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O que estamos aprendendo com nosso próprio lixo

Texto: Afonso Capelas Jr. e Caco de Paula

Os aterros sanitários são feitos para conter o chorume, bem como os gases produzidos. A Política Nacional de  Resíduos Sólidos, de 2010, propõe que os aterros substituam os lixões a céu aberto ainda em operação no país.  Nesta imagem, aterro sanitário em Brasília, projetado para comportar 8,13 milhões de toneladas de rejeitos. Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília

​O dia 8 de janeiro de 2021 marcou o início da Década da Ciência Oceânica instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU). A intenção é aprofundar o conhecimento sobre os mares, ecossistema de importância vital para o planeta. Uma das frentes mais relevantes dessa abordagem é a avaliação de formas de reduzir ao máximo a poluição causada pelas atividades humanas.

As águas salgadas espelham fielmente a nossa sociedade de consumo. Os oceanos foram transformados em gigantescos ralos por onde escoam diariamente, milhares de toneladas de resíduos depois que são despejados — não raras vezes intencionalmente — em rios e córregos. Muito do lixo que vai parar nas águas é proveniente de nossas próprias casas, não importa se estão em uma cidade litorânea ou no coração do continente. Entre restos de vidros, metais e outros produtos industrializados, os plásticos são os rejeitos mais encontrados nos oceanos. Grande parte poderia ter sido reduzida ainda no consumo, reutilizada antes de ser considerada resíduo ou, ainda, reciclada em vez de descartada.


Sabe-se que nas últimas décadas milhões de toneladas de lixo foram despejados nos mares. Não há números precisos. O certo, de acordo com a ONU, é que, se nada for feito, até 2050 teremos nas águas mais plásticos que espécies marinhas. Hoje mesmo já é possível encontrar enormes ilhas de material plástico boiando nos oceanos. “O plástico foi uma dádiva da nossa civilização, e também um fardo, porque só observamos sua praticidade, não seu dano ao ambiente. No litoral de muitos países, a poluição fez com que alguns tipos de plâncton proliferassem e consumissem todo o oxigênio, provocando a morte dos peixes. São zonas sem vida, e já existem centenas delas nos litorais do mundo”, disse a oceanógrafa e ambientalista norte-americana Sylvia Earle.

CONSCIÊNCIA E AÇÃO MUDAM A REALIDADE

Os pilares do Lixo: menos é mais são a redução e a destinação responsável de resíduos, a reutilização de materiais e estratégias educativas e de comunicação. Veja a seguir alguns aprendizados e iniciativas do Sesc.

Foto: Matheus José Maria

MENOS DESCARTÁVEIS

Iniciativa do programa eliminou a geração de mais de 2 milhões de embalagens de plástico por ano, com a suspensão da venda de água sem gás engarrafada em todas as unidades do Sesc no estado de São Paulo. Fruto de planejamento e articulação, a medida inclui garantia de acesso livre e gratuito à água de beber e ampla campanha de comunicação.

 

 

Foto: Arquivo pessoal

MAIS PARCERIAS

A doação dos materiais recicláveis gerados nas unidades do Sesc deu origem a parcerias com dezenas de cooperativas e associações de catadores e de triagem de materiais recicláveis, como a Cooperativa do Reciclador Solidário, em Piracicaba, onde trabalha Ednalva Inês Correa Souza (foto). Além da redução de impactos ambientais, as parcerias trazem oportunidade de renda para esses grupos.

“CADA ATO CONTA, POR MENOR QUE SEJA”

Desde os tempos das cavernas a humanidade produz lixo. Quando a caça e a pesca rareavam em determinada região, os povos nômades deixavam tudo para trás e seguiam em busca de regiões mais fartas. Quase tudo: o resíduo — material orgânico — ficava e era decomposto pelo tempo. Mais tarde aprenderam a viver em sociedade produzindo utensílios.

Aprenderam ainda a criar animais e cultivar plantas comestíveis. Com mais alimentos, as populações aumentaram e com elas também rastros intermináveis de resíduos por onde passavam. Ao longo da história os humanos passaram a viver em aldeias e cidades, que produziam grandes quantidades de rejeitos, ainda que basicamente orgânicos. Curiosamente, na Idade Média o lixo era relacionado a miséria, doenças, morte e pecado. Até que chegou a Revolução Industrial e, literalmente, transformou todo o cenário. A tecnologia permitiu a invenção de compostos químicos: plástico, borracha, cimento, novos metais, combustíveis e óleos minerais.


