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Chave da memória

A longa jornada de lutas e dificuldades das jornalistas

CECÍLIA PRADA

Muitas vezes me disse, no curso dos anos tantos: "Se eu tivesse de contar a história da minha geração...", mas fiquei com a frase suspensa, na sua perplexidade. Era uma frase ótima para se começar um livro, e devo dizer que iniciei vários, vida afora, e até completei e publiquei alguns. Uma frase que dá partida a todo um processo de indagação existencial, que nos faz olhar por cima dos ombros para os companheiros geracionais, para as marcas da coletividade em nós. Os pequeninos mourões do tempo onde queremos amarrar nossa coerência – pouca, possível.

Ora, há poucos dias, folheando o livro Elas Ocuparam as Redações, de Alzira Alves de Abreu e Dora Rocha, publicado em 2006 pela FGV, deparei com dez depoimentos de jornalistas renomadas, representantes de três gerações – de Ana Arruda Callado, nascida em 1937, a Fátima Bernardes, de 1962. Um documento histórico que elucida o que tem sido a luta das mulheres, de 1950 até agora, para se inserirem em um mercado de trabalho que, de reduto fechado e quase impenetrável no Brasil de meio século atrás, atualmente conta com o predomínio do sexo feminino. Só que ainda é notória a quase ausência de mulheres nos escalões superiores. Como diz na apresentação Alzira Alves de Abreu: "Hoje, algumas mulheres são secretárias de redação, chefes de sucursal e responsáveis por colunas de prestígio. São raras, no entanto, as que participam do conselho editorial das empresas jornalísticas e que chegam ao posto de editora-chefe. Em geral não passam do nível de gerência média".

Alentada por essas colegas, permito-me lançar um olhar retrospectivo para o início de minha carreira, nos anos 1950, para a minha geração – a que tem sido vista, com ajuda do olhar meio piegas da TV Globo, como a "dos anos dourados". Uma simplificação, um clichê sedutor, que como sempre está baseado em uma verdade, mas dela só vê, escolhe e perpetua alguns aspectos ideologizados, incapazes de retratar o fluxo interior, a dinâmica de contingências, variações, paradoxos e resoluções que existe em todo fenômeno humano, individual ou social.

Se é verdade que aquele período do pós-guerra foi caracterizado por grandes mudanças políticas e sociais no plano mundial, pela reconstrução, pela esperança de paz – logo frustrada com o início quase imediato da Guerra Fria; e se, no plano nacional, foram anos duplamente esperançosos – o fim da 2ª Guerra Mundial e o da ditadura Vargas –, anos de democracia plena (ou possível), cheios ainda de inquietação, com episódios dramáticos como o suicídio do ex-ditador em 1954, mas culminados com o governo desenvolvimentista, de grande florescimento nacional, de Juscelino Kubitschek... o mundo que nos ofereciam de bandeja (parecia) já vinha irremediavelmente bichado, contaminado – fomos, é preciso não esquecer, a primeira geração da era atômica. A que foi brutalmente acordada pelas explosões de Hiroshima e Nagasaki do sono de uma adolescência abrigada. O que herdamos foi um mundo em mudança absoluta de escala – parecia que nada, do grande portfólio de idéias e atitudes que nos haviam legado as gerações de nossos pais e avós, podia ser aproveitado. Mudara o planeta, o tempo. E ali estávamos nós, jovens e perplexos, ensaiando nossos primeiros passos na universidade, mas ainda ao som, parecia, de valsas vienenses e foxtrotes de pais e avós. Para as mulheres, que somente então começavam a entrar de maneira mais normal nos cursos superiores, um desafio redobrado, é claro.

