físicos, mentais, emocionais ou espirituais, ou seja, têm consequências positivas a curto, médio e longo prazo. Especialistas em gestão do tempo sugerem que uma divisão adequada seria de 20% para as atividades urgentes, 10% para as circunstanciais e 70% para as importantes. 

Priorizar envolve tomada de decisão e frequentemente dizer NÃO! E, principalmente, identificar quais são as atividades realmente importantes e os seus ladrões do tempo. “Ladrões do tempo” são atividades que podem ser lúdicas e divertidas, por exemplo, redes sociais e outras mídias, mas, que em excesso, ocupam grande parte do seu dia sem que você tome consciência do quanto elas impactam sua rotina. 

Antes de agir e colocar sua lista de tarefas na agenda, sugerimos que você reveja a sua lista considerando a Matriz de Uso do Tempo e a Tríade do Tempo.

Passo 3: Agir

É essencial colocar as tarefas da sua lista na agenda, pois, para cumpri-las, é preciso estabelecer uma rotina de organização e gestão do tempo. Escrevê-las e organizá-las pode ser uma forma de começar. Podem ser utilizadas agenda de papel ou eletrônica, e tudo junto e misturado!

As horas de sono são as primeiras horas a serem subtraídas da agenda de uma pessoa ocupada, seja por ladrões do tempo ou horas extras de trabalho. A questão é que há muitas evidências que a privação de sono tem impacto na saúde física e qualidade de vida das pessoas, afetando seu humor, capacidade de se relacionar, atenção, assimilação e aprendizado. 

Comece sua agenda marcando quantas horas você precisa dormir, depois todas as outras horas são suas para fazer o que desejar e precisar!

Atenção! Considere tempo de deslocamento e pausas para descanso e alimentação. Comece definindo suas horas de sono.

Passo 4: Acompanhar

O quarto e último passo da gestão de tempo é o acompanhamento da execução das tarefas – que ajuda a manter o foco, realizando cada tarefa da sua lista em um planejamento para médio e longo prazo – que pode auxiliar a execução do plano como um todo. Para alguns educadores, o foco e persistência são tão decisivos para o sucesso acadêmico, quanto as habilidades cognitivas de um estudante (Angela Dockworth, 2013).

Estudos demonstram que riscar os itens de uma lista é interpretado como uma “pequena vitória” e proporciona sensação de autocontrole, realização e bem-estar, mobilizada por neurotransmissores, o que pode ser muito motivador no sentido de manter foco e seguir completando suas tarefas. 

Existem ferramentas para o acompanhamento de tarefas individuais ou compartilhadas, como o método Kanban para acompanhamento de projetos e sequenciamento de ações. O nome Kaban tem origem japonesa, tendo sido desenvolvido na fábrica automobilística Toyota. Significa “cartão” ou “sinalização”. Utiliza cartões para identificar o fluxo da produção e adere à filosofia do “just in time” relativa ao tempo de realização de cada tarefa, em projetos pessoais ou profissionais. Você pode fazer um quadro Kaban na parede ou usar ferramentas digitais como o TODOIST para acompanhar as tarefas da sua lista, ou o Trello para projetos compartilhados.

Quando você completar um ciclo P2A2, volte ao planejamento inicial, reveja sua lista e sua matriz de uso do tempo, priorize, coloque na agenda e acompanhe, abrindo um novo ciclo. 

Tenha em mente que a gestão do tempo, como outras competências, é treino e persistência. Se hoje não foi bom…amanhã vai ser melhor! Não desista e siga aprimorando!

Perspectivas

Mudanças de atitude em relação a como usar as 24 horas que um dia nos permite ter, envolvem aprender a delegar e a dizer não, reconhecer e respeitar nossos limites e organizar propostas de trabalho factíveis, evitando ser multitarefas. 

Além disso, a organização e gestão do tempo dependem de autocuidado, motivação e encontrar um sentido para a vida. A medida do tempo e seu uso depende, em muito, da subjetividade e dos valores de cada um, e da escolha e aplicação de métodos que melhor se adaptem à sua realidade. 

Gestão de tempo é uma competência a ser desenvolvida, então, não busque a perfeição, mas continue sempre tentando melhorar e aprender quais estratégias e ferramentas funcionam melhor para você. Afinal…gestão do tempo não é para fazer mais, mas para fazer melhor, desfrutar do tempo e da vida!


Patricia Tempski 
Médica. Livre Docente em Educação na Saúde pela Universidade de São Paulo. Coordenadora do Centro de Desenvolvimento de Educação Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Faculty na Harvard Macy Institute no curso – Leading Innovation in Health Care & Education.

Milton de Arruda Martins 
Médico. Professor Titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Master da American College of Physicians.

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