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Estética da palavra

Belga, Satanique Consilium
Belga, Satanique Consilium


Elementos gráficos potentes, a escrita e a tipologia podem ser usadas para dar ritmo, equilíbrio, espessura e textura às produções artísticas



Palavras escritas sem sequência lógica, letras coladas uma a uma para compor uma mensagem, colagem, assemblage ou frases descritivas em um vídeo. São variados os meios e suportes pelos quais palavras fazem parte da composição de obras de arte. Na contemporaneidade, conceitos como colagem, desconstrução e hibridismo são centrais e ajudam a pensar sobre fatos culturais relacionados ao uso da palavra e da imagem.

Segundo a professora do curso de Artes Visuais e Design das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) Andrea Souza, para entender a atual apropriação do léxico e seu emprego como signo visual, vale voltar o olhar para os movimentos futurista e dadaísta.

O primeiro foi iniciado com o manifesto do poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti, publicado em Paris em 1909, cujo slogan era: “Liberdade para as palavras”. Suas principais características estão na valorização da velocidade, da máquina, o abandono das diferenças entre design e arte e a valorização da propaganda como meio de comunicação. O segundo foi oficializado pela criação do Cabaré Voltaire, em 1916, em Zurique. O clube literário teve idealização dos escritores alemães H. Ball e R. Ruelsenbeck, e do pintor e escultor Hans Arp, e por ser um espaço multifacetado antecipava a tendência de funcionar simultaneamente como galeria de exposições e sala de teatro. Lá eram organizadas atividades focadas em música, dança e poesia. O dadaísmo rejeitava todo e qualquer tipo de tradição e promovia conceitos como a liberdade, a contradição, o imediatismo, o caos e a imperfeição.

“Essas ações inseriram a tipografia no campo dos elementos visuais. A letra não se apresenta só como elemento textual, mas gráfico e parte do universo do design. Identifica-se como elemento plástico porque esses dois movimentos de vanguarda se desdobraram na literatura, no jogo de onomatopeias, expandindo-se para o desenho”, diz Andrea. Segundo ela, aqui no Brasil outro exemplo mais recente vem do grupo concretista, surgido na década de 1950.

Para a professora, é importante agregar a essa linhagem histórica o design e o caminho entre ele e a tipografia – que vem com força associado à origem dos manuscritos e das capitulares. Outro marco nessa trajetória é a invenção da técnica de impressão por tipos móveis por Gutenberg, durante o Renascimento, e a produção feita nos monastérios, que articulava as capitulares às imagens.

“Também vemos um movimento significativo da tipografia e das artes na Bauhaus – escola de artes fundada em 1919 pelo arquiteto Walter Gropius, na Alemanha, que unificou em seus estudos arquitetura, escultura, pintura e desenho industrial, disciplinas usadas para pensar a tipografia, que se torna o elemento principal”, explica.

A arte pop dos anos 1960 também é referência, ao fortalecer a integração da imagem e das palavras para construir seu apelo estético. Na opinião de Andrea, a escrita aparece de diferentes formas nos movimentos artísticos. “A letra em si é um elemento gráfico forte, pode ser usada para dar ritmo, equilíbrio, espessura, textura. Podemos criar imagens em cima da construção e desconstrução da tipografia”, acrescenta. “Outro exemplo são os ‘lambe-lambes’ espalhados pelos muros das cidades, que têm um rico elemento visual.” Entre realizadores contemporâneos que fazem uso diferente da tipografia, Andrea cita o artista gráfico israelense Oded Ezer, a brasileira Fernanda Talavera e a americana Barbara Kruge.
 


André Valente, Inventário (foto: Julia Parpulov)
 


Junior Suci, Adultério
 


Nazareno, Está Tudo Aqui (foto: Gui Gomes)



Carlos Contente, Panelinha (foto: Camila Picolo)



Pedro Franz, Incidente em Tugunska



Pedro Franz, Incidente em Tugunska



Silvan Kälin, Solta ou Prende



Silvan Kälin, Solta ou Prende

 

Narrativa visual

Exposição apresenta trabalho de artistas que exploram as diferentes possibilidades do desenho


A proposta da mostra Compulsão Narrativa, que pode ser vista até 22 de fevereiro, no Sesc Vila Mariana, é apresentar ao público a relação entre desenho e narração por meio do trabalho dos artistas André Valente, Carlos Contente, Diego Gerlach, Eduardo Belga, Elisa Carareto, Federico Lamas, Júnior Suci, Lucas Gehre, Nazareno, Pedro Franz, Silvan Kälin e Tiago Judas.

A ideia surgiu quando a equipe da unidade analisou a produção de desenhos no circuito de publicações independentes. Foram, então, reunidos diferentes artistas que trabalham com ilustração e, ao observar o conjunto selecionado, notou-se o fio condutor da narrativa em destaque nos trabalhos.

Júnior Suci tem sua produção voltada à narrativa – “vista como pequenas variações de uma mesma [situ]ação” –, em desenhos concebidos em série e numa sequência. Participa da mostra com duas novas séries e um objeto. “Nesses novos trabalhos a narração transita entre o humor e a tragédia, abordando situações que beiram o ridículo”, detalha. “Os títulos são sugestivos e complementares nesse processo narrativo, facilmente identificável pelo público.”

Para complementar a programação, houve uma atividade chamada Oficina – Cuspindo Histórias em Quadrinhos, com os artistas Tiago Judas e Júnior Suci e o criador da comunicação visual da mostra, Victor Gáspari.

Daniela Avelar, técnica do Núcleo da Imagem e da Palavra do Vila Mariana, núcleo responsável pela exposição, detalha que o mote inicial da mostra surge de um olhar para a produção desenhada presente no circuito das publicações independentes. “As imagens apresentadas por esse universo sugeriam diversos caminhos a serem trilhados no ‘desenho’ da exposição. Um ponto de contato entre os trabalhos que se mostrou relevante foi a forte necessidade de criar narrativas por meio do desenho. Na contramão da necessidade de classificar as coisas para, só assim, compreendê-las, reunimos simplesmente desenhos – sem nenhuma intenção de classificá-los. Apenas nominamos esse conjunto como ‘compulsão narrativa’, pois falam diretamente sobre a necessidade humana de contar e criar estórias, a fim de organizar ou tentar criar novos sentidos para o mundo. Com isso, apresentamos diferentes modos de habitar o desenho e permitir que essas estórias povoem nosso espaço”.

Até fevereiro, a programação paralela continua em sessões de cinema de animação (infantil e adulto), contação de histórias, oficinas e bate-papos abordando as questões da narrativa e do desenho. Para saber mais consulte a programação do Em Cartaz.


Em cartaz até 22 de fevereiro, a mostra Compulsão Narrativa exibe trabalhos de artistas que pensam os diferentes sentidos da palavra desenho.” Considerando o suporte original de cada desenho – seja revista ou meio digital – foi lançado aos artistas o desafio de refletirem sobre a transposição desses trabalhos para o espaço expositivo”, conta Daniela Avelar, técnica do Núcleo da Imagem e da Palavra do Vila Mariana, núcleo responsável pela exposição.




Frederico Lamas, Juan Carlos