Artista igual Trabalhadora: histórias, dados e perspectivas sobre as mulheres nos palcos brasileiros

14/07/2025

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A indústria musical brasileira nasceu e se desenvolveu em um contexto social excludente, moldado por uma elite que se consolidou no Rio de Janeiro durante o período da capital imperial e, posteriormente, da capital federal. Esse ambiente não apenas definiu os rumos do mercado fonográfico na virada do século XIX para o XX, mas também instituiu padrões rígidos de participação que historicamente marginalizaram as mulheres — especialmente as mulheres negras — nos espaços de produção e protagonismo musical. As dinâmicas de poder da época criaram barreiras sistemáticas de gênero e raça, materializadas em leis, práticas sociais e padrões culturais que limitaram severamente a atuação profissional feminina.

Com o advento do negócio fonográfico, do rádio e, mais tarde, da televisão, o mercado de entretenimento passou a refletir e reforçar essa estrutura de exclusão. As escolhas sobre quem ocupava os palcos e os estúdios não eram neutras; seguiam a lógica de uma elite que determinava os contornos culturais, morais e econômicos do país. Assim, a música brasileira nunca esteve dissociada das relações históricas e sociais que moldaram sua indústria.

Compreender essa trajetória é essencial para enxergar como e por que as desigualdades de gênero e raça ainda estruturam o cenário musical contemporâneo. Conquistas como a licença-maternidade, a igualdade salarial e a regulamentação das jornadas de trabalho — frutos das lutas feministas e operárias — impactaram a vida das mulheres na música, mas não foram suficientes para romper o domínio masculino e branco nos espaços de maior visibilidade e poder decisório.

Dados recentes, como o relatório “Mulheres nos Festivais: quem ocupa os palcos brasileiros? Um estudo quantitativo (2016-2024)” (LIMA ARRUDA, 2025), evidenciam essa desigualdade ao mostrar a persistente sub-representação feminina nos festivais de música. Em outros países da América Latina, essa realidade tem levado à implementação de políticas públicas para corrigir disparidades nos palcos e na indústria musical. Embora essas iniciativas tenham trazido avanços importantes, os desafios para sua efetivação e alcance ainda são numerosos.

Apesar dessas múltiplas barreiras, as mulheres continuam se mobilizando para criar seus próprios espaços de expressão e resistência, desafiando as estruturas que insistem em limitá-las.

Histórias

Ao analisar a trajetória de artistas mulheres que atuaram profissionalmente no emergente mercado de entretenimento carioca na primeira metade do século XX, percebe-se que um dos principais fatores que cercearam suas carreiras foi o casamento e a instituição familiar. Figuras como Chiquinha Gonzaga, Lucília Villa-Lobos, Aracy Cortes, Dalva de Oliveira, Maysa, Elza Soares e tantas outras enfrentaram, cada uma a seu modo, as limitações impostas por esses dispositivos sociais. Embora suas histórias envolvam marcadores sociais distintos, a pressão para que as mulheres priorizassem a família em detrimento da vida artística foi uma constante, moldando suas trajetórias e a forma como eram percebidas publicamente.

Essa estrutura de controle sobre a atuação feminina não surgiu ao acaso. No século XIX, com a chegada da família real portuguesa, o processo de independência, o crescimento da economia cafeeira e a ampliação das cidades, as mulheres começaram a ganhar mais visibilidade. No entanto, Igreja e Estado reforçavam a ideia de que seu papel deveria estar restrito ao espaço doméstico. Embora pudessem exercer certa autoridade dentro de casa, essa influência raramente ultrapassava os limites do ambiente privado. Além disso, a forma como essa dinâmica se manifestava variava conforme a posição social e a origem das mulheres – havia diferenças significativas entre casadas, solteiras, trabalhadoras, concubinas e, claro, mulheres negras ou mestiças. A noção de privacidade, importada da Europa, ajudou a consolidar as fronteiras entre o público e o privado, reforçando o confinamento feminino.

Nas páginas de jornais e revistas da época, o modelo ideal de mulher era constantemente reforçado: a dona de casa exemplar, educadora dedicada e habilidosa em atividades como o bordado. Entre as elites, esperava-se também que dominassem certas expressões artísticas, como o canto e o piano. O instrumento tornou-se símbolo na segunda metade do século XIX, marcando presença não apenas nos salões das famílias abastadas, mas também em teatros, cafés e cabarés. No Rio de Janeiro, tamanha era sua importância que a cidade chegou a ser apelidada de “Pianópolis”, evidenciando como a música, ainda que considerada uma habilidade desejável, raramente era vista como um caminho legítimo para a profissionalização feminina.

As mulheres e o negócio fonográfico

O início da indústria fonográfica no Brasil ocorreu com a fundação da Casa Edison, em 1900 (TINHORÃO, 1981). Antes disso, seu fundador, o tcheco-brasileiro Frederico Figner já comercializava fonógrafos e cilindros. A partir de 1902, com as primeiras gravações brasileiras, consolidou-se um mercado que marcou a transição do comércio de partituras para a produção fonográfica, trazendo novas dinâmicas à profissionalização da música e redefinindo as possibilidades de atuação dos artistas.

