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Esporte

Revista - maio 2006

 

 

Vou de bike

Mais que um meio de lazer, a bicicleta conta pontos para o bem-estar físico e mental, e ainda pode ser uma alternativa para os problemas do trânsito


"Sou eu que te levo pelos parques a correr/Te ajudo a crescer e em duas rodas deslizar/Em cima de mim o mundo fica à sua mercê/Você roda em mim e o mundo embaixo de você/Corpo ao vento, pensamento solto pelo ar/Pra isso acontecer basta você me pedalar." A visão mais que poética com a qual os compositores Toquinho e Mutinho descreveram a "magrela" na música A Bicicleta, composta em 1983 para o álbum Casa de Brinquedos, ajudou a tornar a canção eterna - e entrar para o time daquelas que, assim como História de Uma Gata, de Chico Buarque, é tida como música de criança, mas muita gente grande canta até hoje. Na verdade, a perenidade da canção reflete a eternidade da própria "musa inspiradora" da obra: a bicicleta. Afinal, entra ano, sai ano, surgem videogames com interatividade que beira a realidade, celulares que tiram fotos e baixam filmes, e tocadores de mp3 que guardam milhões de músicas, mas ainda não inventaram uma criança ou um adulto que não goste de andar de bicicleta. Ah, sim, existem os que não sabem, mas esses, certamente, morrem de vontade de aprender.


É sempre bom lembrar que, além do prazer e da ludicidade, a bicicleta está ligada à qualidade de vida e pode significar uma alternativa para o caos no trânsito das grandes cidades. "Se no princípio a bicicleta foi inventada com a finalidade de proporcionar uma atividade de lazer, ao longo do século 20 ela se transformou em um importante meio de transporte, e, mais recentemente, em um mediador de saúde", explica Katia Rubio, professora do Núcleo de Psicologia do Esporte da Universidade de São Paulo (USP) e uma das participantes do Seminário Ciclovida, realizado pelo Sesc Santos em abril (veja boxe Duas rodas, muitas possibilidades). "A necessidade de ação do usuário retira-o de uma condição passiva a que outros meios de locomoção movidos a motor obrigam, afastando-o do sedentarismo e dos problemas físicos dele advindos." Entre os benefícios físicos que o uso da bicicleta traz, a professora ressalta ainda que, por implicar movimento, pedalar torna-se um exercício constante de atenção e equilíbrio, que pode proporcionar bem-estar psicossocial por incentivar a sociabilização.


 

"O mundo embaixo de você"
Se existe uma pessoa que pode falar sobre a satisfação de andar de bicicleta, esse alguém é Argus Caruso, o ciclista que deu a volta ao mundo sobre duas rodas. "Como toda criança, eu sempre gostei de bicicleta", conta. "Mas só acreditei que realizaria uma grande viagem quando fiz minha primeira pedalada longa, em 1997, percorrendo Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Foi quando percebi que, tendo tempo, conseguiria chegar a qualquer lugar." E chegou mesmo. De 2001 a 2005, divulgando seu projeto Pedalando e Educando - por meio do qual levou fotos, vídeos e histórias de suas viagens a mais de 100 escolas -, o ciclista, que também participou do Ciclovida, visitou 28 países. Em suas andanças passou por regiões do mundo em que a magrela é muito usada como meio de transporte. "São muitos os exemplos bem-sucedidos", conta. "Kuala Lumpur, capital da Malásia, possui vias exclusivas para motos e bicicletas. Já em Paris, na França, nas áreas onde não existe ciclovia, as bicicletas dividem o espaço com os ônibus. Em compensação em Liubliana, capital da Eslovênia, praticamente toda a cidade possui ciclovias usadas por famílias, trabalhadores, estudantes, crianças e idosos." O ciclista diz estar convicto de que, para isso acontecer por aqui, "basta a criação das ciclovias pelos governantes, que o resto a população fará naturalmente".


A hegemonia do automóvel
Mas por que será então que em São Paulo essa moda não pega? "O grande obstáculo é que há uma forte economia baseada no automóvel", responde o arquiteto e urbanista Antonio Miranda, assessor do Ministério das Cidades, palestrante do Ciclovida. "E isso é difícil reverter em curto e médio prazo, mas é preciso começar." Mesmo reconhecendo os problemas que caracterizam uma megalópole como São Paulo, Miranda pode ser considerado um otimista: "Não existe cidade perdida para uma causa", afirma. "No momento em que os congestionamentos forem se tornando insustentáveis do ponto de vista de tempo, custo, estresse humano e causa de fortes danos à saúde, e houver aumento substancial da infra-estrutura para as bicicletas, as pessoas irão racionalizar mais o uso do automóvel." Entre as cidades onde a bicicleta conquistou terreno, o arquiteto cita Tóquio, capital do Japão, em que 25% das viagens por motivo de trabalho são realizadas de bicicleta; Moscou, capital da Rússia, onde o percentual é de 24%; Copenhagen, na Dinamarca, que mostra impressionantes 35%; e até Nova York, mais especificamente na agitada Manhattan, onde 6% das viagens são feitas de bike, como se chama a magrela em inglês. Aqui, segundo dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), a bicicleta é responsável por 7,4% dos deslocamentos urbanos... só que em todo o país. Ou seja, temos chão pela frente ainda.


Saiba mais:

www.antp.org.br
www.cidades.gov.br

www.viaciclo.org.br

 

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Duas rodas, muitas possibilidades

Seminário no Sesc Santos analisa as várias facetas da bicicleta

Instrumento de lazer, mediador de saúde, meio de transporte, brinquedo de criança. A bicicleta, e todas as suas utilidades, foi o centro das discussões no Seminário Ciclovida, realizado pelo Sesc Santos em abril. A ocasião reuniu diversos usuários ou entendidos na magrela. Entre eles, o jornalista Ruy Castro - ciclista de carteirinha -, que abriu o evento falando do papel da bicicleta na sociedade, os cicloturistas Argus Caruso e José Antonio Ramalho, que já giraram pelo mundo em duas rodas, a coordenadora da Viaciclo, a Associação dos Ciclousuários de Florianópolis, em Santa Catarina, Giselle Xavier, e o arquiteto e urbanista Antonio Miranda, assessor do Ministério das Cidades. O objetivo do evento foi discutir a utilização da bike na era dos automóveis, assim como as necessidades imediatas para a expansão de espaços especialmente reservados para ela. Entre os temas abordados, a relação histórica entre o homem e a bicicleta e os significados de sua utilização no cotidiano das cidades e do campo. Além disso, foram discutidos o planejamento cicloviário da região metropolitana da Baixada Santista, o uso da bicicleta para além do transporte e relatos de experiências com a bicicleta. Além das palestras, o Sesc Santos realizou uma programação paralela com intervenções artísticas, oficinas e uma exposição com imagens do fotógrafo Araquém Alcântara (foto).

 

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