Cultura HIP HOP:  Resistência e Filosofia das Ruas – Os anos 1980

25/08/2022

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Entre os meses de agosto e setembro, o Sesc Campo Limpo apresenta um conjunto de programação que celebra a cultura e a história do Hip Hop no Brasil, dos anos 1980 aos dias atuais. Com apresentações musicais, rodas de conversa e oficinas, as ações terão a participação de importantes artistas e lideranças dos quatro elementos do Hip Hop: o Breaking, DJ, MC e Graffiti. 

Para o final de semana (05, 06 e 07/08), a celebração contou uma homenagem ao Breaking, elemento que deu início ao Hip Hop no Brasil, na década de 80.

Fotos: Zé Carlos Barretta

Conheça um pouco da história deste movimento periférico cultural e a participação feminina na construção da história. 

Os anos 1980 – Surgimento do Hip Hop no Brasil e o protagonismo das mulheres 

A história do surgimento do hip-hop no Brasil inicia em torno da década de 80, momento em que jovens se encontravam na Rua 24 de maio no centro de São Paulo, posteriormente na parte externa da estação do metrô São Bento que possuía chão liso para treinos de passos de dança de rua, além de ser um espaço amplo para encontros de diversas Crews que começavam a surgir, tanto para dançar o Breaking, como para cantar RAP ao som de toca discos e boombox que são instrumentos de simbologia forte na cultura hip-hop. 

Nesta época, a comunicação se dava por meio de cartas, matérias de jornal impresso e fanzines, este último foi a principal fonte de troca de informações sobre essa cultura que começava a ocorrer em diversos estados no Brasil. Com o tempo, a estação São Bento se tornou ponto de referência para organizações de Festivais ocorrendo campeonatos e mostra de Breaking, apresentações de grupos de rap com a presença de Mestres de Cerimônias que animavam o evento, DJs e grafiteiros que também ilustravam jaquetas e calças jeans para Crews. A São Bento, na década de 80 trouxe homens e mulheres que se deslocavam de suas cidades/estados para participarem desses encontros e festivais em São Paulo, nomes como Kika Maida, Rose MC, Sharylaine, Bete, Baby, Renata, Lady Rap, Thaide e DJ Hum, Nelson Triunfo, Nino Brown, MC Jack, Rooney Yo-Yo, dentre tantas outras pessoas que ao longo dos anos se tornaram referências como pioneiros/pioneiras construindo um legado e servindo de inspiração para a nova escola, muitos continuam até os dias de hoje, na ativa, cantando, dançando, discotecando ou grafitando, além da oralidade em que trazem da memória contribuindo para que a história seja contada e recontada legitimamente por quem vivenciou esta década. 

No entanto, é necessário evidenciar que enquanto muitos homens tiveram oportunidades de gravar LPs e se destacarem na cena do hip-hop como artistas, em matérias nos jornais, venda de discos e músicas tocadas nas rádios, o caminho das mulheres seguiu de uma forma diferente, com pouco destaque da imprensa ou investimentos de patrocinadores, a maioria das mulheres que estavam desde o início se mantiveram firmes, apoiadas muitas vezes apenas pela ideologia, estas mulheres utilizavam/utilizam o hip-hop como ferramenta de expressão, pois sentem a necessidade de levar as demandas da mulher através da arte. Um grande exemplo é a rapper Sharylaine que desde o início já participava das rodas de breaking na São Bento, cantava em eventos e formou o grupo “RAP GIRLS” junto a Citylee (o primeiro grupo a registrar uma obra fonográfica foi Bufalo Girls em 1984), ainda, no final dos anos 80 Sharylaine participou da coletânea “Consciência Black Vol.1” com a música “Nossos Dias”, sendo a única mulher no disco, cujo o destaque foi “Racionais MCs” que foi apresentado ao público com a música “Pânico na Zona Sul”. Sharylaine nunca se ausentou do hip-hop e segue carreira até hoje, o álbum solo se concretizou após 40 anos, com recursos próprios, já o reconhecimento pelo pioneirismo e protagonismo se deu após a história ser “recontada”. Hoje ela é convidada para palestras, recebe prêmios e é citada em diversos trabalhos acadêmicos sobre o tema. 

