Sesc SP

postado em 16/07/2014

Estética cinematográfica

Esboço para o filme <em>Castelo Rá-Tim-Bum</em>. Direção de arte: Clóvis Bueno e Vera Hamburger
Esboço para o filme Castelo Rá-Tim-Bum. Direção de arte: Clóvis Bueno e Vera Hamburger

      


Vera Hamburger mapeia o trabalho do diretor de arte e apresenta os profissionais que ajudaram a definir esta atividade no país

 

O sucesso de um filme depende basicamente da inteligência, da sensibilidade e da capacidade técnica de três profissionais: o diretor, o diretor de fotografia e o diretor de arte. Se as duas primeiras funções são mais conhecidas, a terceira – tão essencial quanto as outras – não goza do mesmo status. Dificilmente o público consegue identificar com clareza de que modo um diretor de arte contribui para a qualidade de uma criação cinematográfica. O conceito de direção de arte em cinema surgiu no final dos anos 1930 por exigência do produtor de E o vento levou, David O. Selznick, que desejava concentrar nas mãos de um único indivíduo todo e qualquer aspecto ligado à unidade visual do espetáculo.

Resultado de uma sólida pesquisa sobre o papel e a abrangência da direção de arte na produção audiovisual contemporânea, o livro Arte em cena: a direção de arte no cinema brasileiro, de autoria da cenógrafa e diretora de arte Vera Hamburger, vem preencher uma importante lacuna no mercado editorial brasileiro – ainda bastante carente de títulos dessa natureza. O projeto editorial, a cargo da Editora Senac São Paulo em parceria com as Edições Sesc São Paulo, transformou a pesquisa original em um conjunto de textos e imagens denso e atraentemente articulado, acolhido por um projeto gráfico arrojado, funcional e de expressiva beleza. 

Profissional respeitada e premiada, Vera Hamburger deu vazão no livro à sua vocação de educadora, organizando uma obra que se divide em dois focos complementares. A primeira parte da obra discute, de forma didática, os principais conceitos envolvidos na construção da visualidade e espacialidade cinematográficas, as fases de um projeto e os parâmetros de convivência de uma equipe de trabalho. Já a segunda parte apresenta a trajetória de quatro diretores de arte com extensa atuação no cinema brasileiro: Pierino Massenzi, Clóvis Bueno, Marcos Flaksman e Adrian Cooper.

O projeto nasceu não somente de uma necessidade pessoal da autora de compreender a amplitude de sua própria atividade profissional, diante da escassa bibliografia e dos raros cursos específicos sobre o tema, como também do sentimento de que, mesmo no meio profissional ou na percepção da obra cinematográfica por parte do espectador, muitas vezes não há clareza sobre a participação e a influência da direção de arte na concepção e na realização dos filmes. A partir do estudo histórico e da análise sobre a prática da direção de arte e cenografia, o livro discute a atividade como elemento essencial à realização cinematográfica. São objetos de reflexão do livro: as principais matérias e os instrumentos implicados em sua elaboração, o processo de criação e o desenvolvimento dos projetos, os aspectos da organização da equipe e as relações que se estabelecem entre os profissionais envolvidos em sua realização.

Uma vez apresentados e discutidos os temas e os conceitos essenciais, a obra muda de foco e apresenta os depoimentos de quatro experientes cenógrafos e diretores de arte da atualidade, por meio dos quais se delineiam importantes momentos da evolução da atividade no Brasil. As etapas de criação e realização de vários projetos cenográficos e artísticos são ilustradas por desenhos, croquis e fotografias, revelando desafios e soluções encontradas por esses profissionais. Inicialmente, Pierino Massenzi, um dos mais experientes cenógrafos da fase áurea dos grandes estúdios (atuante entre os anos 1950 e fim dos anos 1960, principalmente nos estúdios da Companhia Cinematográfica Vera Cruz), traça em seu depoimento um painel da atividade no período anterior à adoção da direção de arte em nossas produções. Logo em seguida, três artistas de destaque em realizações brasileiras recentes completam o panorama: Clóvis Bueno, Marcos Flaksman e Adrian Cooper. Profissionais da mesma geração, de grande influência nas discussões sobre o papel e a amplitude da atividade, os três oferecem visões ora complementares ora dissonantes sobre a vivência cinematográfica. As entrevistas foram editadas em forma de depoimentos e ilustradas pelo material produzido durante o processo de criação e realização de projetos selecionados. Ao excluir as perguntas ao entrevistado, Vera Hamburger pretende garantir a fluidez das ideias e das considerações próprias de cada profissional, revelando suas trajetórias pessoais. Desenhos, maquetes, fotografias de locação, de construção e de cena – recolhidos nos acervos pessoais dos artistas, cedidos por membros das equipes de produção ou disponíveis em acervos públicos – proporcionam uma visão fascinante tanto do processo de concepção e realização do universo visual dos filmes quanto dos conceitos e metodologia de trabalho adotados por cada autor, além de demonstrar soluções técnicas originais.

Arte em cena: a direção de arte no cinema brasileiro oferece um riquíssimo material não somente para alunos e profissionais de cinema e de produção audiovisual, como também para estudiosos de design, arte e moda, além, naturalmente, de interessar ao público aficionado por cinema em geral. O valor editorial da obra – um guia prático e uma antologia em um único volume – é inestimável. No texto de Vera Hamburger, o amante do cinema encontrará um repertório de procedimentos, glossário técnico e avaliação crítica de projetos muito úteis para enfrentar as agruras do mercado cinematográfico nacional. “Quem são e o que fazem os cenógrafos e diretores de arte de filmes brasileiros” é a instigante pergunta que o livro, com muita sensibilidade, se propõe a responder.  

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