Chiquinha Gonzaga exemplifica como, mesmo em um contexto de exclusão e marginalização, algumas mulheres conseguiram se destacar – embora com grandes sacrifícios. No final do século XIX, ela já era uma compositora reconhecida e vendedora de partituras. Em 1877, publicou sua primeira composição, Atraente.

Jornal do Commercio, 1877. Fonte: Hemeroteca Digital/Biblioteca Nacional Digital.

No anúncio de Atraente, publicado no Jornal do Commercio (1877), Chiquinha foi descrita como “amadora”, um termo que, na época, não apenas indicava a ausência de remuneração, mas também refletia uma hierarquia de gênero. Como observa Simioni (2015, p. 37), a categoria “amadora” se opunha diretamente à de “artista profissional”, uma posição predominantemente masculina. Enquanto os homens podiam fazer da música sua profissão, as mulheres, mesmo as mais talentosas, eram muitas vezes restritas ao ambiente doméstico, onde suas produções serviam mais como entretenimento familiar ou símbolo de status do que como expressão artística legítima.

Esse quadro era reforçado pelo ensino musical nas classes altas, que incentivava a prática instrumental, mas sem abrir espaço para a profissionalização feminina. O investimento educacional impulsionava o mercado editorial de partituras, ao mesmo tempo em que reforçava a ideia de que a música feita por mulheres deveria se restringir ao lar. Assim, a circulação da obra de Chiquinha Gonzaga e de outras compositoras era severamente limitada por essas barreiras simbólicas e institucionais.

Além disso, a imprensa frequentemente priorizava aspectos pessoais e físicos das artistas em detrimento de suas habilidades técnicas e do valor cultural de suas obras. A pesquisa de Souza (2015) identificou que, em 54 das 83 notícias sobre mulheres atuando musicalmente, os jornais destacavam atributos físicos e morais, frequentemente associando-as a estereótipos de fragilidade ou limitação intelectual. Esse tratamento também se refletia na ausência de registros formais sobre suas produções. Embora os periódicos mencionassem suas apresentações, a historiografia da música, dominada por homens, muitas vezes ignorava ou minimizava suas contribuições, fazendo com que muitas compositoras permanecessem desconhecidas, não por falta de produção, mas pela escassez de documentação.

Freire (2012) observa que a atuação como cantora, apesar de intensa, nem sempre era bem-vista pela sociedade. A exposição feminina nos palcos gerava receio, e atrizes e cantoras eram frequentemente vistas com desconfiança. Esse fenômeno não se restringia ao Brasil: em diversos países, as cantoras eram mais numerosas entre as musicistas justamente porque outras práticas musicais eram ainda mais restritas às mulheres.

Mesmo com essas limitações, as mulheres encontraram maneiras de atuar profissionalmente. Embora o teatro fosse um ambiente cercado de preconceitos, a pesquisa de Souza (2015) revela que a maioria das apresentações femininas ocorria nesses espaços, demonstrando que as restrições sociais, embora limitantes, não impediram sua inserção. Esse processo de inclusão gradual das mulheres nos palcos continuou ao longo do século XX. Souza (2015) aponta que figuras como Josefina Robledo e Dinorah de Carvalho ampliaram o espaço feminino na música, evidenciando que, apesar da lentidão, as mudanças ajudaram a transformar a identidade cultural da mulher musicista.

A imposição de padrões morais e estéticos ao longo da história moldou a maneira como a sociedade e a imprensa viam a presença feminina em espaços culturais emergentes, como teatros e rádios. Chiquinha Gonzaga é um exemplo claro dessa dinâmica. Em 1877, ano de sua primeira composição, ela enfrentou uma separação conturbada, sendo acusada de adultério e abandono do lar. Sua vida privada foi amplamente discutida, muitas vezes ofuscando sua produção artística. Esse foco na esfera pessoal das mulheres refletia uma sociedade que não apenas impunha limites ao seu campo profissional, mas também exercia um rigoroso controle sobre sua moralidade e comportamento, tornando sua atuação pública uma questão de constante vigilância.

Moralidade, legislação e os desafios das artistas

A trajetória das mulheres na música e no mercado cultural, como exemplificado pela luta de Chiquinha Gonzaga, não pode ser analisada sem considerar o contexto social e as restrições jurídicas que marcaram suas vidas. A sociedade brasileira da época, fortemente influenciada por uma moral rígida e patriarcal, impunha limites não apenas às escolhas profissionais das mulheres, mas também à sua liberdade social e econômica. A força de trabalho feminina — especialmente entre mulheres brancas pobres e negras — já era significativa em diversas áreas da economia, mas essas trabalhadoras enfrentavam desvalorização tanto no mercado de trabalho quanto nas esferas culturais.