Desde então a geração de lixo saiu do controle, se é que havia algum. Um estudo feito pelo Banco Mundial em 2018 concluiu que a produção anual de resíduos sólidos no planeta já chegava então a 2,1 bilhões de toneladas e que até 2050 poderá alcançar 3,4 bilhões de toneladas por ano, um ritmo de crescimento muito maior do que o da população no mesmo período.

Somente os brasileiros geraram 79,6 milhões de toneladas de resíduos sólidos em 2018, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). Essa quantidade foi quase 13 milhões de toneladas maior que a de 2010. A continuar nessa progressão, a Abrelpe projeta para 2050 cerca de 120 milhões de toneladas de resíduos produzidos pelos brasileiros por ano, 50% mais que hoje.

Como podemos impedir que essa montanha de rejeitos continue crescendo e reverter o quadro? Fazendo a lição de casa, garantem os especialistas. “Cada ato conta, por menor que seja. É uma reflexão que deve ser feita; a ação de cada um ajuda”, confirma Flávia Lemes da Cunha, psicóloga, embaixadora do Instituto Lixo Zero Brasil e fundadora da Casa Causa, organização que propõe projetos e soluções para reduzir a geração de resíduos.

O Sesc aderiu à responsabilidade de reduzir seu próprio lixo. Assim, em 2010 nasceu o Lixo: menos é mais (veja alguns destaques nos quadros ao longo desta reportagem) que promoveu um detalhado diagnóstico do descarte de rejeitos. A estruturação e implantação do programa se deu a partir do envolvimento e participação das equipes do Sesc e contou com a colaboração da bióloga, educadora ambiental e especialista em resíduos sólidos Patrícia Blauth (1963/2017).

Ela sempre enfatizou a importância de dois valores fundamentais na prática educativa: o vínculo afetivo, para que as pessoas entendam que a cidade é dela e de todos; e o valor que cada indivíduo tem como agente de transformação.

Em uma palestra sobre o assunto, ela sintetizou: “O que a gente precisa é de educação, ética, sensibilização, motivação, um padrão de produção e consumo responsáveis… e menos lixo!”

Nesses dez anos o programa de gestão dos resíduos do Sesc conquista bons resultados e traz algumas lições preciosas. Uma delas é que o aprendizado em favor da redução dos resíduos é contínuo e permanente. Atitudes foram transformadas dentro da instituição e até mesmo na vida pessoal de seus funcionários.

Ter consciência de que o lixo descartado no cotidiano de cada um tem destino e consequências para a sociedade e o meio ambiente é imprescindível. “As descobertas desse trajeto mostraram que o engajamento no programa partiu da confiança de que as mudanças propostas têm fundamentos e são boas para as pessoas e para o ambiente: diminuem o desperdício, poupam água e energia, colaboram com trabalhadores da limpeza e muito mais”, explica Denise S. Baena Segura, gerente da Educação para Sustentabilidade e Cidadania do Sesc. “Tratar de resíduos é falar de coletivo, ciclo de vida, grandes somas (toneladas geradas, trabalhadores da reciclagem, investimentos em tecnologias e assim por diante. E é também falar de engajamento pessoal, pois cada atitude é transformadora e inspiradora em cada lar, em cada espaço público. Saber de onde vem e para onde vão as coisas que consumimos é muito revelador para as pessoas. Cria-se uma visão de que tudo está conectado e é compartilhado, portanto, diz respeito à coletividade.”

EDUCAÇÃO PERMAMENTE

Diante do desafio de mudar hábitos e atitudes, a prática socioeducativa torna-se estratégia permanente e envolve desde formações para os funcionários até atividades socioculturais e ambientais destinadas a diferentes públicos. Na imagem, publicação de 2019.

“Saber de onde vem e para onde vão as coisas que consumimos é muito revelador para as pessoas. Cria-se uma visão de que tudo está conectado e é compartilhado, portanto, diz respeito à coletividade”

Foto: Reprodução

RESÍDUOS SÓLIDOS NO PLANETA EM 2018

No mundo segundo o Banco Mundial 2,1 bilhões de toneladas foi produção anual de resíduos sólidos no planeta no brasil.
Segundo a Abrelpe, o Brasil produziu, em 2018, 79,6 milhões de toneladas o que significa 13 milhões de toneladas a mais que em 2010.

POR UMA CULTURA DO LIXO ZERO

Para que haja mudança efetiva é mesmo essencial entender que tudo o que é descartado no dia a dia vai para algum lugar. “Os resíduos não somem da porta de casa como mágica. Percorrem um longo trajeto até ser descartados, em muitos casos, ainda em lixões a céu aberto”, explica Edson Grandisoli, pós-doutor pelo Programa Cidades Globais do Instituto de Estudos Avançados da USP e diretor educacional da Reconectta, empreendimento social que traça projetos de educação para a sustentabilidade em escolas e empresas.