Página feminina

As discriminações – sexuais, raciais, confessionais ou etárias – raramente acontecem de maneira aberta. Elas vêm envolvidas quase sempre em pretextos embelezados, diluem-se em um caldo espesso de substratos tradicionais, para que o discriminado, e muitas vezes o próprio discriminador, não percebam com clareza o que está acontecendo. Há três anos, ao entrevistar para esta revista o veterano jornalista Mário Mazzei Guimarães – então com 90 anos –, que foi editor-chefe da "Folha de S. Paulo" na década de 1950, rememorando sua carreira ele me disse, candidamente, a horas tantas, que nunca permitira o acesso a mulheres naquele órgão, "nem mesmo à filha do Nabantino Ramos [diretor do jornal]. Ela quis ser jornalista, eu a dissuadi, disse que não era profissão para mulher". E levou o susto de sua vida quando respondi: "Pois veja como são as coisas, foi quando eu me iniciei no jornalismo. Que sorte que não fui bater à porta da ‘Folha’, senão não estaria aqui hoje, entrevistando o senhor". Acabamos rindo disso, e amigos.

Naquele momento conscientizei-me mais do que nunca da enorme importância da Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero, a primeira a funcionar no Brasil, criada em 1947 – há 60 anos redondos –, onde me formei, em 1951. Disseminando-se pelo país, essas escolas abriram para os jovens em geral, para as mulheres em particular, as portas da profissão que é reconhecida como o quarto poder. Foram – e são até hoje – combatidas, tanto as escolas como a regulamentação da profissão. Foi dura a batalha que tiveram de enfrentar os primeiros formandos. Porque, se nas redações eram poucos naquele tempo os profissionais, jornalista com carteirinha do sindicato era quase todo mundo, quem escrevia e quem nunca escrevera, jeitosos e curiosos, advogados ou outros profissionais liberais, parentes e suas primas – ter a carteirinha era um passe mágico que abria portas e garantia ingressos em muitos lugares, e valia até uma regalia mor: jornalistas não pagavam imposto de renda. Com um depreciativo "jornalismo não se aprende na escola, é só tarimba", muitas empresas importantes rejeitaram (e rejeitam até hoje) os profissionais diplomados, porque à sua estrutura financeira interessava mais o não-regulamentado, o provisório, o romântico que fazia "bico" ou escrevia por gostar, ou por vício.

As pouquíssimas mulheres encontradas na grande imprensa deviam limitar-se às páginas femininas ou às colunas sociais. Em 1978, entrevistando para a revista "Istoé" a veterana jornalista Helena Silveira, ela me falou do início de sua carreira nas Folhas: "Meus colegas me tratavam bem, com benevolência, como se se tratasse de alguma criança-prodígio que conseguia escrever. Mas tão bem que para me protegerem melhor vedaram-me o acesso à redação. Deram-me a crônica social, é claro. Embora logo eu conquistasse todo um caderno, também com literatura, artes e moda, tinha de escrever sozinha, numa sala separada. E quando o meu sucesso começou a aumentar, a benevolência de muitos colegas transformou-se em azedume".

Raríssimas foram as repórteres, até a década de 1960, no jornalismo brasileiro – deixaram fama, como Isa Silveira Leal, Dinorah do Valle e Margarida Izar, que pertenceu ao grupo de fundadores do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, em 1937, e Albeniza Garcia, no Rio de Janeiro. Mesmo as jornalistas formadas continuaram a ser encaminhadas, como sempre, para as "frivolidades" femininas... Era isso o que se esperava delas. Como testemunha minha colega da Cásper Líbero, Regina Helena de Paiva Ramos: "Assim que me formei, em 1952, consegui trabalhar como repórter em um jornal, por pouco tempo. Mas logo fui chamada para substituir Maria Antonia Franchini Neto, na ‘Página Feminina’ da ‘Gazeta’ – onde fiquei diversos anos. Lembro que minha mãe, muito contente, me disse: ‘Agora, sim, enfim você vai fazer algo mais próprio para uma moça’".

E depois de criado o Prêmio Esso de Reportagem (em 1955), foi preciso que se passassem 25 anos para que uma mulher o recebesse pela primeira vez, individualmente e em âmbito nacional (em 1980): eu própria. Prioridade em que me mantive por 21 anos, pois somente em 2001 outra jornalista também o receberia.