Em 1872, as mulheres representavam 72% da força de trabalho assalariada nas fábricas, mas esse percentual caiu drasticamente ao longo do tempo. A partir de 1950, elas ocupavam apenas 23% dos postos de trabalho assalariados. Como aponta Maria Valéria Juno Pena, essa redução não ocorreu por acaso: foi resultado de políticas públicas e normas jurídicas que, longe de garantir igualdade, restringiram as oportunidades para as mulheres.

Um dos marcos dessa mudança foi o Decreto do Trabalho das Mulheres, aprovado em 1932. Embora a legislação estabelecesse direitos como igualdade salarial e licença-maternidade, na prática, ela afastou as mulheres do mercado formal. Empresários e donos de fábricas passaram a enxergar a contratação feminina como onerosa devido aos custos associados à maternidade, tornando a mão de obra masculina mais vantajosa. Como destaca Maria Valéria Juno Pena, o decreto, em vez de ampliar oportunidades, reforçou barreiras à inserção feminina.

A moralidade também permeava as leis da época. O próprio Decreto do Trabalho das Mulheres carregava uma dimensão moralista, exigindo que as mulheres adotassem condutas que garantissem seu respeito social e o direito à vida privada. Como afirmou o jurista Viveiros de Castro: “É geralmente reconhecido que a mulher nasceu exclusivamente para o lar; governar uma casa é sua função normal.” Para atuar fora desse espaço — seja no rádio, no teatro ou nos cassinos —, as mulheres precisavam se adequar a códigos morais específicos, sob o risco de serem vistas como ameaça à ordem social.

Muitas artistas enfrentaram a vigilância moral e as limitações impostas às mulheres. Aracy Cortes, nascida Zilda de Carvalho Espíndola, cresceu em uma família pobre e começou sua trajetória no teatro amador e no circo, encontrando na cultura popular um espaço de formação e trabalho. Nos anos 1920 e 1930, tornou-se uma das principais intérpretes do teatro de revista e da música popular brasileira, contribuindo para a consolidação do samba e do maxixe. No entanto, sua presença nos palcos foi marcada pelo estigma da “mulata”, uma construção da imprensa e do teatro que associava mulheres mestiças à sensualidade e ao exotismo. Mesmo sendo pioneira, sua imagem foi constantemente limitada por estereótipos raciais e sexuais, reforçando a ideia de que, para estar no palco, a mulher precisava corresponder a um ideal corporal e comportamental alinhado ao nacionalismo da época.

Caricatura de Aracy Cortes, desenhada por Alceu Pena, em 1928.

Nos anos 1940, Dalva de Oliveira, integrante do Trio de Ouro ao lado de Herivelto Martins e Nilo Chagas, destacou-se como uma das grandes vozes do rádio. No entanto, após o fim de seu casamento com Herivelto, sua vida pessoal foi transformada em um espetáculo público, explorado pela imprensa e pelos programas de auditório da época. O casal protagonizou um duelo musical que se tornou pauta constante nos jornais, alimentando um enredo de acusações e ressentimentos. Nas canções, Dalva ora assumia a culpa pelos deslizes, como em Errei, Sim, ora expressava a dor da separação em Que Será. Herivelto, por sua vez, utilizava a música para reforçar sua versão da história, ressentido não apenas com a ex-esposa, mas também com os compositores que passaram a apoiá-la.

A disputa não se restringiu ao rádio. Em 1951, o jornal Diário da Noite publicou uma série de 22 artigos intitulada Porque Abandonei Dalva de Oliveira, assinada por Herivelto Martins, mas escrita com a ajuda do jornalista David Nasser. Nos textos, Dalva era retratada como uma mulher descontrolada e moralmente condenável, sendo chamada de “rainha do despudor” e “Messalina do século XX”. Os supostos adultérios que poderiam ter ficado no âmbito privado foram transformados em peças públicas, reforçando um discurso de punição a mulheres que transgrediam normas de gênero.

Além do julgamento moral, há um dado frequentemente silenciado na história oficial: antes de solicitar o desquite, Dalva foi vítima de violência doméstica e presenciou inúmeras traições do ex-marido. Ainda assim, foi ela quem carregou o peso do escândalo e teve sua imagem vilanizada pela imprensa. Enquanto Dalva se reerguia e conquistava sucesso em sua carreira solo, Herivelto via seu prestígio diminuir. A partir do final de 1950, os ataques diretos tornaram-se mais espaçados, e a batalha pública chegou ao fim. No entanto, o episódio ilustra como os códigos de moralidade sempre recaíram de maneira desproporcional sobre as mulheres, transformando conflitos privados em escândalos midiáticos e reforçando estereótipos que as limitavam social e profissionalmente.

