Na plateia: Mariangela Alves de Lima

11/08/2022

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Novo título da Coleção Críticas reúne textos publicados no jornal O Estado de São Paulo entre 1972 e 2010 por uma das maiores pensadoras do teatro brasileiro

Por Valmir Santos*

Estão compilados aqui 290 textos da intelectual que dedicou mais da metade da vida ao ato de assistir a montagens de peças e, nas horas ou dias seguintes, emitir um ponto de vista genuíno a partir de sua experiência.

Na juventude, Mariangela Alves de Lima não tinha dúvidas de que escreveria sobre arte. Principiou pela graduação em jornalismo, mas logo migrou para o curso de crítica teatral e equilibrou os dois campos na prática da análise de espetáculos por 40 anos, entre 1972 e 2011, nas páginas culturais de O Estado de S. Paulo. Desde os primeiros escritos, aos 24 anos, é possível divisar a influência da literatura na formação, seja pelo exercício da eloquência, seja pela disposição em demarcar o lugar da espectadora conscienciosa dos desígnios do ofício.

Naturalmente, o modo de elaborar, superar ou resolver nexos através das ideias e da palavra passou por transformações tanto quanto foram as mutações radicais da linguagem nas artes da cena e do corpo desde a década de 1960.

Lima navega contra a maré do “ódio ao pensamento”, como define a filósofa Marilena Chauí. Ao triangular a conversa com artistas e público, ela atravessa os porquês da filosofia, o como da ciência e a teatralidade do humano – tudo isso contido em manifestações poéticas erguidas sob o pano de fundo histórico de uma sociedade às voltas com a ditadura civil-militar, o processo de redemocratização, a virada de milênio e a inédita ascensão da esquerda ao governo.

A perenidade dos textos pode ser atribuída, em parte, à clareira que costuma abrir nos parágrafos iniciais ao desenvolver micro ensaios acerca da ordem oculta por trás de cada obra.

Já a curadoria da coletânea dá a ver o interior de trajetórias singulares: encenações de José Celso Martinez Corrêa, Antunes Filho, Fauzi Arap e Gerald Thomas; dramaturgias de Nelson Rodrigues, Oduvaldo Vianna Filho, Plínio Marcos e Luís Alberto de Abreu; atuações de Cleyde Yáconis, Fernanda Montenegro, Marília Pêra e Marilena Ansaldi; e veredas dos grupos Asdrúbal Trouxe o Trombone, Tapa, Galpão, Armazém Companhia de Teatro, Cia. dos Atores e Teatro da Vertigem.

A autora é a primeira mulher a figurar na Coleção Críticas** das Edições Sesc. Sua voz ressoa a de pensadoras com as quais contracenou no caminho, a exemplo de Maria Thereza Vargas. A perspectiva feminista, aliás, é outra janela recorrente nos escrutínios permeados ainda de humor, elogio ao potencial do silêncio em cena, sedução pela inteligência e convicção de que, no palco, como na poesia, o pouco vale muito.

:: Trecho do livro

*Valmir Santos é jornalista e crítico, fundador do site Teatrojornal. É mestre e doutorando em Artes Cênicas pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Este texto foi originalmente publicado na orelha do livro.

**O Sesc São Paulo reconhece na função do crítico sua relevância para formar públicos e refletir a respeito do papel da arte na sociedade. É nessa perspectiva que publicamos a Coleção Sesc Críticas, da qual fazem parte Sábato Magadi: amor ao teatroMacksen Luiz et aliiJefferson Del Rios: teatro, literatura, pessoas e agora Mariangela Alves de Lima: na plateia.

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