Paisagem na neblina

Arranha-céus "mais altos do que o Martinelli!" começavam a estabelecer sua rivalidade na neblina paulistana, e uma série de importantes eventos culturais, em fúria cumulativa, compensava São Paulo do marasmo da década anterior. Enquanto no ensino superior, que começava a se abrir para a classe média, planejava-se já a reforma que substituiria, dez anos mais tarde e com resultados desastrosos que perduram até hoje, a cultura humanística pela tecnológica, a euforia econômica fazia surgir instituições como o Teatro Brasileiro de Comédia, o Museu de Arte Moderna, o Museu de Arte, a Escola de Arte Dramática, a Companhia Cinematográfica Vera Cruz.

Com 1,5 milhão de habitantes, São Paulo sonhava ultrapassar o Rio de Janeiro – o que enfim aconteceria em 1954. Dizia-se com assombro que era "a cidade que mais cresce no mundo", identificando aumento populacional com progresso. Mas era ainda uma cidade humana, e até bastante provinciana. Pela paisagem passavam os tranqüilos bondes vermelhos, abertos ou fechados, os "camarões". E até um havia que parecia mestiço de trem, porque era diferente, amarelo, apitava e ligava o centro com um bairro longínquo e deserto: Santo Amaro.

A primeira arregimentação grevista de que participei como universitária, com muito orgulho, em 1948, tinha motivo bem pífio: o aumento das passagens de bonde. Criada pouco depois para englobar as várias companhias particulares, a CMTC [Companhia Municipal de Transportes Coletivos] acabou logo batizada de "Custa Mais Trinta Centavos" pelo povo, já exasperado com o crescente aumento do custo de vida.

A geração que chegava à cena, nascida e criada sob a ditadura Vargas, ainda não se situara politicamente – mas também não havia nada de apaixonante na morna disputa entre o brigadeiro Eduardo Gomes e o marechal Dutra... A pouquíssima conscientização política concentrava-se na Faculdade de Filosofia "da Praça" (da República), que naquele tempo ainda funcionava no prédio da Escola Caetano de Campos e depois seria transferida para a Rua Maria Antônia. E, tradicionalmente, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – onde persistia, marcante, a memória dos estudantes metralhados por ordem de Getúlio Vargas em 1943. No Centro Acadêmico XI de Agosto, presidia José Antônio Rogê Ferreira – que em 1964, depois do golpe militar, já deputado, mostraria toda a sua repugnância por um colega de Câmara servil ao poder brindando-o com uma cusparada no rosto.

Mas a histórica faculdade, que desempenhou sempre papel relevante na política do país, representava, em muitos de seus aspectos, velhas instituições do passado: uma delas, a autoridade da cátedra. Nas suas togas, os catedráticos se faziam chamar de "excelência" e punham entre eles e os alunos a altura e a distância de sua posição imponente, a amplidão das enormes salas de aula. Rançoso, o ensino de direito, como todos os outros, cristalizava-se em fórmulas ruminadas em extensas apostilas. Contra tudo isso se faria uma primeira revolução estudantil em 1950, liderada por Aurasil Brandão Joly.

A escritora Renata Pallottini fala desse tempo: "Éramos ‘as meninas da faculdade’, cavalheirescamente nossos colegas nos ‘protegiam’, e nós, sensibilizadas e bobocas, aceitávamos sem questionar essa ‘proteção’. Como não questionávamos outras coisas que não nos permitiam. O acesso às dependências do Centro Acadêmico XI de Agosto – ao qual pertencíamos e pelo qual batalhávamos – nos era simplesmente vedado. Só muito mais tarde é que paramos para pensar sobre isso. E sobre outras coisas. Por exemplo, a lenda de que as Arcadas foram um centro literário importante no país. Nas décadas de 1950 e 60, a literatura permitida na faculdade era retórica e conservadora. Os irmãos Haroldo e Augusto de Campos cursaram a São Francisco, e ninguém os percebeu na época. O mesmo aconteceu com Mário Chamie".

