O Olhar sensível sobre a Violência Doméstica e a boca como resistência 

10/06/2025

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O seminário realizado no Sesc Piracicaba no dia 28 de maio promoveu uma reflexão sobre a violência doméstica e suas consequências físicas e simbólicas. Os responsáveis pela condução do evento foram Rodrigo Mendes e Cristina Gibilini, coordenador e supervisora da Clínica Odontológica do Sesc Piracicaba. 
 
O evento contou com a participação de Júlia Vitório Octaviani, Tatiana Rosa Silva, Karina Sabedot, Fabiana Menegon de Campos e Luciane Miranda Guerra, profissionais das áreas de saúde, assistência social, psicologia e artes, que cuidam e acolhem vítimas de violência. O intuito era buscar novas perspectivas para que as bocas não sejam silenciadas pela violência, mas se tornem instrumentos de resistência, denúncia e potência. 

A cirurgiã, dentista e professora de odontologia da Universidade de Sorocaba, Júlia Vitório Octaviani fez seu relato pautada na experiência clínica de atendimentos de pessoas em situação de violência e o que essas experiências trouxeram de reflexões. A profissional deixou um alerta sobre a falta de capacitação de profissionais da saúde sobre vítimas de violência doméstica.  

Júlia explicou o motivo de ter a palavra boca no título do seminário: “O que a violência contra a mulher tem a ver com a boca? E como nós dentistas temos um papel fundamental na identificação da violência? Por meio dos sinais da violência e a partir da boca que conseguimos orientar a vítima e montar um caminho para que a vítima tenha conhecimento dos seus direitos. A boca é muito importante, sabemos que a cabeça e o pescoço são regiões mais agredidas durante uma violência. A boca tem papel decisivo ao falarmos sobre intervenção, orientação da vítima sobre seus direitos”. 

A paciente e educadora social Tatiana Rosa Silva relatou como foi importante a escuta ativa e empática de um profissional da saúde que a atendeu após sofrer violência doméstica. Ela também relatou o desconforto e falta de empatia de outros profissionais de saúde que não escutaram seus relatos sobre as violências sofridas.  Hoje, ela trabalha com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, é voluntária em diversos projetos sociais em Piracicaba, atuando diretamente na luta social e cultural da periferia.  

A psicóloga jurídica da Defensoria Pública, Karina Sabedot, na sua fala, trouxe um panorama de políticas públicas e redes de cuidados. O que tem sido feito para melhorar o acolhimento e o acesso das mulheres aos profissionais de saúde bucal? Segundo ela, é um fenômeno social, que não está apenas dentro do consultório, mas uma cultura que vem do patriarcado, machismo estrutural, misoginia.  

Ela explicou: “Hoje nós falamos sobre violência contra a mulher, as lesões na região do da face, sobretudo na boca e mandíbula. Essa é uma das regiões mais atingidas nos casos de violência doméstica. Essa violência e agressão tem dois elementos, um que é físico e outro que é a humilhação. E reforça o caráter de inferiorizarão da mulher presente no patriarcado exercido pelas condutas machistas. E que tem a ver com o discurso misógino de ódio a mulher. É como se essas agressões se identificassem, além da inferioridade da mulher e uma lesão à sua própria personalidade e autoestima”. 

A representante do CRAM (Centro de Referência e Atendimento à Mulher), Fabiana Menegon relatou suas experiências práticas no atendimento, acolhimento de mulheres em situação de violência doméstica. Ela, falou sobre redes de apoio e como tem acontecido, na prática, esse encontro entre os profissionais e as mulheres. 

A professora universitária da Faculdade de Odontologia, Luciane Guerra, questionou à plateia, em sua maioria composta por profissionais da saúde: “…o que fazemos com todas essas informações?” E por meio dessa pergunta, ela fez a amarração dos relatos anteriores, contando sobre as dificuldades em mudar o modo como os profissionais de saúde bucal conduzem os cuidados para essas pessoas. E pensando principalmente na formação de novos profissionais e como os diálogos são importantes para mudar o modo de cuidar em saúde bucal. 

A constatação final é que muitos casos de agressão têm como foco a tentativa de anular a identidade da vítima, ferindo, não apenas o corpo, mas também a capacidade de se expressar, comunicar e existir socialmente. A “boca” como símbolo, destaca a importância da fala, da escuta e da expressão como caminhos para a superação e fortalecimento das vítimas. 

O evento foi gratuito e aberto ao público, recomendado para profissionais da área social, estudantes, pesquisadores e interessados na temática dos direitos humanos e enfrentamento à violência de gênero. 

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