As trajetórias de Aracy e Dalva ilustram como a presença feminina no cenário artístico era atravessada pela vigilância moral e pelo controle social. Além disso, a legislação impunha restrições diretas à autonomia das mulheres, reforçando desigualdades e limitando suas possibilidades de atuação profissional. Durante boa parte do século XX, a mulher casada era considerada relativamente incapaz perante a lei, dependendo da autorização do marido para trabalhar, aceitar heranças ou viajar — uma limitação jurídica estabelecida pelo Código Civil de 1916 (Lei nº 3.071/1916), que vigorou até 2002.

O ordenamento jurídico também perpetuava a violência de gênero. Até 1916, as normas herdadas das Ordenações Filipinas permitiam que o marido aplicasse castigos físicos à esposa e, em casos de suspeita de adultério, chegasse ao extremo de tirar-lhe a vida sem que isso fosse considerado crime. No mercado de trabalho, restrições específicas reforçavam a exclusão das mulheres. O Decreto nº 21.417-A, de 1932, por exemplo, proibia o trabalho feminino em estabelecimentos industriais e comerciais entre 22h e 5h. Para muitas artistas, isso significava a impossibilidade de atuar em determinados palcos e estúdios no horário de maior efervescência cultural e profissional. Somadas às normas que restringiam a autonomia feminina no casamento e legitimavam punições violentas sob pretextos morais, essas leis não apenas limitavam a presença das mulheres no mercado de trabalho, mas também reforçavam a vigilância sobre suas vidas e escolhas.

Dados

A presença das mulheres nos palcos reflete a trajetória de desafios históricos, barreiras estruturais e lutas por reconhecimento discutidas até aqui. Embora a figura da cantora tenha se tornado mais visível ao longo do tempo, isso não significa equidade. Os festivais ainda espelham desigualdades persistentes, como evidenciam os dados mais recentes.

Em um estudo realizado pela plataforma chilena Ruidosa, que analisou 66 festivais na América Latina entre 2016 e 2018, a participação de mulheres solistas ou bandas exclusivamente femininas não ultrapassou 10% do total de atrações artísticas. Em 2016, esse número foi de 9,1%, em 2017, 10% e em 2018, 10,1%. Quando se consideram as bandas mistas, a representatividade feminina sobe para cerca de 23%, mas ainda assim a predominância masculina nos palcos é evidente. Esses dados ressaltam a urgência de políticas públicas que promovam a equidade de gênero na música.

No Brasil, a pesquisa “Mulheres nos Festivais: quem ocupa os palcos brasileiros?” (LIMA ARRUDA, 2025) apresenta dados alarmantes sobre a desigualdade nos principais festivais do país. Esse estudo, o terceiro publicado (os anteriores datam de 2019 e 2020), é fruto do trabalho desta autora e foi publicado na Zumbido. Desde a primeira edição, os números mostram uma realidade imutável, na qual a participação feminina continua distante da equidade.

Em 2024, a participação de atos musicais compostos exclusivamente por mulheres, ou seja, bandas e solistas, foi de 35,6% nos 29 festivais analisados. Entre esses festivais, alguns se destacaram por uma representatividade feminina mais expressiva. O CarnaUOL São Paulo e o No Ar Coquetel Molotov lideraram, com 57,1% de participação feminina, seguidos pelo Suíça Bahiana (54,5%) e o CoMA (53,2%). Festivais como Sarará (50%) e Rec-Beat Festival (47,8%) também registraram percentuais significativos, destacando um avanço, embora ainda insuficiente diante da realidade geral.

No entanto, muitos festivais continuam a perpetuar padrões históricos de exclusão. Em 2024, o Abril Pro Rock não contou com nenhuma mulher em sua programação, enquanto o Planeta Atlântida teve apenas 12,1% de participação feminina. O STL Festival (16,7%), o Vaca Amarela (18,9%), o Goiânia Noise (20%) e o Rock in Rio (30,4%) também ficaram aquém da equidade de gênero, apontando que, apesar de alguns avanços, a participação feminina ainda é marginalizada no circuito musical brasileiro.

Esses dados alarmantes reforçam a necessidade urgente de políticas públicas que garantam a igualdade de oportunidades para as mulheres na música, transformando a representatividade em uma realidade e não em uma exceção.

Perspectivas

O presente é coletivo

Os dados apresentados são alarmantes e devem ser encarados não apenas como uma reflexão, mas também como um chamado à ação. Com base nesse diagnóstico, é possível identificar as desigualdades e, ao mesmo tempo, buscar soluções. Não existe um único caminho para promover a equidade de gênero na música; no entanto, por meio do trabalho coletivo, da mobilização do setor e da comunidade, e levando em consideração as particularidades de cada território, podemos gerar novas perspectivas.

Iniciativas que criam espaços no cenário musical são fundamentais. Elas proporcionam ambientes seguros para meninas e mulheres se expressarem, aprenderem e se fortalecerem artisticamente. Mais do que isso, reforçam a música como uma profissão viável e fomentam a troca de experiências, formando redes de apoio essenciais para o desenvolvimento de mais mulheres e pessoas LGBTQIAP+ em um setor desigual.