Chá e preconceitos

As pessoas tinham tempo para tomar chá, na Confeitaria Vienense, no Fasano, nas leiterias Americana e Campo Belo, no Mappin – que era loja podre de chique, com crediário para as melhores famílias, e na qual os mortais comuns só entravam vencendo a timidez, nos primeiros tempos, mas que aos poucos foi rebaixando seus padrões até se tornar o estabelecimento mais popular do centro. Naqueles anos, seu restaurante, muito fino, concentrava homens de negócios no almoço; depois, aparelhava-se para o chá – bem ao estilo inglês, mas antecipado para as quatro horas. Era um ponto de referência da cidade, na Praça Ramos (marcava-se encontro "debaixo do relógio do Mappin"), capaz de misturar vários segmentos da população.

Enquanto isso, no reino das meninas encantadas da classe média – que faziam o footing na Rua Barão de Itapetininga sonhando com o príncipe encantado que viria em um Cadillac conversível –, a moda eram as luvinhas de crochê para os trajes de passeio e as luvas de cano longo para os vestidos tomara-que-caia. Havia as festinhas de 15 anos ao som de Benny Goodman, Glenn Miller, matinês dançantes em alguns clubes e mil bailes de formatura "com traje a rigor", em que as mocinhas rodopiavam em vestidos longos e rodados de faille, organza ou tule – os bailes de conclusão dos cursos do CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva), em que eram madrinhas dos garbosos rapazes fardados, constituíam petisco especial. Virgindade? O assunto nem era discutido nas famílias. Em um tempo em que a pílula anticoncepcional ainda não havia sido inventada, todo mundo se casava direitinho, de grinalda e véu, nas igrejas da moda, a do Carmo, na Rua Martiniano de Carvalho, a de Santa Teresinha, na Rua Maranhão, a Nossa Senhora do Brasil ou o Santuário do Sagrado Coração de Jesus.

Pessoas desquitadas, principalmente do sexo feminino, eram tidas em santo horror, escondidas ou proibidas pelas famílias. Mães solteiras, "produções independentes", nem pensar. E os casais fora da lei tentavam justificar sua posição com um vago "casamento no Uruguai". Em 1951, quando o deputado Nelson Carneiro começou sua longa campanha pela lei do divórcio – que era considerado pelas famílias como "prostituição disfarçada" –, a Faculdade de Direito não lhe permitiu ocupar nenhuma de suas salas para a conferência que marcara. À falta do que o deputado, seguido de pequena multidão, improvisou discurso no próprio pátio das Arcadas, num tumulto que teve de tudo, de guarda-chuvadas a gente indignada trepando em cadeiras e delas caindo.

A escritora Maria de Lourdes Teixeira contava como o próprio arcebispo dom Duarte Leopoldo e Silva fora visitá-la, para tentar convencê-la a não se separar de seu primeiro marido para ligar-se ao crítico e escritor José Geraldo Vieira, pois isso seria um inadmissível mau exemplo para as famílias paulistas. As sanções sociais eram muito concretas e atingiam sem piedade os que ousavam desafiar a sociedade estabelecida – o jornalista e acadêmico Silveira Peixoto, falecido em março de 2006, costumava contar como fora demitido abruptamente e sem apelação de seu cargo de professor da Cásper Líbero, ao separar-se e casar-se pela segunda vez.

Naqueles tempos pré-Vaticano II, outros bispos iam ainda mais longe, no seu zelo apostólico: como o de Bragança Paulista, dom José Maurício da Rocha, que ameaçava com excomunhão, nada menos, as moças que usassem calças compridas ou freqüentassem a piscina do clube local em períodos mistos. Sim, porque o comum nas piscinas eram horários separados para rapazes e moças, da mesma forma como acontecia em estabelecimentos religiosos de ensino. O cardeal dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta também queria excomungar as famílias que recepcionassem um célebre casal de divorciados que nos vinha visitar, o duque e a duquesa de Windsor. Ao mesmo tempo, o conde Matarazzo lançava excomunhões sociais contra os casais "sem papel", excluindo-os da lista de convidados de uma fenomenal festa de casamento que deu para sua filha Filly.

E quando o Teatro Brasileiro de Comédia ousou apresentar peças de Sartre, como Entre Quatro Paredes (Huis Clos) e A P... Respeitosa (La Putain Respectueuse), mesmo com o título assim reticente, foi um deus-nos-acuda, e lá veio o bispado com mais excomunhões em riste... ao que parece, nunca concretizadas, porque o teatrinho famoso continuava cheio e os espectadores não se impressionavam muito com a ameaça de um auto-de-fé.