Porém, o que chama a atenção é que isso ocorreu/ocorre em diversos lugares do mundo, como por exemplo, a “não” divulgação do nome de Sylvia Robinson que foi produtora do pioneiro grupo de rap norte americano “Sugar Hill” e que ainda co-produziu “Grandmaster Flash”, levando o rap ao mundo. No Brasil, Ieda Hills escreveu uma letra de rap para que seu irmão (grupo Paradise) participasse de um festival de rap, neste evento o rapper Thaide foi apresentado ao público. Ieda Hills ao longo de sua trajetória, se aperfeiçoou em rimas, técnicas e canto, participou em diversos grupos e se destacou na música Sr. Tempo Bom de Thaide e Dj Hum, atualmente segue em carreira solo. 

A cultura hip-hop nasceu em New York, uma década antes de chegar no Brasil, e este grande evento histórico foi protagonizado por uma mulher, Cindy Campbell. Ela foi a idealizadora e primeira produtora de evento de hip-hop que ocorreu no dia 11 de agosto de 1973 (data comemorada mundialmente como o nascimento da cultura hip-hop). Cindy organizou, cobrou entrada a preço popular e juntou MCs, Djs, B.Boys, B.Girls e Graffiteiros (posteriormente a junção dos elementos recebeu o nome de hip-hop por Afrika Bambaataa), todavia, neste marco histórico, Cindy passa a ser conhecida como “a irmã” do DJ Kool  Herc – ele foi o DJ neste evento e também pioneiro na formação do hip-hop – ambos contribuíram para a união dos elementos do hip-hop em uma época em que a manifestação através da arte se fazia necessária devido a tantos problemas sociais, então faz-se justo citar o nome de ambos como precursores desta cultura que se disseminou pelo mundo. 

A década de 80 foi o início do que tornaria o hip-hop a forma de expressão principalmente de jovens que moram na periferia e que vê na cultura uma forma de denunciar, manifestar, curtir, buscar caminhos, mas principalmente encontrar uma identidade ideológica, não a toa que muitos usam a frase: O hip-hop me salvou! 

Por: Luana Rabetti 

Lunna Rabetti - Hip Hop
Foto: Zé Carlos Barretta

Historiadora, Escritora, Rapper, Produtora Cultural, Pedagoga, Mestranda na USP e Analista de Sistemas. Esta é a Lunna, mulher multifacetada, em busca por conhecimentos. 

Organizou os livros Perifeminas l, ll e lll. Participou da coletânea “Pelas Periferias do Brasil V e VI”, revista “Mulheres de Palavras”, os filmes “Pelas Margens” e “As 3 do Capão” e o documentário “O Protagonismo das Minas: A Importância das Mulheres no Rap de SP”. Em 2021 lançou a autobiografia intitulada “A vida marginal de Luana Rabetti – Entre linhas, folhas e tintas”.

Canta desde 96, participou dos CDs 12 Revelações da 105 FM, Reviravolta Máfia, Mulheres Guerreiras de Brasília e São Paulo tem a Voz. Premiada no Hutuz/RJ, Hip Hop Top/SP e Jovem em Destaque/2016 e 2021. Fundou o site Mulheres no Hip Hop premiado com o certificado do Cultura Viva comunicação. Fundadora e presidente da coletiva FNMH2, coordena o Quilombo da Parada, integra o Coletivo Esperança Garcia e Casa de HH Centro. É proprietária da empresa “Rabetti Produções”, produziu  Feiras Culturais, Shop Dance Festival, Festival FNMH2 e o Fórum Nacional de Mulheres, ainda levou as vencedoras do We B.Girls para a França e DJ Niely para tour na Europa. Trouxe para o Brasil, a dupla Oshun NY e Sandra Izidore.

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