Projetos como o Girls Rock Camp Brasil e o Hi Hat Girls exemplificam essas iniciativas transformadoras, oferecendo oportunidades de expressão e aprendizado. A seguir, vamos explorar como essas e outras ações têm contribuído para mudar o panorama musical e fortalecer a presença de mulheres e pessoas LGBTQIAP+ na indústria.

Girls Rock Camp Brasil

Flávia Biggs teve seu primeiro contato com o Rock’n’Roll Camp for Girls, em Portland, durante uma turnê pelos EUA com a banda Haggard. Uma das integrantes da banda fazia parte da diretoria do camp, o que a levou a conhecer o projeto de perto. Ao retornar ao Brasil, em 2005, já formada em Sociologia e com experiência como educadora e guitarrista, Flávia se voluntariou no camp, desempenhando funções como produtora e instrutora. Essa experiência foi crucial para ela perceber a importância do camp, tanto na criação de uma rede de apoio quanto no empoderamento de meninas e mulheres.

Em sua cidade natal, Sorocaba, Flávia iniciou a primeira semente do Girls Rock Camp Brasil com a Oficina de Guitarra para Meninas. O projeto cresceu e, em 2013, realizou a primeira edição do GRCB, tornando-se o primeiro camp na América do Sul a replicar o modelo do Rock’n’Roll Camp for Girls. Durante uma semana, 60 meninas, com idades entre 7 e 17 anos, aprendem a tocar instrumentos, formam bandas, compõem músicas e se apresentam. Além das aulas de música, elas participam de atividades como expressão corporal, serigrafia, composição, fanzines, defesa pessoal e imagem, entre outras.

O objetivo não é formar artistas em uma semana, mas fortalecer a autoconfiança das participantes. Flávia acredita que o camp, além de melhorar a autoestima, promove um ambiente de sororidade, incentivando a colaboração e o apoio mútuo. Muitas meninas chegam tímidas e sem experiência musical, mas ao final da semana, saem com novas amizades e a confiança necessária para se expressar artisticamente. A metodologia de ensino, baseada no “faça você mesma” (DIY), permite que, mesmo sem conhecimento prévio, as participantes toquem ao vivo. O GRCB também desafia as meninas a explorarem suas identidades e potencialidades, tanto como mulheres quanto como artistas.

O projeto é realizado pelas mãos e mentes de pessoas voluntárias, sempre em janeiro. Em julho, acontece o projeto derivado, o Liberta Rock Camp, nos mesmos moldes do GRCB, mas destinado a mulheres e dissidências com mais de 21 anos.

Hi Hat Girls

O Hi Hat Girls foi criado para incentivar mulheres a tocarem bateria, oferecendo oficinas em várias cidades do Brasil. O projeto dá oportunidade tanto para iniciantes quanto para aquelas que já têm experiência, permitindo o aprofundamento de seus conhecimentos. Além disso, o Hi Hat Girls se destacou ao lançar a primeira revista voltada para mulheres bateristas na América Latina, quebrando um importante tabu na cena musical.

Inicialmente uma revista digital, entre 2012 e 2016, o projeto evoluiu em 2016 para as “Oficinas de Bateria para Garotas”, que seguem acontecendo em sete cidades do Brasil. As fundadoras, Julie Sousa e Lary Durante, ministram as oficinas e já impactaram mais de 1.000 mulheres. O Hi Hat Girls é reconhecido por instituições como a Comissão de Cultura da ALERJ, British Council, Oi Futuro e Instituto Ekloos.

As oficinas começam com uma introdução básica à bateria, onde as participantes aprendem sobre o instrumento e a maneira correta de segurar as baquetas. Após a introdução, elas praticam os exercícios e têm a chance de tocar na bateria sob a orientação das instrutoras. O principal objetivo do Hi Hat Girls não é apenas ensinar a técnica, mas também fortalecer a confiança das mulheres, quebrando a ideia de que não são capazes. Julie e Lary querem que as participantes saiam das oficinas não só com habilidades musicais, mas com a certeza de que têm o direito de ocupar esse espaço.

Por mais mulheres nos festivais: a Ley de Cupo

A criação de espaços e iniciativas para a inclusão das mulheres na música é apenas uma das abordagens necessárias para combater as desigualdades de gênero na indústria. No entanto, mudanças estruturais exigem políticas públicas que atuem de maneira direta e significativa. Quando bem direcionada, a legislação tem o poder de gerar impactos concretos e duradouros.

A Ley de Cupo en Eventos Musicales na Argentina, sancionada em 2019, é um exemplo desse potencial de transformação. Ao estabelecer uma cota mínima de 30% de participação feminina em eventos ao vivo, a lei consolidou conquistas históricas de uma mobilização coletiva protagonizada por mulheres do setor musical, como destaca Charo Bogarín, vice-presidenta do INAMU (Instituto Nacional de la Música): “A Lei de Cotas começou a partir das reclamações e debates de artistas mulheres e de identidades diversas nas redes sociais, na primavera de 2017”.