Escândalos literários

Em 1948 um "escândalo literário" atingiu a família paulistana. Só superado em importância, dizia-se, pelo provocado com a publicação de A Carne, de Júlio Ribeiro, no final do século 19. Tratava-se de Presença de Anita, um romance que contava – horror! – que mulher também era ser dotado de sexo, erotismo, e até de maldade. O cardeal estava para lançar mão de mais um anátema, mas recuou, prudente: a proibição só aumentaria as vendas, pois o livro já atingira 15 edições, para gáudio da José Olympio Editora, que com ele se safara da falência. Deu filme também, em 1949, e recentemente uma minissérie na TV. De tão ingênuo, é hoje livro que não se consegue ler. Naquele tempo, valeu para seu autor, o campineiro Mário Donato, longa carta de protesto publicada como matéria paga nos jornais, onde senhoras da sociedade protestavam, indignadas, "por Campinas ter filho tão imoral".

Dizia-me o escritor, em entrevista feita em 1978: "Não é de espantar o que aconteceu com meu livro. Para se ter uma idéia da pudicícia daqueles tempos, basta lembrar que um jornal como ‘O Estado de S. Paulo’ não publicava, por impróprio, nem anúncio de remédio contra hemorróidas. Ou do Tônico Nervet, que era descrito como ‘estimulante sexual’ ".

Artistas e intelectuais, gente teimosa, continuavam a produzir. E a chocar. Helena Silveira e Jamil Almansur Haddad foram os responsáveis por outra barulheira infernal. Acontecera na cidade um crime dos mais horripilantes: um pacato rapaz, professor universitário que vivia com a mãe e duas irmãs solteironas numa casinha da Rua Santo Antônio, as fez primeiro confeccionar mortalhas pretas, dizendo que eram aventais necessários ao seu trabalho de laboratório. Depois abateu-as a tiros e as jogou no fundo do poço do quintal, enroladas nas próprias mortalhas que haviam costurado. Quando a polícia descobriu, ele se suicidou.

O material deu origem a quatro grandes artigos de Oswald de Andrade, intitulados "Crime e Castigo". Helena e Jamil aproveitaram o tema para uma peça teatral, No Fundo do Poço, encenada com muito sucesso por Maria della Costa em 1950, mas que valeu aos autores uma campanha jornalística e um processo. Dizia Helena: "O juiz a certa altura perguntou-me por que escolhera eu crime tão recente; não poderia ter optado por um mais antigo, do século 19, por exemplo? E eu respondi: ‘Meritíssimo, deixo os assuntos do século 19 para os escritores daquele século’. Ganhei a causa".

A luta continua

Às vezes penso que minha geração poderia ser apelidada de "geração fusquinha" – em época de pleno emprego, com o incremento desenvolvimentista, a classe média ascendia e realizava os sonhos da casa e do carro próprios, fazia pecúlio, consumia, e ficava esperando tranqüila a aposentadoria, que seria boa e segura. Só que não foi bem assim: tivemos um início de vida mais fácil e risonho do que a geração dos nossos pais, que precisou lutar nos anos 1930/40 com as terríveis circunstâncias da 2ª Guerra Mundial e de um mundo dilacerado. Mas nas décadas seguintes nossa vida adulta seria inserida em cenários sociopolíticos cada vez mais complexos, inquietantes – no Brasil, fomos todos colhidos, em pleno exercício de nossa profissão e de nossos direitos, pelo golpe militar de 1964. E nos 21 anos seguintes tivemos de lutar pela "normalização democrática" (com resultados tão escassos e decepcionantes...).

E hoje ainda estamos por aqui, cansados sem dúvida, mas alertas e partícipes, na medida do possível, da luta de filhos e netos pela solução dos grandes problemas sociais, políticos, ambientais, que hoje transcendem limitações de fronteiras e sociedades – por envolverem a própria sobrevivência da humanidade. 

 

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