“Temos a oportunidade de sair de uma cultura de soma zero — em que um perde para outro ganhar — e transcender para uma cultura em que não só todos ganham como a natureza, nossa provedora, também”, diz Flávia Lemes da Cunha. Para a fundadora da Casa Causa, essa guinada de atitude pode livrar o planeta da sobrecarga a que tem sido submetido ano após ano com a exploração exorbitante dos recursos naturais, causada pelo excesso de consumo e, consequentemente, pela enorme geração de resíduos.


Edson Grandisoli acredita que a educação levará à mudança pretendida e necessária. Para ele, boa informação e envolvimento ativo das pessoas produzem motivação política numa comunidade. “Além de discutirem o tema com os alunos, as escolas podem criar projetos e programas que trabalhem todo o território onde estão, envolvendo pais, comerciantes e outras pessoas na direção da mudança de comportamento sobre consumo e descarte.”

Na prática, o aprendizado leva à transição de cada um para a comunidade e a sociedade em geral. Reduzir a quantidade de rejeitos e separar aqueles que podem ser reciclados é o começo. Flávia Lemes da Cunha concorda: “É importante discutir o assunto entre amigos, apresentar alternativas possíveis, propor desafios. Comece pela sua casa, escolhendo um dos cômodos onde observar o consumo e avaliar o que pode ser mudado nos seus hábitos”. Ela mesma começou

pelo banheiro a modificar seu consumo e reduzir o descarte. “Fui trocando produtos, substituindo por itens sem embalagens ou que não usam químicas pesadas, além de marcas que fazem a logística reversa da embalagem: sim, existem empresas que incentivam a devolução dos recipientes vazios de seus produtos com recompensas ou estímulos.”


Como embaixadora do Instituto Lixo Zero Brasil, Flávia acredita na transição para uma vida sem lixo. Mas ensina que é preciso ir além da separação de resíduos e das novas escolhas. Algum esforço e disposição extras são necessários nessa hora. “Vida lixo zero não é só trocar produtos, nem apenas reciclar e achar que resolve. É preciso reciclar e também mudar hábitos”, enfatiza.

DESAFIOS COLETIVOS

Dar o exemplo estimula outros a seguirem o mesmo caminho, garante Edson Grandisoli. “Busque cooperativas que possam recolher seus resíduos e proponha parcerias, caso o poder público não dê conta do recado no seu bairro. Viva bem com menos e vote em candidatos com uma agenda clara e assertiva sobre os desafios socioambientais; cobre resultados.” Ele resume: “Tudo isso dá trabalho, mas, se você acha importante, seja coerente e faça”.

Os impactos sociais e ambientais causados pelos resíduos fazem um tripé com os econômicos. Depois que o saco de lixo sai das residências, uma intricada e onerosa logística é necessária para transportá-lo até a deposição final em lixões e aterros sanitários. O custo dessa operação, não raro, estoura o orçamento de muitas prefeituras Brasil afora.


“Grande parte das despesas com a gestão dos resíduos está na estrutura de coleta, transporte, além da instalação e manutenção dos depósitos”, esclarece o economista e professor de economia ambiental Jacques Demajorovic, especialista em projetos de gestão socioambiental. Professor do Programa de Pós-Graduação em Administração do Centro Universitário FEI, Demajorovic explica que nas metrópoles, como São Paulo, as áreas mais próximas para deposição de resíduos estão saturadas, em consequência do consumo frenético. “Os rejeitos, mesmo os que seguem para a reciclagem, precisam ser levados cada vez para mais longe das residências e das empresas onde são recolhidos. Isso demanda muito mais recursos dos orçamentos municipais.” É muito dinheiro que poderia ser despendido com educação e saúde, por exemplo. Ambientalmente, os lixões a céu aberto que ainda resistem no país — e não são poucos — apresentam uma série de problemas. Diferentes de um aterro sanitário, eles não têm qualquer tipo de preparação e cuidados para evitar o vazamento do chamado chorume, o líquido decorrente da decomposição de material orgânico. O chorume contamina o solo e os cursos d’água, polui o ar e causa doenças e epidemias porque atrai vetores como ratos e mosquitos.Os aterros sanitários são feitos para conter o chorume, bem como os gases produzidos, que podem até ser captados e aproveitados para geração de energia.

Foto: André Romani

 

ATENÇÃO À LÓGICA DA CIRCULARIDADE

Extrair, produzir, vender e descartar é a lógica da linearidade. Na perspectiva de que tudo se transforma, empresas e organizações podem substituí-la pela lógica da economia circular, na qual os insumos podem retornar ao ciclo industrial pela reciclagem e, no caso dos restos de vegetais (folhas, grama, galhos…) e alimentos, voltar à natureza em forma de compostagem.

