Nei Lopes faz show de EP com inéditas, que tem produção de Thiago França

30/08/2023

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Por Rachel Sciré*
Fotos: reprodução Instagram Thiago França e Ierê Ferreira

Diante da trajetória musical e intelectual de Nei Lopes, os 80 anos do compositor, completados em maio de 2022, merecem ser muito celebrados. Esse é o tema do show de lançamento do EP Nei Lopes 80, que será realizado no Sesc Vila Mariana, em 7 de setembro, às 18h. “O Nei nunca foi um artista parado no tempo, apesar de muita gente o classificar como um sambista ‘das antigas’, tradicional”, comenta o músico Thiago França, que assina a produção musical do EP, lançado em meio às comemorações do octagenário.

O trabalho traz cinco composições inéditas, que seguem o tom da criatividade e da categoria do exímio partideiro que é Nei, autor de versos sempre recheados de ironia, reflexão e verve crítica, como na faixa “Partido vacinado”, em parceria com Maia, que evoca os negacionistas da vacina. O EP também dá ao público a alegria de ouvir mais uma parceira entre Wilson Moreira e Nei Lopes, a composição “Sessenta e tal”, feita com Moreira na década de 1970, sobre figuras e lugares do samba nos anos 1960. Vale ressaltar que o encontro de Wilson Moreira e Nei Lopes é de alto quilate na música brasileira, com melodias e versos inigualáveis, como atestam os álbuns fundamentais: A Arte Negra De Wilson Moreira e Nei Lopes (1980) e O Partido muito! alto de Wilson Moreira & Nei Lopes (1985).

Desde que Nei Lopes apareceu como compositor para o mercado fonográfico brasileiro, lançado pela estreante Alcione, em 1972, já são mais de 300 canções gravadas por nomes como Clara Nunes, Elza Soares, Zeca Pagodinho, Grupo Fundo de Quintal, Beth Carvalho.

A carreira musical do artista está centrada no samba e nas expressões que foram amalgamadas na consolidação do gênero, como o jongo, o maxixe, o lundu, passando também por outras musicalidades de influência africana, como o jazz e a música cubana. Afinal, o bamba é um dos mais importantes estudiosos contemporâneos das culturas africanas e afrolatinas, com vasta produção sobre o pensamento africano e brasileiro e sobre as expressões culturais afro-brasileiras, como os livros Bantos, malês e identidade negra (1988), Enciclopédia brasileira da diáspora africana (2004), Partido-alto: samba de bamba (2005), Ifá Lucumí: O resgate da tradição (2020).

Nei tem mais de 40 obras publicadas, que incluem romances, contos, crônicas, poesia, ensaios. É formado em Direito e Ciências Sociais pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde recebeu o título de Doutor Honoris Causa, também agraciado a ele pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

O EP Nei Lopes 80 ainda registra o encontro de Nei com músicos da cena contemporânea, que estarão presentes no Sesc Vila Mariana. Thiago França, que assina a direção musical do show, além de comandar sax e flauta, trouxe o time formado por Rodrigo Campos no cavaquinho e violão, Marcelo Cabral no baixo, Alfredo Castro, Xeina Barros, Sthe Araújo, Pimpa e Samba na percussão, Emerson Bernardes no cavaquinho, Allan Abbadia no trombone, Amilcar Rodrigues no trompete, e Anderson Quevedo no sax barítono.

Leia a seguir a entrevista com França sobre a relação com Nei Lopes, a produção do EP e o show de lançamento em 7/9/23.

Sesc Vila Mariana: Para você, em especial, o que a figura de Nei representa?
Thiago França: O Nei é um dos maiores da nossa história, poucos compositores no Brasil têm a mesma profundidade dele. Sem ser pedante, sem pagar de intelectual, ele dá conta de muitos assuntos em poucas linhas e entrelinhas. Fala do passado sem ser nostálgico e fala do presente com um entendimento de poucos.

Sesc Vila Mariana: Como surgiu o convite para produzir o EP e qual o pensamento que te acompanhou no trabalho?
Thiago França: Na verdade, não foi bem um convite… Um dia, no balcão do Conceição Discos, o Marcus Fernando (produtor do Nei) comentou comigo que não tinha conseguido emplacar nada, nenhum projeto, para os 80 anos do Nei. Eu tenho uma “dívida” com o Nei, foi ele quem me apresentou pro pessoal do Quinteto em Branco e Preto e abriu muitas portas quando voltei pra São Paulo, depois de uma temporada em BH. Então eu me prontifiquei, falei com o Marcus que eu juntava um pessoal aqui em SP e a gente fazia um EP, em parceria com a YB Music.

Sesc Vila Mariana: De modo geral, a sonoridade do EP se assemelha a outras produções de Nei, se relaciona ao tipo de samba que Nei compõe e grava, mas algumas novidades aparecem com elegância e vivacidade, como a guitarra em “Clareia, Iaô” ou o violão em “Surreal Demais”. Como foi promover esse diálogo nos arranjos?

Thiago França: O Nei nunca foi um artista parado no tempo, apesar de muita gente o classificar como um sambista “das antigas”, tradicional. Eu convidei o Kiko Dinucci, o Rodrigo Campos e o Allan Abbadia pra arranjar uma música cada, porque todos nós temos como referência dois discos importantíssimos do Nei em parceria com o Wilson Moreira, A Arte Negra De Wilson Moreira e Nei Lopes (1980) e O Partido muito! alto de Wilson Moreira & Nei Lopes (1985). Ambos apontam para possibilidades sem clichês de se fazer e tocar samba, com instrumentações fragmentadas, sem seguir cartilhas e dogmas. Além disso, o Nei é muito ligado em muitos outros sons de influência africana pra além do samba, então a gente sabia que nenhum desses elementos soaria estranho ou pareceria fora de contexto.

Sesc Vila Mariana: Samba é tradição que se mantém viva, porque se renova, frutifica, ramifica, não é só raiz… É mais ou menos por aí que se dá o encontro de Nei com o time de músicos que o acompanham no EP e no show?
Thiago França: “Tradição” é tudo que está vivo, pulsando, em movimento constante, não é peça de museu. A gente conhece bem a linguagem tradicional, por isso existe essa desenvoltura e malandragem pra brincar com todos esses elementos.

Sesc Vila Mariana: Como será o show no Sesc Vila Mariana? Além das inéditas, o que vai entrar no repertório?
Thiago França: O show vai ter quase todo mundo que participou do EP e, além das 5 músicas, vamos desfilar os clássicos do Nei, aqueles que todo mundo conhece, já cantou em alguma roda de samba, músicas que são sucesso em outras vozes também, que muita gente nem sabe que são do Nei. E vai ser um bandão: 12 músicos no palco, entre cordas, batucada e sopros.

Lançamento do EP Nei Lopes 80
Quinta (7/9), às 18h, no Teatro Antunes Filho (Sesc Vila Mariana)
Ingressos de R$12 (credencial plena) a R$40.
Ingressos à venda no site e nas bilheterias da rede Sesc.

Rachel Sciré é editora web do Sesc Vila Mariana, jornalista e mestra em Filosofia pelo Instituto de Estudos Brasileiros da USP, com dissertação de mestrado pesquisou as figuras dos malandros nos sambas de Germano Mathias e dos bandidos nos raps do Racionais MC’s.

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