Instalação sonora da exposição Margens de 22: presenças populares

18/10/2022

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A exposição Margens de 22: presenças populares, propõe um olhar para a produção cultural dos agrupamentos familiares que organizavam blocos carnavalescos nas primeiras décadas do século 20. Tal olhar nos proporciona uma compreensão mais elaborada das influências que essa cultura segue exercendo na atualidade – particularmente evidentes no caso da produção musical.  

As narrativas encontradas em diversas músicas populares, marchinhas carnavalescas e sambas-enredo contam histórias ligadas ao cotidiano de pessoas que viviam a modernização da cidade de São Paulo, suas mazelas sociais e seu racismo, em meio a acontecimentos históricos, como a Semana de Arte Moderna de 1922. 

Para apresentar ao público um pouco desta produção, disponibilizamos nove músicas. Entre elas, estão uma marchinha carnavalesca criada em 1914 pelo patriarca do samba paulistano Dionísio Barbosa, uma letra do sambista paulista Geraldo Filme, crítica à modernização da cidade em 1970 e uma letra do cantor e compositor Itamar Assumpção, que faz alusão a Mário de Andrade e sua Lira Paulistana.  

Recuperar parte da história dos protagonistas dessas iniciativas socioculturais confere a seu legado reconhecimento e legitimidade. Estas músicas também estarão na exposição, que segue em cartaz no Sesc Carmo de 28 de outubro de 2022 a 24 de fevereiro de 2023.  

Samba-marcha – Grupo Barra Funda (1914)

Compositores: Dionísio Barbosa e Luis Barbosa / Intérprete: Oswaldinho da Cuíca

Minha gente, saia fora
Da janela venha ver
O Grupo da Barra Funda
Está querendo aparecer
Cantamos todos com voz aguda
Trazendo vida ao grupo da Barra Funda

Samba-marcha – Cordão Carnavalesco Camisa Verde (1928)

Domínio público / Intérprete: Adriana Moreira

O meu cordão vem batendo sem rival
Deixa passar meu carnaval
O meu chocalho vem falando e vem chorando
O tamborim vem batucando
O cavaquinho vem fazendo harmonia
Com violão e a bateria

Ô, abre-alas, abre-alas, por favor
Nossa batida é temida, é do amor

Nosso pandeiro vem falando e vem chorando
O tamborim vem batucando
O cavaquinho vem fazendo harmonia
Com violão e a bateria 

Saiam à janela – Cordão Carnavalesco Vai-Vai (1928)

Compositor e intérprete: Henricão

Saiam à janela, venham espiar
O Vai-Vai passar
Gente de valor
Turma do amor
Rei do carnaval 

O Vai-Vai na rua
Faz tremer a Terra
Quem está ouvindo e não vê
Chega a pensar que é guerra

Tebas, paulistano da glória (1974)

Compositor: Geraldo Filme / Intérprete: Plínio Marcos e Geraldo Filme

Tebas, negro escravo 
Profissão alvenaria 
Construiu a Velha Sé 
Em troca pela carta de alforria 
Trinta mil cruzados que lhe deu Padre Justino 
Tornou seu sonho realidade 
Daí surgiu a Velha Sé 
Que hoje é o marco zero da cidade 
Exalto no cantar de minha gente 
A sua lenda, seu passado, seu presente 

Praça que nasceu do ideal
E braço escravo, é a praça do povo
Velho relógio, encontro dos namorados 
Me lembro ainda do bondinho de tostão
Engraxate batendo a lata de graxa
E o camelô fazendo pregão 
O tira-teima dos sambistas do passado 
Bixiga, Barra Funda e Lavapés 
O jogo da Tiririca era formado 
O ruim caía e o bom ficava de pé 

No meu São Paulo, oilelê, era moda
Vamos na Sé que hoje tem samba de roda 

Semana de Arte Moderna e os contemporâneos do futuro – Camisa Verde e Branco (1978)

Compositores: Airton, Ideval, Mário Luis, Luis Carlos, Neff Caldas e Wilson Freire / Intérprete: Osvaldo dos Santos

Raiou… 
Neste céu a luz da liberdade
Vou lutar em igualdade 
Com o exterior 

E a Verde e Branco como tema
Traz a arte em poema 
Que esplendor 

Ô, ôô ôô ôô
Literaturas 
Grandes obras imortais
Ô, ôô ôô ôô
Belas pinturas
Esculturas geniais 

Aquela geração 
Foi de protestos
Houve o manifesto do Trianon 
Graças, oh!, meninos de 22
Não deixaram pra depois
O seu grande ideal 

Foram três dias, sim 
No Municipal, ôô 
De conferências 
Exaltando a cultura nacional

Ô, Maria, ô, Mariá!  
Leva meu samba 
Vá cantar no Olympia

100% Camisa Verde e Branco carnavalizando Mário de Andrade, o berço do samba, o poeta e o herói na Pauliceia Desvairada (2018)

Compositores: Dennis Patolino, Guilherme Garoa e Victor 7 / Interprete: Edson Feliciano Marcondes Nego

Do Verde e Branco não me separarei

Barra Funda, celeiro de bambas
É comunidade, hein
Alô, povão, agora é sério
Canta, canta, Camisa Verde
Segura

