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Futebol e arte

 

 

ARTE FUTEBOL CLUBE

Com a proximidade da Copa, a cidade ganha vários eventos sobre o rico universo por trás da bola rolando no campo


Está aí assunto que dá pano para manga: futebol. No imaginário popular, provavelmente só perde para temas clássicos como amor, poder e cobiça. Mas, em ano de Copa, não há dúvida. É o centro das atenções em conversas em casa, no trabalho e em bares espalhados por todo o país. Quanto à origem do futebol no Brasil, há quem diga que essa história começou antes de Charles Miller trazer uma bola e um jogo de camisas da Inglaterra para cá, em 1894. Algumas versões sobre a primeira vez em que a gorduchinha correu por aqui dão conta de que isso aconteceu em 1878, quando marinheiros ingleses teriam pedido autorização à princesa Isabel para jogar uma pelada em seu quintal na Rua do Roso, no Rio de Janeiro. Mas também corre que o primeiro jogo teria sido em Paranapiacaba, cidadezinha no alto da Serra do Mar, em São Paulo, construída no século 19 pelos funcionários da companhia inglesa São Paulo Railway Company. No Rio ou na serra, o fato é que, do início do século 20 para cá, a bola nunca mais parou de rolar em gramados brasileiros. Da época da princesa até hoje, chegamos ao pentacampeonato mundial, e temos em nossa constelação craques como Pelé, Garrincha, Tostão, Romário, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e muitos outros mais. Todo esse espetáculo acabou indo muito além das arquibancadas dos estádios, da disputa de torcida, da discussão em mesa de bar, e virou assunto de outras instâncias da vida nacional, como a pintura, literatura, as telas de cinema, crônicas de jornais, e por aí vai. (veja boxe: Flerte futebolístico) "Escrever sobre futebol não é muito diferente de escrever sobre qualquer outro tema, mas tem uma vantagem: em algum momento você vai ter um jogo decisivo, um jogo que corresponde ao embate entre o mocinho e o bandido. E isso facilita um pouco", conta o jornalista, roteirista e escritor José Roberto Torero. Santista roxo, é autor de três livros sobre o assunto, Santos, Um Time dos Céus (DBA, 1998), Futebol É Bom pra Cachorro (Panda Books, 2002), em parceria com Marcus Aurelius Pimenta, e a ficção infanto-juvenil Uma História de Futebol (Objetiva, 2002). Esse último conta a história de um menino que jogou futebol com Pelé na infância, e virou um belíssimo curta-metragem dirigido por Paulo Machline. O filme chegou a concorrer ao Oscar 2001. De onde vem tanta paixão pelo futebol? "Sou alvinegro da Vila Belmiro, o Santos vive no meu coração. É o motivo do meu riso, de minhas lágrimas e emoção", diz Torero. Ele só não anda muito feliz com o esporte. "Como anda nosso futebol? Na Europa", lamenta. Para celebrar essa paixão que em várias ocasiões se transforma em arte, até o fim da Copa 2006 algumas unidades do Sesc São Paulo incluíram em sua programação diversas atividades em que a bola na rede faz muito mais que gol.


Charges que dizem tudo
Em 2002 a dupla de cartunistas Jal e Gual participou no Sesc Ipiranga da exposição Técnicos, Deuses e Diabos na Terra do Futebol. Desde então, eles se apaixonaram pelo tema e iniciaram uma pesquisa mais profunda por meio das charges. "Entramos em contato com os desenhistas vivos e as famílias dos que já tinham morrido, para conseguir autorização para produzir um livro que falasse de futebol por meio de charges", diz Jal. A História do Futebol no Brasil Através do Cartum saiu em 2004 (Bom Texto) após três anos de pesquisa, e reúne charges publicadas entre o início do século passado e o ano em que o livro chegou às livrarias. "Embora o título tenha o termo cartum, o correto é charge, que abrange um conteúdo maior", explica Jal. A boa nova para os aficionados do campo é que o livro já deu seu primeiro filhote. Em cartaz no Sesc Ipiranga até 21 de maio, a exposição A História do Futebol no Brasil Através da Charge reúne 72 painéis e mais de 300 desenhos sobre o tema, incluindo os fatos mais importantes do mundo do futebol em 2005. Quais, por exemplo? "Bem, o Tevez foi eleito o melhor jogador brasileiro do ano", brinca Gual, santista por convicção, com o fato de o atacante do Corinthians, o argentino Carlos Tevez, ter ganhado o título de melhor jogador do Brasil no ano passado. Entre as novidades, o cartunista destaca também o troféu Bola de Ouro, que deu a Ronaldinho Gaúcho o título de o melhor jogador do mundo, a máfia dos juízes brasileiros e o tricampeonato do São Paulo no mundial de clubes. A exposição ocupará grande parte da unidade, com direito a caricaturas em tamanho real de alguns convocados da seleção brasileira ensaiando uma partida no quintal. Entre os caricaturistas reunidos, há nomes como Ziraldo, Paulo Caruso, Henfil, Angeli, Spacca, Zélio e muitos outros. "Diria que o futebol é unha e carne com os cartunistas, pois o torcedor já está acostumado a ver a repercussão de seu time através das charges. Quem não gosta de levar uma charge sobre a derrota do time do amigo pra rodinha no boteco? É difícil pensar em futebol sem pensar nas charges e caricaturas", diz Jal, palmeirense fanático.