Sua implementação, fruto do diálogo entre artistas, pesquisadoras, associações e gestores públicos, evidencia as disparidades históricas e inspira propostas semelhantes em outros países latino-americanos.

Do protesto à criação da lei

O contexto da Ley de Cupo foi marcado pelos movimentos “Ni Una Menos” e pelos debates sociais feministas da década passada. Nessas mobilizações, as mulheres do setor musical passaram a questionar, documentar e expor a quase ausência de artistas femininas nos principais festivais do país. Como relata Charo, “no ano seguinte [2018] e até a apresentação do projeto, foi realizada uma pesquisa muito abrangente sobre os eventos nas seis regiões culturais da Argentina, que gerou dados sólidos e incontestáveis”.

Foi nesse cenário que a pianista e compositora Elbi Olalla se destacou ao propor publicamente uma cota mínima para a participação feminina em line-ups de eventos musicais, catalisando o debate. Sua sugestão rapidamente ecoou entre artistas de diferentes regiões e estilos, culminando na articulação do movimento XMásMúsicasMujeresEnVivo, que buscou unir a reivindicação social à produção de dados concretos.

A pesquisa fundamental para embasar o projeto foi conduzida pelas pesquisadoras e musicistas Celsa Mel Gowland e Alcira Garido, que realizaram um levantamento detalhado da participação de mulheres em 47 dos maiores festivais da Argentina. Os resultados evidenciaram a disparidade existente e forneceram as bases necessárias para convencer gestores, associações empresariais da música e o próprio Congresso sobre a urgência de uma resposta legislativa.

Charo observa que estudos anteriores, como o da Ruidosa, foram fundamentais como alerta e lembra: “Se realmente queríamos mudar a realidade, seria preciso uma lei baseada em um estudo muito mais amplo.” Assim, foi a própria organização das mulheres e a aliança com mais de 30 associações civis espalhadas pelo país que deu voz e força ao projeto, garantindo sua apresentação e aprovação no Congresso.

O movimento deixou de ser apenas um protesto: estruturou-se, produziu dados inéditos e estabeleceu, pela primeira vez, um diálogo construtivo com diferentes atores do mercado musical e do cenário político argentino. Segundo Charo, “a participação e organização das mulheres e artistas diversas foi fundamental porque partiu delas e de suas pesquisas a elaboração do projeto”.

A Ley 27.539/2019

O projeto de lei foi apresentado em 21 de setembro de 2018 pela senadora Anabel Fernández Sagasti, do partido Frente para la Victoria, à Comissão Unicameral Banca de la Mujer do Congresso Nacional. A proposta rapidamente ganhou amplo apoio de mais de 30 associações de música e arte de distintas partes do país, demonstrando a força e o consenso do movimento naquele momento. Em menos de um ano, a Lei 27.539 (Ley de Cupo Femenino y Acceso de Artistas Mujeres a Eventos Musicales) foi sancionada em 20 de novembro de 2019 e regulamentada já em janeiro de 2020 – um ritmo considerado extraordinário no contexto político argentino.

A lei estabelece que, para eventos com três ou mais artistas, deve haver uma cota mínima de 30% de participação feminina e de pessoas de outras identidades de gênero, sejam cis ou trans, incluindo grupos mistos. O INAMU (Instituto Nacional de la Música) ficou responsável por fiscalizar e garantir o cumprimento da norma, exigindo dos organizadores o envio prévio das programações para análise.

Como comenta Charo Bogarín, a entrada em vigor da Lei coincidiu com o início da pandemia, o que “paralisou completamente a música ao vivo e, sem dúvidas, retardou as ações para sua implementação”. Por outro lado, ela lembra que esse período foi estrategicamente usado pelo INAMU para organizar capacitações virtuais junto aos responsáveis culturais das províncias, preparando o terreno para a retomada dos eventos. Quando os espetáculos começaram a retornar, já havia uma rede de articulação pronta para garantir o cumprimento da legislação. O impacto foi visível: “A presença de artistas mulheres e identidades diversas cresceu até dobrar, com um aumento de 106% após três anos de vigência, como consta no Terceiro Relatório do Observatório do INAMU”, relata Charo.

Primeiros impactos

A atuação do Observatório da Música Argentina e o processo constante de diálogo com produtoras e associações resultaram em avanços imediatos. “Naquele ano, vimos os resultados de nossas estratégias de divulgação, conscientização e articulação com a cultura das províncias e o setor musical de cada território, o que trouxe ótimos frutos”, explica Charo sobre o aumento expressivo de Declarações Juradas (programações musicais declaradas pelos eventos) entre 2022 e 2023.

Mesmo com a diminuição no envio desses documentos em 2024 devido à recessão nacional, destaca-se a mudança qualitativa nas relações do setor: “No último período, houve uma queda acentuada de 52,6% [nas denúncias], fruto do ativismo dos(as) artistas e das Associações Musicais que estão em constante diálogo com os organizadores desses eventos, além dos responsáveis pela área cultural, sendo vigilantes dessa norma.”

