Paisagens e culturas ameaçadas em 2200km

23/07/2025

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Barra dos Remédios, Ceará

João Farkas revela a costa norte brasileira em novo livro

As Edições Sesc SP lançam Costa norte, novo livro do fotógrafo João Farkas, que apresenta um olhar inédito sobre a costa norte brasileira. A obra reúne imagens selecionadas entre mais de 20 mil fotografias, resultado de uma expedição de três anos (2021-2023) que percorreu cerca de 2.200 quilômetros da costa norte do país, do Oiapoque (AP) ao Rio Grande do Norte.

O livro documenta áreas pouco conhecidas e de ocupação humana esparsa, incluindo o delta do rio Parnaíba, a foz do rio Amazonas, a ilha de Marajó e as Reentrâncias Maranhenses. Além das fotografias, a publicação conta com textos do próprio autor, posfácio do jornalista Fernando Gabeira e artigos da pesquisadora Valdete Cecato sobre as características históricas da região e sua biodiversidade.

Como define o próprio autor, trata-se de “um registro documental extenso, que procura também formas de sensibilizar e chamar a atenção para a imensa riqueza natural” da costa norte. O projeto aprofunda-se na vida das populações locais – ribeirinhos, pescadores e povos indígenas – e alerta para os riscos de uma ocupação desordenada e da atividade exploratória indiscriminada do meio ambiente, apostando no poder de mobilização despertado pelas imagens.

A intuição fotográfica como testemunho da transformação iminente

Foz do rio Amazonas entre Amapá e Marajó

O Projeto Costa Norte nasceu de uma percepção quase instintiva sobre a urgência de documentar uma região em vias de transformação radical. Farkas identifica nos 2.200 quilômetros entre o Amapá e o Rio Grande do Norte um território único – onde o delta do Parnaíba, a foz do Amazonas e o Marajó se articulam em um mosaico de dunas, manguezais e reentrâncias – que demanda registro antes que a ocupação desordenada e a atividade exploratória ambiental o transformem irreversivelmente. Essa intuição, mais do que qualquer referência acadêmica, impulsiona um projeto de dimensões equivalentes à sua relevância ecológica e cultural.

Consciente de que o registro documental tradicional perdeu sua capacidade de mobilizar um público saturado de imagens, Farkas desenvolve uma linguagem visual que flerta com o abstrato sem perder a ancoragem no real. Suas fotografias da costa norte incorporam adversidades luminosas, contrastes extremos e composições indecifráveis, criando o que o curador denomina “mínima semântica” – imagens que surpreendem e deslocam o espectador do conforto do já visto. Essa abordagem estética inovadora transforma o registro da natureza em instrumento capaz de despertar interesse e mobilizar atenção em tempos de abundância visual.

Ilha das Canárias, delta do Parnaíba

A revelação da magnitude da província petrolífera na Margem Equatorial, com seus estimados 30 bilhões de barris de óleo, confere ao Projeto Costa Norte uma urgência imprevista e um valor documental imediato. O trabalho de Farkas, iniciado há quatro anos por intuição conservacionista, torna-se registro fundamental de uma região prestes a enfrentar os impactos do Antropoceno de forma acelerada. Entre defensores da conservação e desenvolvimentistas, o debate sobre o futuro da costa norte evidencia que a documentação dessa paisagem – onde estão alguns dos mais ricos pesqueiros do país e manguezais fundamentais à diversidade marinha – pode ser crucial para as gerações futuras compreenderem a configuração ambiental brasileira.

Com mais de 40 exposições internacionais e obras no acervo de instituições como MASP, MAM-SP e International Center of Photography, João Farkas é referência em fotografia documental e ambiental. Sua trajetória concentra-se no registro da riqueza natural e cultural brasileira, sempre com foco nas transformações aceleradas que o país tem atravessado. Costa norte dá continuidade ao compromisso do fotógrafo com a preservação ambiental, evidenciando a fragilidade de biomas únicos como manguezais e restingas, ameaçados pela ocupação desordenada e mudanças climáticas. O trabalho valoriza também as comunidades tradicionais da região, destacando a relação íntima entre cultura, identidade e meio ambiente.

Veja também:

:: trecho do livro

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