CATADORAS E CATADORES NO CENTRO DA CADEIA DE RECICLAGEM

e financeiros negativos do excesso de resíduos, o Brasil tem resultados sociais favoráveis nas mãos das catadoras e dos catadores, demonstra Jacques Demajorovic. “Catadoras e catadores são o elemento central na cadeia de resíduos sólidos. Foram as primeiras pessoas a se interessar pela reciclagem no país. Ajudam a evitar que muitos resíduos recicláveis e reaproveitáveis sejam encaminhados para lixões e aterros sanitários.” O economista diz que o trabalho é importante para os municípios e pode gerar renda; por isso tem uma consequência social positiva e relevante. As desigualdades sociais, as crises econômicas e o desemprego estimularam as pessoas excluídas do trabalho formal a procurarem essa atividade em busca de renda.

Ao longo do século 20 a atividade de catação expandiu-se com o avanço da economia brasileira e a diversidade de produtos e embalagens. O Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) estima que até dezembro de 2014 o número de catadores no Brasil era de mais de 180 mil e em 2018 subiu para 268 mil, com renda mensal de 690 reais, 30% da renda média nacional da época, que era de 2 243 reais. A maioria, 67%, é negra, 72% são homens e 74% só têm o ensino fundamental incompleto ou nenhuma instrução.


O Brasil é referência mundial no movimento pró-organização de catadoras e catadores desde as duas últimas décadas do século 20. Empresas e prefeituras de grandes capitais, como Belo Horizonte, Porto Alegre e São Paulo, passaram a reconhecer a sua importância e a trabalhar em parceria tendo as cooperativas como elo. A partir de então os próprios catadores uniram-se num movimento que fortaleceu a categoria, o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR). A atividade agora é reconhecida. “Isso foi muito importante para valorizar e dar visibilidade ao catador como um profissional de limpeza pública.” O professor Demajorovic admite que ainda é necessária maior sinergia entre o MNCR, as prefeituras e os grandes geradores de resíduos: as indústrias. “É um processo que já acontece no país, mas precisa avançar ainda mais.” (Leia depoimentos de catadores e integrantes de cooperativas de reciclagem na página 34)

A conquista da profissionalização dos catadores é mérito da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). A lei 12.305 foi instituída no dia 2 agosto de 2010 para organizar a cadeia do lixo no país e dar maior transparência no gerenciamento de resíduos integrando empresas, poder público e sociedade. Os objetivos principais são reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para os aterros sanitários e regularizar ações e incentivos para a coleta seletiva, reciclagem, logística reversa, responsabilidade compartilhada, entre outros.

Foto: Dorival Gonçalves

 

A PERCEPÇÃO DE COLABORAÇÃO COLETIVA...

Em paralelo à compreensão conceitual do valor da sustentabilidade, a mudança se dá com decisões práticas. A adoção de estações coletivas de descarte de resíduos, em substituição aos cestos individuais, ajudou os diferentes públicos do Sesc a perceber no dia a dia a importância da responsabilidade quanto ao descarte correto.

COMUNICAÇÃO

Mudar hábitos e atitudes exige uma sensibilização genuína das pessoas. Educação e comunicação permanentes favorecem o engajamento e a cooperação.

Foto: Lúcio Érico

 

E A EXPERIÊNCIA DA PRÁTICA INDIVIDUAL

Há mais de 10 anos todos os funcionários e prestadores de serviços continuados recebem utensílios duráveis para o consumo de água, chá e café. Isso permitiu uma grande redução de resíduos.

IDEIAS COMPARTILHADAS

É possível replicar boas práticas de minimização e destinação responsável de resíduos. A experiência institucional tem sido compartilhada com centenas de empresas e instituições. Aspectos econômicos, sociais e ambientais da gestão de resíduos são discutidos nos encontros com empresas promovido pelo Lixo: menos é mais, junto com o programa de Relacionamento com empresas.

LOGÍSTICA REVERSA E ENGAJAMENTO

Dez anos depois de assinada, a PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos) avançou — como no reconhecimento da atividade dos catadores —, mas ainda há muito a fazer para que atinja todos os seus objetivos. Um deles, o fim dos lixões a céu aberto no país, ainda está longe de ser alcançado, admite o professor Jacques Demajorovic. “Obras de construção de aterros sanitários controlados e seguros não dão ibope para o poder público. São onerosas, especialmente para as prefeituras de pequenas cidades.” Consórcios entre empresas e municípios poderiam dar condições de avanço nesse sentido. “Mas, enquanto houver desafios básicos culturais, políticos e estruturais a superar, além da desigualdade num país de dimensões continentais como o nosso, fica difícil”, conclui.


