Pedalada Cultural entre Quilombos, em Eldorado/SP

31/01/2025

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Por Livia Badur

No último dia 19, o Sesc Registro promoveu uma pedalada cultural em Eldorado, interior de São Paulo, cidade do Vale do Ribeira, proporcionando aos participantes uma experiência imersiva dentro de territórios quilombolas. O percurso de 24 km cruzou estradas de terra que conectam três quilombos da região, sob um céu de sol intenso e algumas pancadas de chuva ao fim da tarde, tornando a vivência ainda mais memorável.


Além do desafio esportivo, a atividade teve como principal objetivo aproximar os participantes da realidade quilombola, fomentando o turismo de base comunitária, promovendo o desenvolvimento econômico dessas comunidades e o desenvolvimento cultural dos inscritos. Muitos dos ciclistas nunca haviam tido contato com quilombos, suas histórias e tradições, o que tornou a jornada um verdadeiro aprendizado sobre resistência, ancestralidade e sustentabilidade.

Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana

Três quilombos, três histórias de luta e tradição

A primeira parada aconteceu no Quilombo São Pedro. Fundado entre 1825 e 1830 por Roza Machado e Bernardo Furquim, o Quilombo São Pedro resistiu ao longo de quase 200 anos a invasões, desmatamento, criminalização de roças, tentativas de barragens na região. Hoje podem celebrar o registro oficial das terras como território quilombola. É administrado pela Associação dos Remanescentes de Quilombo de São Pedro, e possui um território rico em sua biodiversidade, com rios e nascentes. No trajeto do passeio, foi possível avistar construções de casas de pau-a-pique – técnica construtiva tradicional quilombola que consiste no entrelaçamento de madeiras que têm o vão preenchido com barro – uma capela, campo de futebol de várzea, horta comunitária e roças de coivara. A Roça de Coivara é um Sistema Agrícola Tradicional Quilombola – SATQ, que desde 2018 é reconhecido como Patrimônio Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.

Luiz Marcos de França Dias, conhecido como Luiz Ketu – liderança comunitária e doutorando em educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) – em fala para Luna D’Alama, em matéria para a Revista E.

“Utilizamos o fogo em pequena escala, de maneira controlada. Ele não adentra as matas. É muito diferente do que ocorre no Pantanal e na Amazônia, por exemplo, onde há incêndios criminosos. A nossa técnica não agride o meio ambiente, nem as camadas inferiores do solo ou o lençol freático. E sua segurança foi comprovada, inclusive, por pesquisas científicas da Universidade de São Paulo (USP).”

Durante a visita, os ciclistas foram recepcionados com um farto café quilombola, repleto de produtos locais, enquanto ouviam relatos emocionantes sobre a formação e as lutas da comunidade.

Aurico Dias – Liderança quilombola e Coord. Associação dos Remanescentes de Quilombo de São Pedro | Créditos: Everton Viana
Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana

A segunda parada foi no Quilombo Galvão, onde os participantes tiveram o privilégio de ouvir Dona Jovita, liderança quilombola que compartilhou sua trajetória na luta pelos direitos da comunidade. Com sua fala envolvente e cheia de vivências, ela relatou desafios históricos e conquistas fundamentais para os quilombolas, ressaltando a importância da organização comunitária e da preservação das raízes culturais. O centro comunitário do Quilombo Galvão estava abrigando também uma exposição de fotos de alguns momentos da linha do tempo da história da comunidade. As fotos eram exibidas em duplas: um contraponto entre o passado e o presente; uma foto atual reproduzida a partir de uma foto antiga, mostrando a evolução do território e das pessoas ao longo do tempo.

Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana
Dona Jovita Furquim, bisneta de Bernardo Furquim e liderança quilombola | Créditos: Everton Viana
Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana

Encerrando o percurso, os ciclistas foram recebidos no Quilombo Ivaporunduva, um dos mais antigos do Brasil e o primeiro a ser reconhecido oficialmente. Diferentemente de outros quilombos, não foi formado por pessoas escravizadas que fugiram ou foram libertos, mas por pessoas que foram abandonadas na fazenda após a morte de Dona Maria Joana, que faleceu sem deixar herdeiros. Ao longo dos anos, a comunidade se estruturou, mantendo vivas suas tradições e promovendo atividades como palestras, oficinas e o turismo cultural, além da produção de alimentos e artesanato.


O grupo foi recebido dentro da igreja da comunidade – a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, construída entre 1630 e 1690 e tombada pelo Condephaat em 1972, reconhecida como Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo – com uma palestra ministrada por Ditão, nascido na comunidade e uma das lideranças quilombolas mais antigas e reconhecidas do Vale do Ribeira. Após esse momento, foi servido um almoço preparado com alimentos cultivados pela própria comunidade.

Benedito Alves da Silva, conhecido como Ditão – uma das lideranças quilombolas mais antigas e reconhecidas do Vale do Ribeira | Créditos: Everton Viana
Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana
Grupo de guias turísticos e educadores do Quilombo do Ivaporunduva | Créditos: Everton Viana

Turismo de experiência e valorização das comunidades tradicionais

A pedalada cultural reforçou a importância do contato com povos tradicionais e da valorização de suas histórias e saberes. Atividades como essa não apenas proporcionam momentos de lazer e prática esportiva, mas também incentivam o turismo comunitário, promovendo a economia local e fortalecendo a identidade cultural das comunidades.


Os quilombos do Vale do Ribeira são verdadeiros guardiões de um conhecimento ancestral, transmitido de geração em geração, e desempenham um papel fundamental na preservação ambiental e na luta por direitos territoriais. Experiências como essa permitem que visitantes enxerguem além dos estereótipos, reconhecendo a riqueza cultural dos quilombolas e compreendendo a relevância de suas contribuições para a sociedade.


Ao final da jornada, ficou a certeza de que cada quilômetro pedalado foi também um passo a mais na construção de pontes entre diferentes realidades, promovendo o respeito, a inclusão e a valorização da diversidade cultural brasileira.


Segue o jogo!

A atividade fez parte da programação do Sesc Registro para o Sesc Verão 2025, que celebra a 30ª edição da ação. Sob o tema “Segue o Jogo!”, o projeto reafirma seu compromisso histórico de promover a prática esportiva como um caminho para a saúde, a inclusão e a qualidade de vida.

De 4 de janeiro a 16 de fevereiro em todas as unidades do SescSP: um convite para você movimentar o corpo e a mente com atividades gratuitas e abertas para todas as idades.

Acesse a programação completa aqui.

Pedalada Cultural entre Quilombos | Sesc Verão 2025 | Créditos: Everton Viana

Mais informações pelo telefone (13) 3828-4950.
O Sesc fica na avenida Prefeito Jonas Banks Leite, 57 – Centro – Registro/SP.

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