E hoje a mais querida
De braços dados com o poeta na avenida
Ilustre filho deste chão
Estrela do meu pavilhão

Eu sou Camisa, celeiro de bambas
Do berço do samba vem minha raiz
Mário de Andrade reluz em meu manto
100% verde e branco

O trevo é meu talismã
Na força da fé, é quem me guia
Resgatando as memórias do povo
Vamos embarcar na fantasia
Com personagens do poeta brasileiro
Viajo pelo mundo inteiro
Ai, que preguiça, bordão genial
Macunaíma, herói nacional
Voei no tempo onde tudo começou
Pra exaltar a fina flor

Vem ver o batuque do tambor
Vindo do interior, firmou ponto no terreiro
Desse cordão, fiz do samba o ideal
Tetracampeã do carnaval!

Ê, Barra Funda, onde a arte do menino floresceu
Entre notas musicais, poemas e saraus
O movimento modernista aconteceu
Surge um viaduto, é o progresso
Ou será um retrocesso, meu Tietê
E hoje a mais querida
De braços dados com o poeta na avenida
Ilustre filho deste chão
Estrela do meu pavilhão

São Paulo, menino grande (1981)

Compositor e intérprete: Geraldo Filme

São Paulo, menino grande
Cresceu, não pode mais parar
No Pátio do Colégio, quem lhe viu nascer
Um velho ipê parece chorar
Não vejo a sua mãe preta
Na rua com seu pregão
Cafezinho quentinho, sinhô,
Pipoca, pamonha e quentão

Lembrar, deixa-me lembrar
Lalaia lalaia laia

Agora que o menino cresceu
Perdeu sua simplicidade
Não quer mais o seu amor-perfeito
E um cravo vermelho, seu amigo do peito
São Paulo de Anchieta
E de João Ramalho
Onde estão teus boêmios
A sua garoa, cadê seu orvalho?

Negros maravilhosos – Samba-enredo Camisa Verde e Branco (1982)

Compositor: Talismã / Intérprete: Taidão

Achei uma bola de ferro
Presa nela, uma corrente
Tinha um osso de canela
Deu tristeza em minha mente
Esse osso de canela
Veio de outro continente

De jeito nenhum, não é preconceito
Negro ou branco têm direito
Nossa escola não faz distinção de cor
Pra falar sobre esse tema
Foi que surgiu o problema
E o dilema se avizinhou

Ôô, ôô, a nossa escola
Enaltece a negra gente
Que nunca ficou chorando
Sempre viveu cantando, fingindo contente

Negro paga imposto
Negro vai a guerra
Negro ajudou a construir a nossa terra
Temos a pergunta
Não nos leve a mal
Por que só no tríduo de Momo
Que o negro é genial?

Ele é capitão
Ele é general
Poderia ser tantas coisas
Dentro da vida real
Laia laia laia laia laia

Cultura Lira Paulistana

Compositor e intérprete: Itamar Assumpção

Não há, ó gente, ó não
Luar como esse do sertão

Pobre cultura, a ditadura
Pulou fora da política
E como a dita-cuja é craca, é crica
Foi grudar bem na cultura
Nova forma de censura
Pobre cultura, como pode se segura
Mesmo assim, mais um pouquinho
E seu nome será amargura
ruptura, sepultura
Também pudera, coitada, representada
Como se fosse piada
Deus meu, por cada figura
sem compostura
Onde era Ataulfo, Tropicália
Monsueto, Dona Ivone Lara 
Campo em flor
Ficou tiririca pura
Porcaria na cultura tanto bate até que fura
Que droga, merda
Cultura não é uma tchurma
Cultura não é tchop tchura
Cultura não é frescura
Nem é mentira
A brasileira é uma mistura pura
Uma loucura, textura
A brasileira é impura
Mas tem jogo de cintura
Se apura, mistura, não mata, cura
Cultura sabe que existe miséria, existe fartura e partitura
Cultura quase sempre tudo atura
Sabe que a vida tem doce e é dura feito rapadura
Porcaria na cultura tanto bate até que fura
A cultura sabe que existe bravura, agricultura
Ternura, existe êxtase e agrura 
noites escuras
Cultura sabe que existe paúra, botões e abotoaduras
Que existe muita tortura
Cultura sabe que existe cultura
Cultura sabe que existem milhões de outras culturas
Pra ter cultura, tem que ter jogo de cintura

A ditadura pulou fora da política
E como a dita-cuja é craca, é crica
Foi grudar bem na cultura
Nova forma de censura
Pobre cultura
Como pode se segura
Mesmo assim, mais um tiquinho
Coitada, representada
Como se fosse um nada
Deus meu, por cada feiura
Sem compostura
Onde era Pixinguinha, Elizeth, Macalé e o Zé Kéti
Ficou tiririca pura
Só dança da tanajura
Porcaria na cultura tanto bate até que fura
Socorro, Elis Regina  
Baixaria na cultura tanto bate até que fura
Socorro
Porcaria na cultura tanto bate até que fura

Que pop mais pobre, que pop mais pop
Pobre pop

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