Os dados mostram crescimento e maior diversidade em gêneros antes dominados por homens, inclusive em festivais tradicionais de rock, tango, folclore e música popular.

Fonte: Impacto de la Ley de Cupo en Eventos Musicales – Un estudio comparativo (INAMU, 2022)

Desafios e avanços

Os desafios persistem, como horários desfavoráveis reservados a mulheres e as demandas por fiscalização constante. No entanto, Charo destaca: “No que diz respeito à fiscalização do cumprimento da lei, são as próprias musicistas que ajudam muito na conscientização de organizadores e produtores, já que, como elas sempre disseram, ‘o problema não é com nossos colegas músicos’, mas com quem não conseguia enxergar o potencial dos projetos musicais das mulheres argentinas nem a desigualdade no mercado de música ao vivo.”

Sobre a queda nas Declarações Juradas, Charo enfatiza que “nosso objetivo era manter esse número em ascensão, ainda que, devido à queda no número de eventos no verão de 2024, esse número tenha diminuído um pouco, o que não foi significativo diante do quadro recessivo da economia nacional”. A vice-presidenta, e também musicista, vê indícios de amadurecimento e maior articulação no setor, com avanços tanto na abertura de diálogo diretamente com curadorias quanto na vigilância das associações.

Questionada sobre o futuro da Lei em meio a recentes mudanças políticas na Argentina, Charo afirma: “Somos um órgão de fomento público, não estatal, de caráter federal, onde as políticas são planejadas a cada ano com a participação e aprovação dos gestores de Cultura das 23 províncias argentinas e 24 jurisdições. Essa lógica de funcionamento nos permite ser uma instituição estável, independente dos movimentos políticos partidários.”

A análise dos relatórios revela avanços expressivos em diversos estilos musicais, ainda sem paridade plena, mas com uma tendência inegavelmente positiva.

A Ley de Cupo representa, assim, um marco relevante na democratização da música ao vivo e na luta histórica feminista no setor. Seus impactos já ultrapassam as fronteiras argentinas e inspiram o debate em outros países latino-americanos sobre políticas públicas eficientes de inclusão. Como atestam os dados e reforçam as palavras de Charo Bogarín, “nada teria acontecido sem a persistência das atividades de base” e o protagonismo das próprias artistas.

A reverberação da Ley de Cupo em outros países

A Ley de Cupo da Argentina, ao se tornar um marco no combate à desigualdade de gênero nos festivais musicais, consolidou-se como uma importante referência para outros países da América Latina. A proposta de estabelecer cotas mínimas para a participação feminina nos palcos dos festivais gerou debates e mobilizações em diversas nações da região.

Uruguai, México, Chile e Brasil, por exemplo, passaram a adotar ou considerar políticas semelhantes, inspirados pelo impacto e pelos resultados da iniciativa argentina. A experiência demonstrou a importância de combinar mobilização social, produção de dados e articulação institucional para promover mudanças estruturais. Esse movimento reverberou no continente, estimulando discussões, avanços e novos projetos em prol da equidade de gênero na música latino-americana.

Uruguai

Inspiradas pela experiência argentina, ativistas e artistas uruguaias iniciaram, em janeiro de 2021, um projeto de lei visando estabelecer cotas mínimas de participação feminina e de dissidências de gênero em festivais de música no país. O projeto propõe que pelo menos 50% dos artistas em eventos musicais sejam mulheres ou dissidências, com distribuição paritária entre datas, horários e palcos. Para garantir a qualidade e profissionalismo, as artistas devem possuir o Registro de Artistas do Ministério de Trabalho e Segurança Social. O cumprimento da lei seria monitorado por uma comissão composta por representantes do Ministério de Trabalho e Segurança Social, do Instituto Nacional de Música e da organização Mulheres e Dissidências na Música Uruguaia (MYDMUS). Infrações à lei acarretariam multas de 6% da arrecadação bruta do evento. Até o momento, o projeto está em trâmite legislativo, aguardando discussões e possíveis ajustes antes de sua possível implementação.​

México

No México, a desigualdade de gênero nos festivais de música é uma preocupação crescente. Estudo realizado por Karina Cabrera, fundadora do coletivo Sonoridad MX, revelou que entre 2022 e 2023, apenas 25% dos atos em festivais importantes contaram com mulheres à frente. Em resposta, a Coletiva Fortissimas iniciou, em 13 de dezembro de 2023, uma petição pública visando implementar cotas de gênero nos palcos, festivais e eventos musicais, tanto públicos quanto privados. A iniciativa busca garantir espaços seguros e promover a igualdade de participação para mulheres e dissidências de gênero na indústria musical mexicana.​

Chile

No Chile, a discussão sobre a implementação de cotas de gênero em festivais de música ganhou força com a proposta de um projeto de lei inspirado na experiência argentina. O projeto visa modificar a atual “Lei de Fomento à Música Chilena”, estabelecendo um mínimo de 30% de participação feminina nos line-ups de festivais e concertos. A proposta também busca assegurar a distribuição paritária em termos de datas, horários e palcos. Além disso, pretende criar oportunidades de trabalho para mulheres na indústria musical chilena. Liderado pela deputada Nathalie Castillo Rojas, o projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados em 17 de outubro de 2023, com 72 votos a favor, 41 contra e 18 abstenções. Atualmente, o projeto aguarda apreciação no Senado para possível implementação.

