A
diversidade da composição musical brasileira assegura o
alto nível da MPB
O sucesso da música
popular brasileira guarda alguns segredos. Da mistura de ritmos às
diferentes gerações de intérpretes femininas, de
Elis Regina à novíssima Ceu, passando por Marisa Monte e
Vanessa da Mata. Não se pode esquecer dos músicos, claro,
uma seara que tem professores como Paulo Moura e Nana Vasconcelos. Mas
boa música cantada e tocada é fruto da boa composição.
Noel Rosa, Radamés Gnattali, Chico Buarque, Vinicius de Moraes,
Tom Jobim (veja boxe Os inesquecíveis).
Os nomes e os estilos são muitos e, a julgar pela quantidade de
inscrições nos festivais que procuram revelar talentos -
um bom exemplo disso é o Prêmio Visa (veja
boxe Um brinde à música brasileira) -, a fonte não
vai secar tão cedo. "Há diversidades se manifestando
nos diferentes espaços oferecidos", afirma o músico
e compositor Luiz Tatit. "Existe um número expressivo de bons
compositores e intérpretes já desenvolvendo a carreira independentemente
da atenção da mídia." Para o músico,
sobretudo com as novas possibilidades de produção e divulgação
que a internet oferece, pode-se esperar uma produção cada
vez mais abundante. "Nunca a música esteve tão bem
servida de criadores", observa.
O compositor, intérprete, violonista e arranjador Celso Viáfora
nem se arrisca a fazer uma lista dos nomes mais quentes do atual cenário
de compositores no Brasil. Segundo ele, seria impossível fazer
uma lista completa. "Prefiro não fazer para não ser
injusto. E fico feliz da vida por saber que somos um povo tão musical."
Linhagem de primeira
Diferentes estilos de compor formam o cenário. Há os que
se debruçam sobre a criação das letras e os que preferem
explorar o universo das notas, arranjos e harmonias. Em comum, uma familiaridade
com a música que se manifesta quase sempre desde muito cedo, o
que traduz um pouco o que Viáfora chamou de "povo tão
musical". Um bom exemplo é o de Dante Ozzetti, vencedor da
3ª edição do Prêmio Visa, realizada em 2000,
na categoria compositores. O músico começou a se interessar
pelo assunto aos 9 anos e lembra os primeiros passos. "Quando a gente
começa a estudar música, as composições passam
a ficar muito parecidas", conta. "Isso dá a sensação
de falta de criatividade, daí vem um questionamento natural. Mas,
com o passar do tempo, o conhecimento se torna naturalmente parte do processo
criativo, aí chega o momento em que é necessário
retomar o ímpeto da liberdade e o reencontro com a imaginação."
Já Chico Pinheiro, que ficou em segundo lugar no festival de 2000,
conta que sua maior fonte de inspiração são os grandes
clássicos europeus: Frédéric Chopin, Claude Debussy,
Maurice Ravel e Tchaikovsky. "Compositores irretocáveis",
avalia. "Sabiam demais seu ofício." Quando se trata dos
mais contemporâneos, Pinheiro vira a antena na direção
do norte-americano George Gershwin e dos brasileiros Tom Jobim, Edu Lobo
e Moacir Santos. "Profundamente técnicos, mas também
muito intuitivos, são craques." Celso Viáfora conta
que começou a compor "por brincadeira" e que só
depois de estar com o trabalho mais estruturado - já tendo participado
de festivais e com alguns shows no currículo - é que sentiu
a necessidade de se dedicar ao estudo formal da música. "Mas,
mesmo depois de tudo isso, olho para mim mesmo e vejo que continuo compondo
por prazer", diz o músico. "Claro que me tornei muito
mais autocrítico, cuidadoso, quase chato - a ponto de demorar um
ano para terminar um verso, como já aconteceu uma vez -, mas crio
por prazer, movido ainda pela emoção."