Por outro lado, algumas metas foram impulsionadas desde a chegada da lei. Uma delas é a logística reversa, o recolhimento e reciclagem — pelos fabricantes e importadores — dos produtos depois de consumidos e descartados. É o caso dos eletroeletrônicos. Muitas empresas desse setor já fazem o recolhimento de aparelhos eletroeletrônicos descartados no país. Para isso, a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) criou em 2016 a Green Eletron - Gestora para Logística Reversa de Equipamentos Eletroeletrônicos. Ela recolhe o chamado lixo eletrônico e encami

nha para empresas recicladoras, que transformam os resíduos em matéria-prima para novos produtos. “Atualmente, a Green Eletron faz a logística reversa para sessenta fabricantes, importadores e distribuidores de eletroeletrônicos e 26 marcas de pilhas”, informa Ademir Brescansin, gerente executivo da empresa. No ano passado a Green Eletron lançou o movimento de conscientização dos consumidores chamado “Eletrônico não é lixo”.
Promovemos campanhas de coleta no metrô de São Paulo, fizemos movimentações nas redes sociais com a participação de influenciadores e publicamos um e-book didático sobre o assunto. Também fizemos um drive-thru de coleta em Santo André, São Paulo. Foi importante ver quanto as pessoas se engajaram”, conta Brescansin.

 

Crédito: Ilustração Estúdio Alfavaca

 

TRANSVERSALIDADE

Cada Unidade do Sesc tem um grupo gestor do Lixo: menos é mais, com representantes de diversas áreas. Práticas socioambientais estão presentes no pensamento e no cotidiano dos integrantes desses grupos, que são responsáveis pela gestão do programa (incluindo a não geração e a destinação correta) e pelas ações educativas.

QUESTIONAMENTO

Nossa consciência a respeito dos resíduos que produzimos como indivíduos, organizações e sociedade é proporcional aos impactos causados? Que lugar o lixo ocupa em nosso cotidiano? Qual lugar o lixo ocupa em nossas relações? Essas são algumas das questões que o programa instiga constantemente.

Crédito: Ilustração Estúdio Alfavaca

ATO POLÍTICO TRANSFORMADOR

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio SP) também vem se empenhando na logística reversa. O comércio paulista participa de sistemas de logística reversa de vários produtos pós-consumo como lâmpadas, pilhas, baterias portáteis e de chumbo (automotivas, de bicicletas e estacionárias), eletroeletrônicos, óleo comestível, embalagens em geral, dentre outros.


“Por meio do Conselho de Sustentabilidade nós nos reunimos com empresas, organizamos eventos, publicações de matérias no portal da internet e redes sociais. Também mantemos uma plataforma de logística reversa com informações para consumidores e empresas do setor”, conta Cristiane Cortez, engenheira química e assessora técnica do Conselho de Sustentabilidade da Fecomercio SP.

A PNRS ajudou a moldar o conceito de construção e aprendizado coletivos. Todo esse esforço conjunto entre fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e governantes tem nome: responsabilidade compartilhada, um novo elo na cadeia produtiva. “Foi um passo importante da lei. Não só o consumidor e o poder público devem ser responsabilizados pelos rejeitos. Quem inicia o processo de produção e consumo são as empresas, então elas têm grande responsabilidade. Assim, passam a preocupar-se em melhorar o design e os materiais de seus produtos, para que sejam ambientalmente mais eficientes”, opina o economista Jacques Demajorovic.


Pensar no design dos produtos é um dos elementos que leva à economia circular, garante o diretor educacional da Reconectta, Edson Grandisoli, que recentemente coordenou o Movimento Circular (movimentocircular.io), uma iniciativa sem fins lucrativos que aproxima o tema das pessoas: “Essa nova economia pensa a cadeia de produção-consumo-descarte como um todo, indicando pontos necessários de mudança em todas as etapas, desde a extração do recurso, o design dos produtos e as formas de consumo até o descarte final, quando não é realmente mais possível reutilizar ou reciclar os materiais”.


Para ele, a educação ambiental é a base para mudar a forma como tradicionalmente nos relacionamos com o planeta. “Só assim conseguiremos compreender a responsabilidade dos atores envolvidos, podendo estimular e cobrar ação. A bomba não pode estourar apenas nas mãos dos governos locais e dos consumidores. Novamente, a educação deve funcionar como ato político e transformador”, conclui.