No âmbito das artes plásticas em geral, essa proximidade nem sempre pode ser constatada. Essa é, por exemplo, a opinião do cartunista Spacca, que tem charges no livro e na exposição do Sesc Ipiranga. "As artes plásticas no século 20 eram meio elitistas. Ou eram abstratas e herméticas demais ou retratavam imigrantes paupérrimos. A música popular acompanhou mais de perto o futebol. E, no cinema, tem também o fantástico filme Boleiros, de Ugo Giorgetti", diz ele. Spacca também não anda muito contente com o futebol brasileiro. "Estamos a reboque do futebol mundial, que por sua vez é uma máquina de merchandising em cima de megaestrelas. Um Ronaldinho ganha 100 mil vezes o queum jogador normal ganha - você acha que ele é 100 mil vezes melhor que outro jogador?", desafia. Outro amante da bola que engrossa o coro dos descontentes com o futebol brasileiro é o próprio Ugo Giorgetti, diretor de Boleiros e Boleiros 2, recém-lançado nos cinemas. Em breve as duas fitas também poderão ser encontradas nas locadoras em formato DVD. "O futebol é uma questão de segurança nacional, a auto-estima do povo está muito ligada ao futebol. É uma diminuição do país quando a gente vê seus ídolos jogando no Real Madrid. Eu acho que tão importante quanto o Bolsa-família é ter o Ronaldinho jogando aqui, com estádio cheio. Isso é diversão popular, é lazer", diz ele, que também se incomoda com o marketing agressivo nos gramados. "Eu acho um absurdo essas empresas patrocinadoras influenciarem o clube. É tanto, que, de repente, até os tradicionais uniformes foram modificados. Eu sinto falta até dos inimigos. Ainda gostaria de ver o Corinthians sempre de calção preto e camisa branca, que é o que eu vi a vida inteira. É incrível como o próprio dirigente está desvinculado do futebol, pois hoje em dia é um cara que não tem força para dizer que não se pode mexer na camisa", diz o diretor e torcedor do Palmeiras.



No foco
No Sesc Vila Mariana, a diversão fica por conta da exposição Brasileiros Futebol Clube, que reúne 18 fotos em preto e branco, captadas pelo fotógrafo Ed Viggiani, um amante do universo dos gramados. As fotos fazem parte de seu livro Brasileiros Futebol Clube (Editora Tempo d'Imagem), que tem lançamento marcado para maio em São Paulo. "Trata-se de um livro sobre a paixão dos brasileiros pelo futebol. Daquele universo que inclui futebol de várzea, de praia, torcida etc. Um livro de quem joga por prazer", conta Viggiani. Na unidade, a exposição fica em cartaz de 17 de maio a 18 de junho.