Independentemente do caminho escolhido, o toque especial do compositor
brasileiro continua fazendo da MPB - termo que vem abrangendo cada vez
mais ritmos e experimentações - um capítulo à
parte na cultura nacional. "Os bons compositores são aqueles
que instigam a linguagem da composição, desde os que se
utilizam dos recursos tradicionais aos que se apropriam da tecnologia
com inteligência", conclui Dante Ozzetti.
volta
ao início
Um
brinde à música brasileira
Em
sua nona edição, o Prêmio Visa de Música
Brasileira, que neste ano bateu recorde de inscrições,
terá eliminatórias no Sesc Vila Mariana
O
primeiro Prêmio Visa de Música Brasileira aconteceu
em 1998, quando ainda se chamava Prêmio Visa de MPB, nome
que permaneceu até 2002. Em sua primeira edição,
o prêmio contemplou a categoria instrumental, na segunda,
a categoria vocal e, na terceira, a de compositores. E, assim, as
categorias instrumental, vocal e compositores se repetem a cada
ano até hoje. De julho a outubro, será realizada a
nona edição do evento, que em 2006 é disputado
na categoria compositores, com uma marca histórica: bateu
todos os recordes, com 3.255 inscrições, totalizando
13.020 músicas. Em relação à última
edição dedicada aos compositores, houve um acréscimo
de 13% no número de inscritos. Apesar de ter adquirido esse
formato somente em 1998, os embriões do prêmio começaram
a formar-se ainda nos anos 80, mais precisamente em 1985. Nessa
época, a Rádio Eldorado, de São Paulo, tinha
um prêmio de música erudita, o Prêmio Eldorado
de Música (PEM). Em meados de 1987, João Lara Mesquita,
diretor da rádio, e o maestro Nelson Ayres decidiram criar
um prêmio de música popular brasileira nos mesmos moldes
do PEM. Isso significava apresentações dos candidatos,
jurados de alta competência e boa premiação.
Em 1998, o evento ganhou novos parceiros, chegando ao formato que
conhecemos hoje. De lá para cá, nomes que vêm
se firmando no cenário musical brasileiro, como Mônica
Salmaso, Dante Ozzetti, Yamandú Costa, Chico Saraiva, André
Mehmari e Célio Barros, passaram pelo palco do Prêmio
Visa.
Para a inscrição é necessário que cada
candidato encaminhe quatro músicas ao Prêmio Visa,
que as passará a um júri. Do crivo dessa bancada são
selecionados 24 candidatos e três suplentes. As primeiras
apresentações acontecem durante as seis eliminatórias,
que desde o ano passado são realizadas no Sesc Vila Mariana.
Doze pessoas disputam as semifinais, também realizadas na
unidade. Nessa etapa, há mais quatro apresentações,
das quais saem os cinco finalistas. Na última fase, cada
músico apresenta três composições. Pelo
menos uma delas não pode ter sido exibida nem nas eliminatórias
nem nas semifinais. O felizardo que ficar em primeiro lugar, levará
neste ano um prêmio em dinheiro no valor de R$ 110 mil e mais
a gravação de um cd pelo selo Eldorado. Quem ficar
em segundo será premiado com R$ 50 mil. O terceiro colocado
receberá R$ 30 mil e os outros dois, levarão R$ 5
mil. Entre os nomes selecionados, estão alguns já
conhecidos do público. Um deles é André Abujamra,
líder da banda Karnak e responsável pela trilha sonora
de filmes brasileiros como Bicho de Sete Cabeças (2000) e
Carandiru (2002). Outra presença ilustre entre os selecionados
para o 9º Prêmio Visa será a do compositor João
Donato. Figura relevante no cenário musical carioca dos anos
50 e depois arranjador respeitado pelo time de estrelas da MPB,
ele já participou de discos de Gal Costa e Gilberto Gil e
teve uma importante parceria com João Gilberto.
