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postado em 29/08/2013

Entrevista prévia de lançamento do CD Ligeti+

728 Foto com mão e violino

Ligeti + é o segundo CD da série que homenageia compositores fundamentais para a música de concerto dos últimos 110 anos. Uma obra fundamental do homenageado é gravada por músicos brasileiros pela primeira vez, e novos criadores partem dessa referência para elaboração de composições inéditas. 

À frente deste projeto está Ricardo Bologna, principal regente da Orquestra Sinfônica da USP, timpanista solista da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) e professor do Departamento de Música da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. O músico também faz parte do Duo Contexto, formado em 1989 com Eduardo Leandro.

Aqui Ricardo conta um pouco da história do Percorso Ensemble – formado por ele, Sérgio Coutinho (percussão), Cassia Carrascoza (flautas), Douglas Kier (violoncelo), Horacio Gouveia (piano), Sergio Burgani (clarineta), Simona Cavuoto (violino) – além de contextualizar a série + e em especial o compositor homenageado da vez: Györgi Ligeti (1923 – 2006).

Você poderia falar um pouco sobre o Percorso Ensemble e as possibilidades de formação?
Ricardo Bologna: O Percorso Ensemble foi um grupo que eu criei em 2002, que tem sempre o núcleo fixo de músicos. Dependendo do projeto e do repertório isso se amplia. No caso do CD Ligeti +, é um projeto que tem mais gente, são 14 pessoas me incluindo. A peça Kammerkonzert, para 13 instrumentistas, serviu de base para a formação, então a gente pensou em fazer o CD com outras peças para 13 músicos ou menos. A peça do Marcus Siqueira tem 8 músicos e a peça do Cláudio de Freitas tem 13, a mesma formação que o Ligeti escreveu.

O que é e como surgiu a ideia da série +?
RB: É uma ideia bem simples: a possibilidade de gravar uma peça de um compositor famoso da música contemporânea, da música moderna, da música do século XX, de hoje, e convidar compositores brasileiros pra escrever uma peça de certa forma inspirada nessa obra referência, nessa obra importante do século XX. Por isso a série se chama +, você tem um compositor X e o + que é “mais os outros”, que participam do CD e que se inspiram de certa forma nesse compositor central. Dessa forma você divulga uma obra importante da música mundial e ao mesmo tempo você cria novas peças, então é uma forma de incentivar a produção musical brasileira também.

Qual é a importância de destacar a obra do Ligeti? E por que a escolha desse autor neste momento?
RB: Se a gente pudesse listar os dez compositores mais importantes do século XX, ele estaria entre estes 10 com certeza. Então é pela importância dele na história da música, é pelo que ele criou em termos sonoros, um compositor que enveredou por uma técnica de composição totalmente diferente do que se fazia nos anos 50, 60 que foi a época que ele começou a atuar mais. Pierre Boulez, Stockhausen, todos estes seguiam uma linha determinada em termos de composição musical e o Ligeti saiu dessa linha, ele criou sua própria linguagem, que era um pouco independente de certa forma.

Como foi a escolha do repertório? Por que a escolha de Marcus Siqueira e Claudio de Freitas para compor inspirados na obra de Ligeti?
RB: Então, Kammerkonzert foi escolhida por ser uma peça não tão grande, para que fosse possível fazermos o projeto. E eu pensei em dois compositores brasileiros que são muito diferentes um do outro, completamente diferentes. Um é o Marcus Siqueira, que tem também uma linha própria composicional e que escreveu uma música em que ele realiza uma espécie de colagem de obras do próprio Ligeti com elementos de outro compositor que o Ligeti adorava, chamado Colon Nancarrow. Nancarrow, um mexicano e americano, viveu no México muito tempo e foi um compositor que ficou meio obscuro na história da música, ninguém sabia dele, ele era uma pessoa que vivia reclusa e que não era muito divulgada. Ele escrevia para um instrumento mecânico chamado pianola, que tocava sozinho, eram coisas tão difíceis que nenhum ser humano conseguia tocar. Ligeti se apaixonou por este tipo de música e muitas coisas que ele escreveu são inspiradas no Colon Nancarrow. Então o Marcus Siqueira pegou o Györgi Ligeti e o Colon Nancarrow e fez uma colagem, então é uma composição muito própria, muito específica. É uma homenagem aos dois compositores.

E o Cláudio de Freitas é totalmente diferente do Marcus, é um compositor de uma estética mais orquestral, não é um compositor que segue as estéticas em voga dentro da música contemporânea, é totalmente independente, outsider, com uma linguagem própria, que mescla um pouco de elementos novos com elementos mais antigos da música.

Escolhi dois brasileiros que fossem bem diferentes um do outro e o Ligeti no meio, centralizando.

Falar um pouco sobre a importância da produção contemporânea brasileira.
RB: Se você não divulga as obras dos compositores daqui do país, você nunca vai incentivar que eles escrevam. Essa relação entre intérprete e compositor tem que ser bem estreita. Uma das coisas boas da música contemporânea é que o compositor está vivo, você pode conversar com ele. Isso é uma coisa que os compositores de antigamente faziam, Beethoven, por exemplo, com certeza conversava com um monte de gente que tocava a música dele e perguntava um monte de coisa, em termos de funcionalidade da música (o que funciona, o que não funciona). Essa dinâmica “compositor intérprete” é muito importante. Então se a gente toca as músicas dos compositores brasileiros, a gente está incentivando esse diálogo, e ao mesmo tempo fazendo com que eles escrevam cada vez mais. Por outro lado também a divulgação: se você faz menos música contemporânea, ninguém vai ouvir. Já tem tão poucas pessoas que ouvem, teria menos ainda. Um monte de gente ouve música contemporânea e “ai meu Deus, que coisa horrível”, tem que ter o hábito de ouvir, tem que ter os ouvidos abertos. Então se tem mais gente fazendo mais coisas, o público vai ter um pouco mais de chance de absorver este tipo de música, vai ter mais chance de entrar em contato com este tipo de universo sonoro que é difícil mesmo.

Falar sobre músicos que participarão do concerto do dia 04/09.
RB: Com exceção de três músicos, serão os mesmos que gravaram o CD. As participações especiais serão de Karin Fernandes, que vai tocar piano (substituindo Horácio Gouveia), Dana Radu, que vai tocar cravo (substituindo Lucia Cervini), Amanda Martins que vai tocar o segundo violino (substituindo Ana de Oliveira). Estas três são convidadas porque os três que gravaram não poderão.

Falar sobre a expectativa para o lançamento.
RB: O ponto principal desse projeto é que o grupo conseguiu gravar uma das peças mais importantes de música contemporânea (que não é mais contemporânea, é dos anos 70, de música moderna, do século XX). É como se você pegasse uma orquestra e gravasse uma sinfonia de Brahms, por exemplo.

Ao mesmo tempo que é uma ousadia, o resultado sonoro foi muito bom. Ulrich Schneider, que foi o produtor musical, ficou maravilhado com o resultado, ele falou que foi um resultado esplendoroso, realmente nível internacional, nível semelhante aos das outras gravações desta peça (que são poucas, cerca de 4 ou 5 apenas). A expectativa para o lançamento é muito grande, espero que as pessoas gostem, espero que elas ouçam, mesmo as pessoas que não estão acostumadas, que possam pegar e colocar um CD deste em casa e ficar ouvindo.

 

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