Bola na tela
Do outro lado da cidade, no Sesc Itaquera, a bola será a atriz principal da programação de filmes da unidade. Nos dias 13 e 14, às 15 horas, será exibido O Dia em Que o Brasil Esteve Aqui, documentário dirigido por Caíto Ortiz e João Dornelas. O filme mostra o futebol extrapolando as fronteiras do gramado. Trata do episódio em que a seleção brasileira de 2004, do técnico Carlos Alberto Parreira e com craques como Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho, foi jogar no Haiti contra a seleção local. O mais pobre país das Américas vivia uma situação de guerra e o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, propôs o "jogo da paz". O documentário registra a presença dos brasileiros desfilando pelas ruas do país, criando um evento capaz de suspender, ainda que provisoriamente, a inquietação social que vinha sendo levada às últimas conseqüências. Em 20 e 21 de maio será a vez de o documentário Ginga ser exibido na unidade. O filme, que tem a direção de Hank Levine, Marcelo Machado e Tocha Alves, aborda uma questão que deixa o mundo com a pulga atrás da orelha: teria mesmo o jogador brasileiro um jeitinho próprio de jogar? Existe mesmo a tal da ginga? Por fim, no último fim de semana de maio, o título a ser exibido será Pelé Eterno, de Aníbal Massaini Neto. Nessa produção, a vida do craque Pelé é mostrada através de depoimentos de ex-jogadores, amigos e celebridades, com vários de seus gols, principais jogadas e fatos que marcaram sua carreira.


Saiba mais:

Na rede
http://cidadedofutebol.uol.com.br/site/
www.pele.net

http://charges.uol.com.br/gifsdefutebol.html
http://www.futnet.com.br/


Para ver na rede
Barbosa, de Jorge Furtado (1988)
http://www.portacurtas.com.br/pop_160.asp?Cod=150&Exib=1

Uma História de Futebol (1998)
http://www.portacurtas.com.br/pop_160.asp?Cod=1349&Exib=1

Guadalajara 70, de Felipe Nepomuceno (2002)
http://www.portacurtas.com.br/pop_160.asp?Cod=1785&Exib=1


Na livraria
Brasil, um Século de Futebol, de João Maximo, Leonel Kas e Jayme Accioly (Ed. Aprazível, 2006, R$ 115, preço médio)
Dicionário de Futebol, de Haroldo Maranhão (Ed. Record, 1998, R$ 40, preço médio)

 

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veja boxe Flerte futebolístico

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Flertes futebolísticos

Diferentes modos de expressão artística retratam a realidade para várias gerações de apaixonados pela bola na rede. A seguir, alguns exemplos

O futebol na pintura
O pintor paulista Candido Portinari costumava retratar em suas telas temas da vida brasileira. Em 1935, o pintor retratou o esporte, na tela batizada de Futebol. Vários outros pintores homenagearam a arte da bola, como Cláudio Tozzi, Ivald Granato, José Roberto Aguilar, José Zaragoza, Nelson Leirner, Roberto Magalhães, Rubens Gerchman (ao lado), Aldemir Martins e Francisco Rebolo. Este último amava tanto o esporte que se tornou jogador e passou por clubes como São Bento e Corinthians, entre 1917 e 1934, quando pendurou as chuteiras. Em 1936, concluiu a tela também chamada Futebol, e durante toda a vida esteve ligado ao clube do coração, o Corinthians, cujo escudo foi reformulado por ele em 1933, quando ganhou a âncora e os remos.

MPB se rende aos encantos do gramado
Um dos maiores compositores do Brasil nas décadas de 30, 40 e 50 foi o gaúcho Lupicínio Rodrigues. Em 1959, ele compôs o hino de seu time do coração, o Grêmio Futebol Porto Alegrense, de Porto Alegre. Comenta-se que ele o teria escrito durante uma greve de bondes. Ao ver os gremistas irem a pé assistir a uma partida, o músico teria se inspirado.

O futebol é tema na obra de vários compositores do país. Jorge Ben Jor é um bom exemplo. Algumas de suas músicas que mencionam o futebol são: Deixa o Menino Brincar (1965), País Tropical (1969) e Fio Maravilha (1972) - a mais emblemática, em homenagem a Fio, atacante do Flamengo na época. Em África Brasil (1976), disco que marca a transição do violão para a guitarra na carreira de Jorge Ben Jor, a música Camisa 10 da Gávea homenageou Zico.

A bola na escrita
Em 1959, o dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho, o Vianninha, do famoso grupo Teatro de Arena escreveu a peça Chapetuba Futebol Clube. O texto usa as relações entre os jogadores de futebol como uma metáfora para falar da realidade brasileira e do problema da solidariedade social. Entre outros escritores que exaltaram ou criticaram o esporte, merece destaque o dramaturgo Nelson Rodrigues, o qual, especializado que era em paixões, escreveu também sobre a paixão nacional. Ainda que não tenha produzido especificamente nenhum romance, conto ou peça que tivesse o futebol como tema, as crônicas esportivas, escritas entre os anos de 1950 e 1970, formam um capítulo à parte em sua obra.


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