volta
visite também
www.premiovisa.com.br
|
Os
inesquecíveis
Os
festivais de música dos anos 60, que revelaram nomes como
Milton Nascimento, Chico Buarque e Elis Regina, mobilizavam até
torcidas organizadas
Não é
de hoje que festivais de música mobilizam público
e músicos. O primeiro, ávido por novidades. O segundo,
por oportunidades para mostrar seu trabalho. Fazem parte da memória
dos anos 60 no Brasil os episódios que marcaram os concorridos
festivais de música. Muita gente de peso que está
aí até hoje subiu anônima, ou quase, ao palco
de muitas competições até alcançar sucesso
consistente. O auge desse tipo de evento foi entre 1965 e 1968 -
na época havia até torcida organizada.
O Festival de Música Popular da TV Record e o Festival Internacional
da Canção, o FIC, foram os de maior visibilidade.
A primeira premiação memorável aconteceu em
1965 no 1º Festival de Música Popular Brasileira - a
grande vencedora foi Arrastão, de Edu Lobo e Vinicius de
Moraes, interpretada por Elis Regina. "Esse foi um momento
muito feliz da música brasileira, mas foi também muito
curto", diz o compositor e produtor Sérgio Augusto,
que mantém um site sobre os festivais brasileiros de música.
Para o compositor, o fato de as televisões terem deixado
de transmitir as apresentações afastou o interesse
do público. "Naquela época os festivais eram
televisionados, apesar de durar meses. Que canal faz isso hoje?"
Em 1966, a Record passou a realizar o festival anteriormente feito
pela Excelsior. O segundo dessa fase é considerado o melhor
de todos. Naquele ano, a disputa foi entre A Banda, de Chico Buarque,
interpretada por Nara Leão, e Disparada, escrita por Théo
de Barros e Geraldo Vandré e interpretada por Jair Rodrigues.
No final, o júri optou por A Banda, mas a pedido do próprio
Chico foi concedido o empate. A edição do ano seguinte
também não deixou a desejar. Dela saíram músicas
como Domingo no Parque, de Gilberto Gil, Roda Viva, de Chico Buarque,
e Alegria, Alegria, de Caetano Veloso. A grande vencedora desse
ano foi Ponteio, de Edu Lobo (foto) e Capinam. Enquanto isso, no
Rio de Janeiro, o Festival Internacional da Canção
sagrava Saveiros, de Nelson Motta e Dori Caymmi. Já o segundo
FIC entrou para a história por ter mostrado Milton Nascimento
ao Brasil. Em 1967, pipocaram festivais pelo Brasil, 12 ao todo.
Fatalistas,
complacentes e otimistas
"Tempo bom que não volta mais." Esse é o
tom do discurso dos que acreditam que os festivais daquela época
não deixaram herdeiros à altura. Um deles é
o pesquisador musical José Ramos Tinhorão. "O
festival morreu", sentencia. "A tentativa de ressuscitá-los
mostra isso. Quais foram as novidades que apareceram nestes últimos?
Nenhuma! É uma repetição de novos Miltons e
novos Caetanos, fórmula que está esgotada", acredita
ele. Por outro lado, há o time dos esperançosos. Como
o compositor e professor Luiz Tatit. "Os festivais ainda estão
servindo para demonstrar a quantidade de autores desgarrados que
existe pelo Brasil afora. O número de inscrições
é sempre impressionante." Para Tatit, o Prêmio
Visa é um exemplo de busca por "um novo modelo de festival,
baseado em diversas músicas do compositor e não em
apenas uma". O produtor Sérgio Augusto é mais
otimista: "Os festivais continuam vivos, sim. Só que
migraram para o interior do Brasil, coisa que a grande imprensa
não acompanhou. Temos festivais importantes que ainda revelam
talentos". Segundo o produtor, merecem destaque, o Festival
de Avaré, no interior do estado, e o de Santa Rosa, no Rio
Grande do Sul. "Por esses eventos passaram nomes como Lenine
e Chico César", ressalta.
Fonte: www.festivaisdobrasil.com.br
volta
|
|