SP da várzea 

30/10/2025

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Descubra a importância desses territórios para a identidade e a cultura da cidade 

Leia a edição de NOVEMBRO/25 da Revista E na íntegra

POR ADRIANA TERRA 
FOTOS NILTON FUKUDA 

São Paulo guarda uma relação profunda com as suas várzeas– como são conhecidos os terrenos planos, próximos da margem de um rio ou córrego, que geralmente alagam nos períodos de cheia. Apesar das transformações que esconderam os rios e mudaram a paisagem de suas margens, as várzeas deixaram heranças na cultura da cidade. “Quando você faz um percurso histórico, vê a importância dos muitos rios de São Paulo. Tanto para o cultivo de alimentos, quanto para uso do tempo livre. No passado, as pessoas podiam, nas secas, ocupar a várzea com atividades, dando origem às coisas que a gente toma como mais importantes na cultura paulistana: samba, futebol, Carnaval e capoeira”, explica a historiadora Diana Mendes Machado da Silva. “Varzeano”, no entanto, já foi um termo usado para desvalorizar quem ocupava essas regiões mais baratas para viver. Mas a população não aceitou e ressignificou essa expressão que perdura mesmo sem as várzeas. Neste Almanaque, reunimos cinco elementos que mostram a importância dessa geografia na identidade paulistana: do futebol ao samba, das baixadas aos mercados e parques. 

NASCEDOURO DO SAMBA  
Foi nas várzeas que, junto ao futebol, o samba germinou em São Paulo. Nessas regiões se concentrava a população negra, muitas vezes vinda do interior do estado, trazendo essa expressão cultural. No Bixiga, no Centro da capital, o Grêmio Recreativo Cultural e Social Escola de Samba Vai-Vai surge nas batucadas de beira de campo na baixada do rio Saracura. Ainda na mesma região, no bairro da Liberdade, foi na várzea do rio Tamanduateí, onde nasceu a Sociedade Recreativa Beneficente e Esportiva Lavapés Pirata Negro, próxima ao córrego Lavapés. Já na Barra Funda, zona Oeste de São Paulo, na várzea do rio Tietê, as pessoas que organizaram o primeiro cordão da cidade, origem do Camisa Verde e Branco, também jogavam bola e recebiam produtos provenientes de Santos e do interior do estado, no Largo da Banana, para vendê-los no Centro e na Avenida Paulista, segundo a historiadora Diana Mendes. Ou seja, “as pessoas trabalhavam, viviam e usavam seu tempo livre ali. E nesse uso, você vê a cultura popular”, conta. 

O Largo da Banana, um dos berços do samba paulistano

MERCADO MUNICIPAL  
O tráfego fluvial também impulsionou o comércio no século 19, e foi na antiga Várzea do Carmo que nasceu o primeiro mercado da cidade. Local onde se vendiam frutas, legumes, cereais, animais e ervas, o Mercado dos Caipiras – nome pelo qual era conhecido o Mercado Grande – ficava onde hoje é a esquina da rua 25 de Março com a General Carneiro. Esse comércio era feito pela população indígena e negra em pequenas casas e bancas, lembrando uma feira livre. Foi desse mercado que surgiu o Mercado Municipal de São Paulo, inaugurado no ano de 1933, em um cenário já bem diferente, com a urbanização ditando padrões higienistas, a retificação e a canalização dos rios para a construção de grandes avenidas, priorizando os automóveis e o consequente afastamento da população da relação cotidiana com essas águas.  

Mercado Municipal de São Paulo
Rua Cantareira, 306, Centro. São Paulo-SP

PELAS BAIXADAS  
Você conhece a Baixada do Glicério? E a Mooca Baixa? Esses nomes são derivados da presença das várzeas na cidade. Na beira do rio Tamanduateí, a rua do Glicério e a rua da Mooca são áreas de margem de rio. O fato de estarem em regiões mais baixas ficou marcado nos nomes, ainda que informais, desses territórios. No bairro da zona Leste é comum ver muros com a inscrição “Mooca Baixa” em referência a um time de futebol local. Na zona Oeste, o Baixo Pinheiros é um exemplo de nomeação para classificar um espaço com características específicas dentro do distrito, também antiga área de várzea do rio Pinheiros – um dos principais cursos d’água da cidade, chamado de Rio Grande no século 16.  

As áreas de margem de rio, ou seja, regiões mais baixas, deram nome a bairros da cidade, como Mooca Baixa. 

BOLA NO CAMPO  
O futebol brasileiro se alastrou pelas várzeas da cidade entre o fim do século 19 e início do 20. O primeiro jogo oficialmente registrado foi em 1895, na beira do rio Tamanduateí. Em 1930, a Gazeta Esportiva contava oito campos na mesma Várzea do Carmo, como relata pesquisa da historiadora Diana Mendes. Foi também nessas margens, na altura do bairro Bom Retiro, região central da cidade, onde nasceu o Corinthians, em 1910. Hoje o termo “varzeano” é sinônimo de futebol popular, mesmo longe dos rios. Está, em geral, nas periferias da cidade, como na região do Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luís, onde ocorre, neste mês, a Copa Sesc Futebol de Várzea. Na ocasião, o Sesc Campo Limpo recebe a exposição Vozes da Várzea, do Museu do Futebol, com fotos, textos e mapas, em cartaz desde 22 de outubro até 1° de março de 2026, na unidade.  

Sesc Campo Limpo
Rua Nossa Senhora do Bom Conselho, 120, Campo Limpo. São Paulo-SP

O Campo do Santa Marina, time de futebol de várzea

PARQUES LINEARES 
Espaços adotados na última década pelo projeto urbanístico da capital, os parques lineares são áreas verdes ao longo do curso de rios, em fundos de vale, nas antigas várzeas. São uma forma de recuperar o ambiente natural, suprimido pelo crescimento urbano. “São Paulo tem uma rede hidrográfica vastíssima. A gente não fica a mais de 250 metros de um córrego de nenhum ponto do centro expandido, mas isso está invisibilizado”, ressalta a arquiteta e urbanista Mariana Corrêa Soares. Ela conta que os parques lineares têm uma função ambiental ampla: da preservação das águas, da flora e da fauna e da possibilidade de reabrir trechos dos rios, ao estímulo à mobilidade ativa, com ciclovias. “Essas áreas têm potencial para o fluxo da vida”, diz. O que manteria a cultura das várzeas.  

São Paulo 01 de outubro de 2025 | Parque Linear Rio Verde em Itaquera | Várzea | Foto Nilton Fukuda

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