Brasil: a PL 522/2024

No Brasil, a Ley de Cupo da Argentina teve um impacto significativo. Em fevereiro de 2024, a deputada Natalia Bonavides, do Partido dos Trabalhadores do Rio Grande do Norte, apresentou na Câmara dos Deputados o PL 522/2024, que propõe a implementação de cota mínima de 30% de participação feminina nos festivais de música em todo o país. O texto de justificativa do PL menciona a entrevista “O que o Brasil pode aprender com a lei argentina que fez crescer o número de mulheres no line-up de festivais?”, conduzida pela jornalista Juliene Moretti com esta pesquisadora, que compartilhou dados de sua pesquisa sobre a presença feminina em festivais brasileiros, com foco nos anos de 2016 a 2019, publicada pela Zumbido em 2019 e 2020. De acordo com o site da Câmara, o projeto de lei está parado na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMULHER) desde março de 2024, sendo retirado de pauta constantemente.

Embora o PL 522/2024 seja uma importante proposta inspirada pela Ley de Cupo, o projeto ainda enfrenta dificuldades para avançar, principalmente pela falta de visibilidade e conhecimento da sua existência. Para que o PL ganhe tração no Congresso, é essencial que haja uma mobilização popular mais ampla, especialmente por meio de um movimento coletivo forte que pressione os parlamentares a dar a devida atenção à questão.

A ausência de um debate público consistente, tanto na imprensa quanto entre os coletivos e organizações da área, tem dificultado a conscientização sobre a importância dessa medida. A mobilização da sociedade civil, e especialmente da classe artística feminina, seria crucial para tornar o projeto mais visível, fortalecer a luta por mais equidade de gênero na música e acelerar seu avanço no processo legislativo.

A experiência da Argentina, com a Ley de Cupo, tem gerado discussões e inspirado legislações semelhantes em outros países da América Latina. Embora os avanços tenham sido mais lentos em alguns casos, a lei argentina permanece como um exemplo poderoso de como a mobilização social e a união de artistas podem impulsionar mudanças significativas tanto para o setor musical quanto para a sociedade como um todo. Cada país adapta as políticas conforme suas realidades locais, mas todas compartilham o objetivo comum de garantir maior representatividade e oportunidades para mulheres e dissidências de gênero na cena musical.

Sim, artista igual trabalhadora

Ao longo deste artigo, percorremos a história da música e da indústria musical, destacando como a estrutura patriarcal sempre foi um elemento central nas desigualdades enfrentadas pelas mulheres no setor. Observamos, com base em dados e evidências, que a sub-representação feminina em palcos, festivais e espaços de visibilidade não é apenas uma questão de oportunidade, mas um reflexo de um sistema que, por décadas, negligenciou as mulheres enquanto trabalhadoras da música.

Políticas públicas, como a Ley de Cupo na Argentina, surgem como uma resposta concreta a essa desigualdade histórica, mostrando que legislar para corrigir tais desequilíbrios não só é possível, mas necessário. A experiência da Argentina tornou-se um exemplo para outros países, como o Uruguai, México, Chile e até mesmo o Brasil, onde iniciativas semelhantes buscam garantir que as mulheres não apenas ocupem espaços artísticos, mas que tenham, de fato, o direito de ser reconhecidas e remuneradas pelo seu trabalho.

Entretanto, as mudanças necessárias vão além de normas e cotas. Elas envolvem uma transformação estrutural na forma como a indústria enxerga o trabalho artístico feminino, rompendo estigmas e preconceitos. As mulheres na música não são apenas divas, rainhas ou figuras de vaidade: são trabalhadoras que, como qualquer outro profissional, buscam ser reconhecidas pelo seu esforço, talento e contribuição ao campo musical. Para que isso se concretize, é preciso que a sociedade, a indústria musical, os gestores culturais e as próprias políticas públicas caminhem de mãos dadas para garantir que o palco seja, de fato, um espaço igualitário e inclusivo, onde todas as pessoas possam se expressar e ser ouvidas sem a imposição de barreiras de gênero.

Se a história nos mostrou o quanto a música feminina foi silenciada, cabe a nós, como sociedade, garantir que as artistas de hoje e de amanhã tenham os mesmos direitos, condições e oportunidades que seus colegas homens. E, quando necessário, é a legislação que pode e deve ser o alicerce para essa mudança.

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